Opinião | 11-02-2015 17:22
Aplicações da radioactividade

A enumeração feita evidencia bem a diversidade do aproveitamento que o Homem faz dos isótopos radioactivos e a sua importância económica e social.
A radioactividade está na base das mais diversas formas de utilização pacífica da energia nuclear, de que se salientam numerosas e importantes aplicações de átomos radioactivos em medicina, na agricultura e na indústria, além da produção de electricidade em centrais nucleares. Com o presente artigo pretende-se dar uma ideia do aproveitamento que o Homem faz da radioactividade na resolução de inúmeros problemas mediante a utilização adequada de átomos radioactivos (isótopos radioactivos ou radioisótopos). As radiações emitidas pelos radioisótopos naturais ou artificiais têm múltiplas utilizações. Embora possam dizer respeito a áreas muito distintas da actividade humana, tais utilizações têm em comum uma FONTE de radiação, um DETECTOR de radiação e, em geral, um “objecto” sobre o qual actua a radiação. O tipo de fonte radioactiva e o tipo de detector são escolhidos de acordo com a aplicação que se tem em vista.1. Em matéria de INSPECÇÃO, o objecto a observar é colocado entre a fonte radioactiva e o detector de radiação, registando este as variações de intensidade do feixe de radiação depois de ter atravessado o objecto. Por exemplo, uma aplicação industrial baseada neste procedimento consiste em controlar a “espessura” de folhas de papel, placas de borracha, folhas de plástico, lâminas de metal, etc.; no caso de desenrolamento mecânico contínuo, a indicação do detector de radiação pode servir para corrigir auto-maticamente a espessura por actuação sobre a pressão dos rolos laminadores. Analogamente, pode-se avaliar o “nível de enchimento” de recipientes opacos contendo líquidos ou gases, controlar o “nível de garrafas” em processos de enchimento automático, determinar o “teor de humidade” em solos, carvões ou minérios. Pode ainda obter-se a “gamagrafia” de uma peça metálica radiografando-a com radiação gama: a imagem recolhida numa placa fotográfica revela os vazios ou os defeitos eventualmente existentes na peça, podendo-se assim verificar soldaduras de peças metálicas com mais de 10 centímetros de espessura. 2. O EFEITO DESTRUIDOR OU TRANSFORMADOR das radiações sobre os organismos vivos está na origem de utilizações de grande interesse. Em primeiro lugar, a radiação gama é apropriada para a “esterilização” de conservas, leite, carnes, etc., de que param a fermentação sem destruir as vitaminas, como faz o calor. Graças ainda à radiação gama, foi possível resolver o problema da esterilização de certos produtos farmacêuticos, em particular os antibióticos que não podem ser esterilizados pelo calor. Analogamente, a radiação gama permite parar a germinação das batatas e, assim, conservá-las durante largo tempo. 3. É conhecido também o TRATAMENTO de tumores cancerosos, cujas células são mais sensíveis às radiações do que as células normais. A irradiação externa é feita a maior parte das vezes com uma fonte de cobalto-60. Por vezes, a irradiação é conseguida mediante a implantação nos tumores a destruir de pequenas porções de isótopos radioactivos de vida relativamente curta. Um outro exemplo de aplicação diz respeito aos tumores da tiróide para os quais o agente terapêutico ideal é geralmente o iodo. Neste caso, o tratamento à base de iodo-131 pode ser feito por simples ingestão, dado que o iodo radioactivo, comportando-se no organismo como o iodo natural, vai concentrar-se na tiróide a irradiar. 4. Os isótopos radioactivos são utilizados não só pelo efeito das radiações que emitem mas também pela presença que revelam de um corpo a que foram misturados. Trata-se de aplicações da chamada técnica dos INDICADORES, em que os radioisótopos constituem uma pista que se pode seguir ou cuja presença pode ser posta em evidência mediante um detector de radiação. Um dos exemplos clássicos diz respeito ao estudo do movimento de sedimentos marinhos ou de areias em estuários de rios, em que se lançam, num dado ponto do fundo do mar ou do rio, grãos de vidro contendo átomos radioactivos de características adequadas e se procede posteriormente à sua localização por meio de detectores de radiação que se fazem imergir para o efeito. O estudo de circuitos industriais para diferentes fins constitui também um importante campo de aplicação desta técnica. É o caso, por exemplo, da determinação de interfaces num oleoduto onde circulam líquidos diferentes ou da localização de uma ruptura numa conduta não visível por estar embebida numa parede ou no solo.A utilização laboratorial de radioisótopos é ainda mais fecunda, porque os cientistas podem tirar partido, simultaneamente, tanto do seu poder indicador como das suas propriedades químicas. Assim, por exemplo, os átomos de fósforo radioactivo incorporados num fertilizante comportam-se numa planta da mesma maneira que os átomos estáveis de fósforo: com base nesta identidade, pode-se seguir a pista do fósforo radioactivo, determinar a sua repartição mediante uma autoradiografia e, assim, estudar a assimilação do fertilizante pela planta. Muitos outros exemplos de aplicação de isótopos radioactivos poderiam ser dados, envolvendo técnicas como: datação de materiais biológicos e geológicos antigos (em particular pelo carbono-14, cujo período de semi-desintegração é 5730 anos); análise de materiais muito diversos por activação com neutrões (ver Nota 1); diagnóstico médico por cintigrafia; esterilização de insectos com vista à destruição de pragas; etc. A enumeração feita evidencia bem a diversidade do aproveitamento que o Homem faz dos isótopos radioactivos e a sua importância económica e social. A título elucidativo, refira-se que um inquérito feito há alguns anos sobre 25 indústrias diferentes agrupando 125 empresas revelou que a utilização de radioisótopos deu lugar a economias 10 vezes superior ao investimento inicial.***NOTA 1 – No Reactor Português de Investigação (Sacavém) tem sido muito utilizada esta técnica:http://tempoderecordar-edmartinho.blogspot.pt/2012/03/analise-por-activacao-com-neutroes-no.html.Eduardo Martinho11.Fevereiro.2015Fonte de referência: “Isotopes in everyday life”, de Henry Seligman (International Atomic Energy Agency, 1990, 67 págs.). Versão portuguesa: “Isótopos no dia-a-dia”; tradução de Carlos Ramalho Carlos e Eduardo Martinho; edição da Direcção-Geral de Energia (1994).
Mais Notícias
A carregar...