Opinião | 04-09-2019 10:00

Cidadania e Governança: Interatividade nas comunidades

Se, por um lado, a participação mais comum, por parte dos cidadãos, é centrada no indivíduo e nos seus próprios problemas, e não nos problemas comuns a toda a comunidade, por outro lado, também as autarquias não podem ficar, apenas, remetidas a uma comunicação num só sentido.

O sociólogo Mark Granovetter (2007) diz que a sociedade carece de uma estrutura para pensar sobre por que e como é que as pessoas (atores do território) devem interagir e cooperar entre si. Mas, não é apenas através dos ‘processos de participação’ que se encontram as soluções para toda a disparidade de comportamentos sociais; talvez os processos de participação possibilitem, sim, uma maneira diferente de lidar com problemas atuais e futuros. Para alcançar a participação dos cidadãos, expressa através do exercício deliberativo e da tomada de decisões comuns, são necessários altos níveis de transparência.

A participação, entendida como tal, implica uma relação de compromisso entre o Estado e a sociedade civil e a sua institucionalização permite melhorar as políticas públicas. Richard Florida (2005) diz que os cidadãos devem ter a possibilidade de desenvolver as suas capacidades criativas. Assim, ao promover em cada comunidade um ambiente de cooperação e de interação, tendo como âncora o desenvolvimento do talento, da tecnologia e da sociabilidade comunitária, estão-se a gerar parcerias territoriais sustentáveis, consequentemente a promover o aparecimento de potenciais novos produtos e, ao mesmo tempo, a melhorar a satisfação das partes interessadas (stakeholders).

Mas, a participação, ou a falta dela, é um dos maiores problemas com que se deparam as comunidades locais. O comportamento das pessoas e a forma como as instituições funcionam são o principal obstáculo. Se, por um lado, a participação mais comum, por parte dos cidadãos, é centrada no indivíduo e nos seus próprios problemas, e não nos problemas comuns a toda a comunidade, por outro lado, também as autarquias não podem ficar, apenas, remetidas a uma comunicação num só sentido.

Em Portugal, considera-se que a participação é uma oportunidade para criar acessos dos cidadãos às suas estruturas político-administrativas e ao próprio espaço político, ou seja, incentiva a partilha do poder e proporciona, através desta dinâmica de envolvimento, práticas democráticas na comunidade. Estimular a participação é partilhar o poder sem que isso signifique abdicar dos poderes de representatividade garantidos aos eleitos através de eleições livres, plurais e democráticas. Reforçar a comunicação das decisões tomadas em função dos resultados da participação popular, de forma a capacitar as pessoas e fazê-las sentir que a sua opinião conta, que as decisões são tomadas também em função dos resultados da auscultação pública, é o grande desafio das autarquias.

Ferraz de Abreu (2017) refere que os processos de tomada de decisão são limitados, devido aos paradigmas institucionais vigentes, enfatizando a necessidade de se ajustarem à nova realidade tecnológica. Para as autarquias, a auscultação dos cidadãos e organizações da sociedade civil, constituiu-se como um fator indispensável, para perceber as suas necessidades e anseios, mas, também, para regular e mediar as suas dinâmicas comportamentais sobre as questões sociais, ambientais e económicas. É necessário alargar o acesso a todos os segmentos da sociedade, para inventariar e priorizar as questões concretas que preocupam, de facto, as pessoas. Disso muito depende o modelo de gestão que sustente a ação e a dinâmica de interatividade da autarquia junto da comunidade que representa.

O envolvimento das pessoas numa discussão sobre problemas da sociedade, onde a resposta/solução está nos próprios intervenientes, se conduzida numa perspetiva de acautelar os interesses dos cidadãos de hoje e os do futuro, torna-se num mecanismo de participação mais apelativo para as pessoas e para as organizações da comunidade. Relembra-se que o conceito clássico de democracia está de acordo com a premissa de dar voz aos habitantes de uma comunidade ou nação.

José Fidalgo Gonçalves

Investigador Católica-CESOP, Lisboa

setembro.2019

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