Opinião | 01-10-2021 07:00

Vamos lá pensar um bocadinho

Amartya Sen, no seu livro "A Ideia de Justiça", através da parábola das "Três crianças e uma flauta", ajuda-nos a perceber como é possível coexistirem diferentes soluções justas para o mesmo problema.

Amartya Sen, vencedor do prémio Nobel da Economia, no seu livro "A Ideia de Justiça", através da parábola das "Três crianças e uma flauta", ajuda-nos a perceber como é possível coexistirem diferentes soluções justas para o mesmo problema que, inclusivamente, rivalizam entre si, sem que se possa colocar em causa a imparcialidade de quem as defende.

Imagine o leitor que existem três crianças, o José, o Manuel e o António que querem a mesma flauta e que caberá ao leitor a decisão.

Segundo o José, deveria ser ele a ficar com a flauta porque é o único que sabe tocar flauta. Sem ouvir os outros dois, parece, logo à partida, ser esta solução mais justa.

Por sua vez, o Manuel considera que a flauta deveria ficar para ele porque é o único dos três que é pobre e não tem qualquer brinquedo, sendo este o único brinquedo de que disporia para poder brincar, ao contrário dos outros. Colocada a questão desta forma, também parece ser esta uma solução igualmente justa.

Finalmente, defende o António que deveria ser ele a ficar com a flauta porque foi ele que a construiu, tendo levado vários meses a trabalhar, com as suas próprias mãos, para conseguir construir a flauta. Ou seja, analisando as três razões, chegamos forçosamente à conclusão que todas elas são defensáveis e igualmente justas, sendo muito difícil a decisão para uma pessoa imparcial e que queira ser justa.

É precisamente aqui, no momento da decisão, que entra a perspectiva ideológica. O Manuel teria certamente o apoio daqueles que defendem a redução do fosso entre ricos e pobres (os igualitaristas económicos). Por sua vez, o António obteria o apoio dos libertários (sejam os liberais, sejam os socialistas que defendem o princípio "a cada um segundo o seu trabalho"). Finalmente, o José receberia certamente o apoio dos utilitaristas que valorizariam o facto de ser o único que sabia tocar flauta.

É precisamente porque os recursos são escassos que se têm de tomar opções políticas relativamente à forma como são distribuídos.

E há várias formas igualmente justas de os distribuir. É aqui que entra a componente ideológica. Um socialista, um liberal ou um comunista não os distribuem da mesma maneira, na medida em que valorizam de forma diferente os resultados que pretendem alcançar.

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