Opinião | 27-05-2022 08:48

<strong>Extinção por inutilidade superveniente</strong>

Santana-Maia Leonardo

O Bloco Central e os dez anos de governação de Cavaco Silva alteraram o código genético do partido, fazendo com que fosse capturado pelos interesses instalados e se transformasse num alter ego do Partido Socialista. E o “alter” é sempre pior do que o “ego”, como todos sabemos.

PSD e CDS são dois partidos fundadores da democracia portuguesa e que desempenharam, durante anos, um papel fundamental na afirmação da democracia liberal portuguesa como um espaço de liberdade e diversidade.

Costumo definir-me politicamente como conservador, liberal e socialista. Conservador nos valores; liberal na economia; e socialista nas preocupações sociais. E o PSD era um partido que correspondia bem a esta minha definição. Distinguia-se do PS sobretudo por dois aspectos: o PS era menos liberal na economia do que o PSD e o PSD era menos fracturante nos valores do que o PS. Isso resultava, aliás, da base de apoio dos dois partidos. Enquanto o PSD representava, sobretudo, os pequenos e médios comerciantes, empresários, agricultores e profissionais liberais, o PS tinha as suas raízes no funcionalismo público.

Acontece que o Bloco Central e os dez anos de governação de Cavaco Silva alteraram o código genético do partido, fazendo com que fosse capturado pelos interesses instalados e se transformasse num alter ego do Partido Socialista. E o “alter” é sempre pior do que o “ego”, como todos sabemos. A partir daqui, a minha relação com o partido passou a ser conflituosa sobretudo quando estava no poder, na medida em que fazia precisamente aquilo que criticava aos socialistas, quando estava na oposição.

No entanto, o memorando da troika fez-me acreditar que PSD e CDS não iriam perder a oportunidade única de levar a cabo as reformas estruturais essenciais para tirar Portugal do fundo do poço onde tinha sido enfiado pela associação de malfeitores que nos tinha governado até então. E o anúncio de Passos Coelho de que pretendia ir além da troika ainda me fez acreditar mais na vontade reformadora do Governo.

Não foi, no entanto, preciso esperar muito tempo para perceber a expressão “ir além da troika” usada por Passos Coelho não tinha nada a ver com as reformas estruturais de que o país carecia, mas com o esmifrar da classe média e das pequenas e médias empresas até à indigência e à insolvência, ao mesmo tempo que reduzia Portugal à cidade Lisboa-Porto, a sua idealizada Singapura. E, perante a desgraça e a miséria, ainda tínhamos de gramar com a cínica justificação, repetida até à exaustão, como se fôssemos todos analfabetos e estúpidos, de que “Não havia alternativa”.

Acontece que Mário Centeno, num governo socialista aliado à extrema-esquerda, demonstrou que era possível reduzir o défice a zero e criar superavit com o simples controlo da despesa pública (que era precisamente o que Passos Coelho prometeu que ia fazer, quando se candidatou), sem necessidade de reduzir brutalmente os modestos rendimentos da classe média portuguesa.  

Depois das profundas cicatrizes que deixaram com a sua desumana governação, não é possível o PSD e o CDS voltarem a merecer a confiança da classe média, nem dos pequenos e médios empresários pelo que, para bem da nossa democracia, deviam ser extintos por inutilidade superveniente.  

Santana-Maia Leonardo

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