Reformas de tirar água à nora
Há 30 anos que a nossa classe política propõe e anuncia como salvíficas reformas que são, em boa verdade, reformas de “tirar água à nora”, porque criam a sensação no burro de que o país está a avançar, quando, afinal, não sai do mesmo sítio ( : ) Quando se pretende levar a cabo reformas estruturais, uma coisa óbvia: por mais que se legisle e se reforme, os sobreiros não dão laranjas.
Não existe no nosso espectro político um único partido ou político que ponha em causa o modelo de Lisboa, como Cidade-Estado, que é precisamente o grande responsável pela desertificação do território, o problema demográfico, a fuga dos quadros mais qualificados, a pobreza generalizada e os baixos salários, a pressão urbanística na região da Grande Lisboa, o problema dos transportes e da mobilidade a nível nacional, a corrupção generalizada, etc. etc.
Não é, pois, de admirar que todas as reformas acabem sempre por aprofundar ainda mais as desigualdades reais entre os portugueses, agravando cada vez mais o fosso económico e social entre Lisboa, a Cidade-Estado, e o resto do território nacional.
As democracias, tal como as ligas de futebol, se não tiverem sistemas de correcção que equilibrem os dois pratos da balança, levam ao aprofundamento e agravamento das desigualdades e dos desequilíbrios estruturais, uma vez que as regiões mais ricas são precisamente as regiões com mais eleitores. E, em Portugal, é precisamente isso que se passa com a nossa democracia e com a nossa liga, onde Lisboa e Porto e os chamados “três grandes” impõem a sua vontade ao resto do território por força do seu peso eleitoral e do número de adeptos.
A saída da Câmara Municipal do Porto da Associação Nacional de Municípios, significa que a cidade do Porto percebeu que o municipalismo português é o palhaço pobre da política portuguesa à conta do qual Lisboa, o palhaço rico, vive, cresce e enriquece. A Câmara do Porto quer agora tratar dos seus assuntos directamente com o Governo, sem estar dependente do bodo aos pobres com que o Governo vai contentando a ralé.
Há 30 anos que a nossa classe política propõe e anuncia como salvíficas reformas que são, em boa verdade, reformas de “tirar água à nora”, porque criam a sensação no burro de que o país está a avançar, quando, afinal, não sai do mesmo sítio. Aliás, os nossos reformistas só me lembram o Mr Bean, quando entrou em casa e viu um dos quadros que estavam pendurados na parede fora de esquadria. E à semelhança dos nossos reformadores de serviço, Mr Bean, em vez de endireitar o quadro que estava torto, entortou todos os outros que estavam direitos.
Além disso, é importante não esquecer, quando se pretende levar a cabo reformas estruturais, uma coisa óbvia: por mais que se legisle e se reforme, os sobreiros não dão laranjas. É possível melhorar a qualidade da cortiça e a sua produção, mas não há nenhuma lei ou reforma estrutural que faça um sobreiro dar laranjas.
Ora, sem perceber isto, não vale a pena levar a cabo qualquer reforma estrutural. Um português não é, nem nunca será um alemão, um sueco ou um polaco. Nem Portugal é a Alemanha, a Suécia ou a Polónia. O nosso problema é cultural, não é estrutural.
Santana-Maia Leonardo