Um grupo de forcados para pegar o novo aeroporto
Está na hora de constituirmos um grupo de forcados para pegarmos de caras bisontes e minotauros se este projecto de construir um aeroporto internacional em Santarém for só uma questão de coragem e valentia.
Por razões de força maior não assisti ao debate sobre o novo aeroporto que se organizou em Santarém na sexta-feira, 27 de Janeiro. Assim que pude fui atrás das novidades. Não fiquei convencido. É verdade que a procissão ainda vai no adro, mas já é tempo suficiente para começarmos a jogar forte nos planos para invertermos o infortúnio que abala todos os grandes projectos que não ficam no colo das cidades de Lisboa e Porto. Por isso queremos ouvir a voz de barítono dos autarcas, a voz de leão dos empresários, o grito de guerra dos agentes associativos, a sábia voz popular a perguntar se não está na hora de anunciarmos ao mundo a constituição de um grupo de forcados disposto a pegar bisontes, ou minotauros, se for esse o custo de vestir cinta e jaqueta e ter que enfiar o barrete. Um aeroporto no Montijo é o que se espera e estava nos planos do ex-ministro Pedro Nuno Santos. Quem julgar que o camaradinha socialista baixou o machado de guerra que se desengane. O aeroporto no Montijo é uma aberração, mas o que é que este Governo nos tem oferecido nos últimos tempos que não nos faça desconfiar que vêm aí mais aleijões e delírios? Aliás, o episódio da anulação do despacho do ex-ministro está ao nível daquilo que Ricardo Araújo Pereira faz no programa de televisão “Isto é gozar com quem trabalha”. O mafarrico, depois de cavalgar um aeroporto no Montijo e outro em Alcochete para 2035, desmontou-se do cavalo com a mesma facilidade e engenho com que se desculpa entre os amigos de ainda não ter acertado um 13 no totobola. E lá ficou como ministro até a loiça se partir por causa dos milhões da TAP embora o futuro aeroporto possa ser a obra maior do regime depois de Salazar.
Em três horas de viagem li um livrinho de Marguerite Yourcenar sobre viagens, editado e traduzido no Brasil. A tradução é uma desilusão. A autora de “A Obra ao Negro” e “Memórias de Adriano” fica irreconhecível num português do Brasil de uma tradutora pouco preparada. O Brasil é o orgulho, e o país preferido, de muitos portugueses, entre os quais me incluo, mas nunca confiar demasiado. Tal como a luta política no país de Millôr Fernandes, também as traduções têm os seus dias muito maus.
Um dia destes liguei para o telemóvel do carpinteiro que há dois meses recuperou os tacos do quarto da casa onde cresci e que ando a recuperar meio vaidoso e orgulhoso. Fui à procura dele mas só encontrei do outro lado a informação de que está há mais de dois meses num hospital com um cancro em estado terminal. Não é o último carpinteiro ao cimo da terra mas como ele já haverá poucos. É um homem da minha idade, se não me engano mais novo do que eu. Fiquei a pensar: quando é que chega a minha vez; vamos todos acabar assim mais dia menos dia; ou morremos de cancro ou de uma dessas doenças da moda. Infelizmente para alguns de nós ainda não há vacinas contra a estupidez de uma morte na estrada, uma cabeçada mal dada ou um daqueles ataques de coração que fulminam o peito que até ficamos a cheirar a pólvora.
O facto de escrever esta crónica no quentinho de um quarto de hotel, numa cidade que mete Lisboa a um canto, e que parece perfeita para viver por lá o resto dos meus dias, não faz de mim um privilegiado nem me livra de ter que voltar ao trabalho e ao território ribatejano onde ainda tenho um projecto para concretizar, que é um jardim zoológico à beira do Tejo depois das aldeias do meu concelho ficarem desertas. Só queria falar do José “carpinteiro” mas acabei a falar mais de mim do que dele; Este medo de ficar de borco a dar as últimas, com os médicos a dizerem que não há mais nada a fazer, deve ser a página mais mal traduzida que já se publicou ao cimo da terra. JAE.