A caça ao médico de família e os arraiais inclusivos onde não convém lançar foguetes
Intrépido Manuel Serra d’Aire
Intrépido Manuel Serra d’Aire
Está aberta a caça ao médico de família e os municípios da região estão particularmente empenhados nessa campanha venatória para ver quem consegue pendurar mais batas brancas e estetoscópios à cintura no final da época. Como sabes, os médicos de família são cada vez mais raros nos centros de saúde da região (e não só). E as raridades são extremamente valiosas, basta lembrar o preço de uma garrafa de tinto Barca Velha ou de um velhinho Rolls Royce, por exemplo. Não admira por isso que as autarquias se disponham a abrir os cordões à bolsa para seduzir os médicos a trabalhar nos seus concelhos, não com jantares à luz de velas, champanhe, caviar e rosas vermelhas, mas com a oferta de casa, de automóvel e outros incentivos.
Azambuja, Abrantes, Benavente, Mação, Ourém e Salvaterra de Magos são alguns dos municípios que estão na competição de caça ao médico de família e aguardo com expectativa os resultados da cruzada torcendo para que tenha êxito e não resulte numa espécie de caça ao gambozino. Seria bom sinal. É verdade que não tenho carro nem casa para oferecer a troco da consulta de ortopedia que aguardo desde Agosto do ano passado num hospital ribatejano, mas ainda tenho cabedais para oferecer uma galinha, um bacalhau ou um presunto ao doutor ou doutora que faça o obséquio de gastar um quarto de hora do seu tempo profissional comigo.
Esta caça ao médico não envolve cães - pelo menos que eu saiba – mas os nossos fiéis amigos caninos estão em altas para as bandas de Santarém onde, na tarde do próximo sábado, vai decorrer o primeiro arraial do cão, no canil municipal. Não te rias nem penses que estou a inventar pois foi a própria câmara municipal que anunciou o evento e convidou à participação da comunidade de duas e quatro patas.
Não faço ideia do que consta o programa do arraial dos bóbis e pilotos nem do cardápio de comes e bebes, que em qualquer arraial que se preze deve ser diverso e farto, mas é provável que não haja cachorros quentes à venda nem gastronomia coreana, por razões óbvias. E que ninguém se lembre, no entusiasmo do momento, de lançar foguetes porque a raça canina é especialmente avessa ao estardalhaço do foguetório e os seus protectores mais acérrimos não são para brincadeiras quando os incomodam. Arraial sim, mas sem foguetes…
Por falar em festarolas, calculo que o arraial do cão vá ficar incomensuravelmente mais barato do que as festas da Chamusca, que no ano passado custaram quase 800 mil euros, entre Semana da Ascensão e Parque dos Sonhos de Natal ou coisa que o valha. Tiveste razão em falar disso e da injustiça de ninguém dar importância a tal feito, num concelho que só consegue ser notícia nacional por causa das armas roubadas no paiol de Tancos. Na última década foi a crise financeira e a crise económica, depois foi a pandemia Covid-19 seguindo-se a guerra na Ucrânia e a inflação galopante. Agora são novamente bancos a ir à falência (já nem nos suíços se pode confiar) e sabe-se lá o que virá depois. É muita desgraça junta. Por isso, meu caro, não guardes para amanhã o que podes festejar hoje.
Um abraço rapioqueiro do
Serafim das Neves