Quando o Alfa parava na aldeia para desembarcar anunciantes e os empresários que em vez de incentivos querem que os deixem ganhar dinheiro
Ribombante Serafim das Neves
Ribombante Serafim das Neves
Andamos nesta coisa de epistolar electronicamente, há vinte e quatro anos, feitos dia sete. Semana a semana, ora tu, ora eu, com mais ou menos denodo e bastas vezes sem denodo nenhum, incensamos valorosos, desempoeirados e audazes políticos, dirigentes, empresários e outros salafrários, cujas obras de alto coturno passariam despercebidas e não deixariam rasto sem as nossas ladainhas.
Quando isto começou, numa outra vida, escrever e-mails era do mais moderno que havia. E escrever e-mails do outro mundo era uma combinação perfeita de modernismo com tradição. De tecnologia avançada com religião. Agora os e-mails do outro mundo são o exemplo mais que perfeito de um anacronismo folgazão que sobreviveu à extinção dos dinossauros e dos dicionários.
Mas o mundo não pula e avança como bola colorida entre as mãos de uma criança, como escreveu o poeta António Gedeão. Falas no teu último escrito dos anunciantes que nos governam. Eu acrescentaria que os governos não são governos, mas agências de emprego e de publicidade. E também de reciclagem. Têm nota máxima na criação de lugares para familiares e amigos e na reciclagem de promessas de obras que depois anunciam como se fossem novas.
Ainda esta semana voltou a ser prometida uma nova ponte sobre o Tejo na zona da Chamusca e uma nova esquadra de polícia para o Entroncamento, por exemplo. E o novo aeroporto, que já teve uma ou duas localizações, tem agora umas nove ou dez. E a privatização da TAP, do tempo da Troika, vai avançar depois de uma folclórica nacionalização destinada a dar milho aos pássaros, digamos assim. E haverá mais anúncios em breve se o Governo continuar a abanar e se o Presidente Marcelo voltar a falar de eleições antecipadas.
Quanto ao novo aeroporto estou sempre à espera de ler que foi decidido construírem-no na minha varanda. Ou que optaram por uma das famosas soluções (+1) mais um, juntando a minha varanda e a tua. Mas não comeces já a festejar porque um dia destes muda o Governo e volta tudo a girar. Novos estudos, comissões, avaliações, especulações. E lá se vai o meu sonho de vender a varanda por bom preço.
A administradora da TAP contou aos deputados que um secretário de Estado lhe meteu uma cunha para mudar a data e horário de um voo para agradar ao Presidente da República. Fez-me lembrar os tempos em que a CP fazia parar no Entroncamento comboios que não paravam ali, como o Alfa Pendular, para desembarcar, ou embarcar, anunciantes dos governos de outrora, que lá iam pregar remodelações milionárias dos caminhos-de-ferro que, felizmente, nunca foram feitas, para permitir novos embarques e desembarques eleitorais.
Com a associação empresarial NERSANT a ser demolida, paulatinamente, pelo actual presidente Chambel, soube-me bem ler que o presidente que mais trabalhou na sua construção, José Eduardo Carvalho, actualmente à frente da AIP, disse aos empresários, na sessão que celebrou 186º aniversário daquela associação para em vez de saturarem a agenda com mais pedidos de subvenções e incentivos exigirem ao poder político que os deixe ganhar dinheiro.
Um abraço dos antigos, com palmadas nas costas e tudo
Manuel Serra d’Aire