Opinião | 16-06-2023 08:58

O Racismo, o Fanatismo e o Cinismo

Sacar do racismo para se vitimizar como fez o primeiro-ministro, relativamente aos cartazes dos professores que o satirizavam, é revelador de um enorme cinismo. Até se pode considerar que os cartazes são de mau gosto, mas o que é que isso tem a ver com o racismo? Sendo certo que, tirando os lápis espetados nos olhos, a caricatura de António Costa encarnando o porco Napoleão do livro “O Triunfo dos Porcos” de George Orwell assenta-lhe que nem uma luva.

Não reconheço o conceito de raça relativamente ao ser humano. E também não aceito qualquer discriminação com base na cor da pele. Mas uma coisa é a discriminação com base na cor da pele, outra coisa é não reconhecer que a pele tem cor.

É óbvio que chamar preto ou loira a uma pessoa é depreciativo. No entanto, nem preto, nem branco, nem moreno, nem loiro são, por si só, termos depreciativos. Depende do contexto.

Quando estive em Moçambique, jogava todos os dias à bola na praia com um grupo de jovens moçambicanos. E sendo eu o único branco, não achei estranho que, no decorrer do jogo, dissessem “ passa a bola ao branco” ou “marca o branco ”, da mesma forma que não me senti ofendido, quando, em Mangualde, os meus colegas diziam “ passa a bola ao alentejano” ou “marca o alentejano ”.

E quando se fala de racismo, assente exclusivamente no facto de, nos países europeus, haver uma esmagadora maioria de brancos em cargos públicos, temos de compreender que é natural que haja um predomínio de brancos nos países onde há mais brancos. Aliás, se olharmos para os cargos públicos dos países africanos, assim como da China ou do Japão, verificamos que os brancos são praticamente inexistentes e, na China ou no Japão, também não é comum ver dirigentes de cor negra. Ou seja, onde ainda existe maior diversidade e menos preconceito, relativamente à cor da pele, é precisamente na União Europeia.

O que se passou recentemente com Vinicius, jogador do Real Madrid, no estádio do Valência, mais do que uma manifestação de racismo é a revelação daquilo que todos já sabemos: o fanatismo das multidões que assistem a um jogo de futebol é absolutamente irracional e estúpido. Mas também por terem a consciência disso, cabe aos jogadores, dirigentes e treinadores comportarem-se com correcção e educação, em vez de lançarem gasolina para a fogueira, provocando e insultando a turba adversária, como faz Vinicius.

Por sua vez, sacar do racismo para se vitimizar como fez o primeiro-ministro, relativamente aos cartazes dos professores que o satirizavam, é revelador de um enorme cinismo. Até se pode considerar que os cartazes são de mau gosto, mas o que é que isso tem a ver com o racismo? Sendo certo que, tirando os lápis espetados nos olhos, a caricatura de António Costa encarnando o porco Napoleão do livro “O Triunfo dos Porcos” de George Orwell assenta-lhe que nem uma luva. Vivemos cada vez mais num o país onde há uns animais muito mais iguais do que os outros. E todos sabemos quem eles são.

No entanto, existem alguns casos de verdadeiro racismo que deviam merecer tratamento clínico. Refiro-me, designadamente, à célebre petição de Mamadou Ba e Sara Tavares para que a dobragem do filme Soul, em Portugal, fosse feita com vozes negras. Vozes negras?!... Será que, em África ou na China, as personagens brancas também têm de ser dobradas por vozes brancas?!... A voz não tem cor. É preciso ser muito racista para estender à voz o preconceito da cor da pele.

Santana-Maia Leonardo

Mais Notícias

    A carregar...
    Logo: Mirante TV
    mais vídeos
    mais fotogalerias

    Edição Semanal

    Edição nº 1694
    11-12-2024
    Capa Vale Tejo
    Edição nº 1694
    11-12-2024
    Capa Lezíria/Médio Tejo