A virtual praia da Chamusca, heresias gastronómicas e vindimas abençoadas
Fabulástico Manuel Serra d’Aire
Fabulástico Manuel Serra d’Aire
Sou daqueles curiosos e entusiastas que gostam de visitar os últimos recantos paradisíacos do nosso país, desconhecidos pelas turbas famílias carregadas de geleiras, mesas, cadeiras e mantas, de crianças birrentas e de adolescentes com colunas de som a debitar ritmos horripilantes e monocórdicos. Foi por isso que, guiado por um insuspeito jornal nacional que costuma dar essas dicas na época estival, me atirei à aventura de ir visitar a publicitada praia dos tesos na Chamusca.
Desconhecia em absoluto que havia por ali uma estância balnear que merecesse texto e fotografia num suplemento jornalístico dedicado ao Verão, mas atendendo a que o autarca da Chamusca é um homem que usa chinelos e calções em inaugurações oficiais fiquei com a esperança que se tivesse dado um daqueles milagres de requalificação urbana e paisagística que metamorfoseasse a beira-Tejo na Chamusca numa espécie de Seychelles fluvial, onde não faltariam esbeltas nativas em biquini. A coisa prometia, até porque a dita praia dos tesos é conhecida também por Porto das Mulheres, o que acaba por fazer sentido.
Quando lá cheguei apanhei uma desilusão do tamanho da dívida pública. O Tejo, arenoso e pachorrento, continuava a correr de Este para Oeste, mas nem praia, nem porto, nem mulheres, e muito menos vendedores de bolas de Berlim e bandeira verde. Nem sequer o autarca em calções com as suas alpercatas para dar algum colorido ao cenário. E, para cúmulo, o Tejo até está interdito a banhos. Isto já para não falar da piscina descoberta da vila que está em obras há quase quatro anos impedindo a malta de dar uns mergulhos. Verão na Chamusca, meu caro, não é sinónimo de insolação mas sim de desolação.
Li neste jornal que a alimentação para os peregrinos da Jornada Mundial da Juventude instalados em Torres Novas que adquiriram o pacote de alimentação, que lhes permitia levantar refeições nos espaços aderentes, apenas tiveram acesso a restaurantes de comida rápida, como hambúrgueres e pizzas. É verdade que o pecado da gula é para ser tido em conta por quem segue as regras da Igreja Católica; e uma alimentação frugal, nem que seja à base de fast food, é meio caminho percorrido para andarem nas graças do Senhor. Mas estar uma semana pelas bandas de Torres Novas e não provar um cabrito assado ou umas enguias fritas é uma penitência difícil de digerir.
Ainda por Torres Novas, a câmara decidiu plantar três oliveiras no Parque da Liberdade, espaço de homenagem aos ex-combatentes contra a ditadura, para perpetuar a suposta passagem por aquele concelho da Irmã Lúcia (um dos três pastorinhos de Fátima) na sua juventude integrando um rancho das vindimas. Enquanto outros municípios ribatejanos se limitam a eleger anualmente a sua rainha das vindimas, em Torres Novas perpetua-se a participação de uma jovem do século passado na apanha da uva. A isto se chama criatividade e diferenciação. Estes autarcas merecem ir para o céu. Só um reparo: não seria mais lógico plantar azinheiras no lugar de oliveiras?
Saudações veraneantes do
Serafim das Neves