Uma crónica para lembrar Samuel Barradas
Escrevo em cima do fecho desta edição incentivado por uma carta de um leitor de Azambuja, Joaquim Moreira, que quer contar a sua aventura como escritor. É disto que eu gosto. Que uma boa parte da matéria editorial de O MIRANTE chegue pelo telefone, ou pelo correio, com sugestões dos leitores para artigos de sociedade e de política, mas também de cultura que regra geral é marca da nossa identidade.
Embora seja comum dizer-se que um jornalista nunca se reforma, tal como um médico, não tenho tanta certeza que um dia destes não arrume as botas e não deite a toalha ao chão. Trabalho não me falta. Se é jornalismo ou literatura ou terapia da alma, que seja em meu proveito. Só espero que quem me vai substituindo não ache que lhes deixei uma herança envenenada pois este trabalho não é para meninos.
Escrevo em cima do fecho desta edição incentivado por uma carta de um leitor de Azambuja, Joaquim Moreira, que quer contar a sua aventura como escritor. É disto que eu gosto. Que uma boa parte da matéria editorial de O MIRANTE chegue pelo telefone, ou pelo correio, com sugestões dos leitores para artigos de sociedade e de política, mas também de cultura que regra geral é marca da nossa identidade.
Nos dois dias em que esta edição de O MIRANTE viaja da gráfica para os CTT, e depois para as caixas do correio dos assinantes e para a empresa distribuidora, vou marcar presença no lançamento de um livro de Fabião Coutinho, na Póvoa de Santa Iria, e de um outro de Jorge Miguel, na Desmor, em Rio Maior. Nos dois casos são livros que ajudei a paginar, a rever, a desenhar as capas, a escolher os textos para as badanas; fui eu que os enviei para a tipografia, que os fui levantar, que os transportei para a sessão de lançamento, e ainda não sei se não vou ser eu que os vou vender ou oferecer, conforme a situação.
Nos últimos dias não fiz ponta de corno mas não parei de fazer projectos para o futuro. O meu telemóvel está cheio de mensagens a puxarem por mim como se eu fosse um rebocador de uma estrada ribatejana em tempo de cheias do Tejo. O meu email consome-me mais tempo do que aquele que tenho para ir diariamente ao ginásio, à piscina e à sauna.
Já só fumo duas vezes por dia, mas entretanto tripliquei o número de vezes que vou fazer terapias, ou seja, mexer o corpo para não enferrujar e morrer jovem quando chegar a hora. Longe vá o agoiro que falar da morte é coisa que não está no meu dicionário de palavras. Mas há bem pouco tempo é que soube que morreu o Samuel Barradas, o ourives da Golegã que toda a gente da terra conhecia e que eu também conheci quando me iniciei na mesma vida de vender relógios. Tudo o que aprendi com ele já esqueci, mas na altura foi um dos meus mestres, embora nem ele tenha chegado a saber como lhe roubei o conhecimento, e como a sua vida de ourives e relojoeiro influenciou a minha que foi bem mais curta e disso me orgulho.
Se esta crónica ficasse no computador não se perdia nada. Ou perdiam-se apenas estas últimas linhas porque estou a recordar o Samuel Barradas, que morreu já faz quase um ano e eu só soube há meia dúzia de dias. Não é justo que as pessoas morram sem lhes agradecermos o que fizeram por nós. Sei isso desde que morreu a mulher que ajudou a minha mãe a parir-me, e que foi a última desses tempos que me chamava por Joaquim António com as palavras todas, como eu me lembro de ouvir o meu nome quando brincava com os amigos da escola na rua da Formiga. JAE