Sermos livres é não nos deixarmos prender por quinquilharias legais ou por linhas vermelhas
Vernáculo Serafim das Neves
Vernáculo Serafim das Neves
A lei diz que não há praias privadas, mas como se costuma dizer, a beleza da vida é podermos não ligar a leis nem a regulamentos. Sermos totalmente livres, como passarinhos...ou como passarões, digamos assim, no caso de querermos imitar os que pairam muito acima de tudo e de todos, sem que as asas que usam se queimem com o calor do sol, ou acusações do Ministério Público
Estando nós a mais de cem quilómetros do mar, as nossas praias são as dos tesos, como diziam os nossos avós, não se referindo a aspectos físicos mas a gente sem dinheiro. Praias nas margens dos rios ou das albufeiras, nomeadamente na de Castelo de Bode.
E é aí, em Alverangel, Tomar, que um passarinho... ou passarão, usando a tal liberdade a que todos almejamos, ignorando leis e outras quinquilharias legais, privatizou a praia fluvial, cumprindo o sonho de não ter sombras humanas quando se estende ao sol.
Na verdade, ele nem sequer privatizou a praia. Limitou-se a impedir o acesso à mesma, por um caminho que é seu. Aprendeu com os passarinhos livres e pipilantes da Renova, que também não privatizaram a nascente do Almonda, limitando-se a vedar o caminho que permite o acesso à mesma. E a chamar a GNR para fazer desaparecer quem para lá vai molhar os pés e ouvir o murmurejar da água. Quem os pode criticar por serem tão, tão, livres.
Lá para as bandas de Braga, desapareceu uma ribeira chamada de S. Victor. Pelo que li, esvaiu-se pelos colectores de águas pluviais. Não sei se há colectores de águas pluviais na zona da nascente do Almonda, mas uma coisa é certa, mesmo que houvesse, não era o rio que corria o risco de se esvair por lá.
Os que vão para lá molhar os pés, poderiam esvair, digamos assim, os administradores da fábrica de papel higiénico. E os da fábrica, não desdenhariam esvair os amantes dos piqueniques. Para mim era igual, desde que todos se sentissem livres, felizes e esvaidamente frescos, claro!
Há um grupo de investidores, interessado em gastar 70 milhões de euros na construção de um teleférico de acesso à Torre, na serra da Estrela. Ao ler aquilo lembrei-me do teleférico ou funicular entre a Ribeira de Santarém e Santarém, que aparece de dez em dez anos, nos sonhos dos autarcas destas bandas.
Quem costuma citar os versos do Manuel da Gama: “pelo sonho é que vamos”, é quem sabe da massa de que somos feitos e da pouca importância que damos à concretização dos sonhos. Basta lembrar o que ele escreve a seguir mas que nunca é citado: “Chegamos? Não chegamos? / Haja ou não haja frutos/ pelo sonho é que vamos.”. Pelo sonho, sublinho eu, não pela obra.
Um estudo recente mostra que a maioria dos jovens em Portugal tem hábitos de consumo de cultura. Antes que comeces a dizer seja o que for, acrescento que o tal estudo foi feito “online” e que participaram 994 jovens entre os 18 e os 34 anos. Ou seja, é um estudo mesmo a sério e extraordinariamente credível. E acrescento que foi considerado cultura, ver filmes e séries e ouvir música...na internet. Já agora, 86,6 por cento disse que leu pelo menos um livro, o que é excelente, considerando que devem andar todos a estudar.
Um abraço cultural
Manuel Serra d’Aire