Tudo na mesma como a lesma no país das fugas, das faltas, dos fogos e dos larápios letrados
Fulgurante Manuel Serra d’Aire
Fulgurante Manuel Serra d’Aire
Falei no meu último escrito de alguns dos episódios marcantes deste Verão, como o preço das bolas de Berlim ou o sismo, mas mandei os foguetes antes da festa, pois desconhecia, ou estava longe de imaginar, que outros acontecimentos fenomenais estavam para vir. Começo pela rocambolesca fuga de presos da cadeia de Vale de Judeus. Refira-se que se trata de uma prisão de alta segurança e os reclusos tiveram isso em conta, munindo-se de escadas e cordas para ultrapassar os muros, revelando dotes que desconhecia da nossa população prisional para os desportos radicais, nomeadamente para a escalada.
Mas nem tudo é mau. Naquela prisão, na segunda metade da década de 70, houve evasões colectivas na ordem das dezenas de presos. Só de uma assentada fugiram 89 elementos da antiga polícia política da ditadura, a famigerada PIDE. Ora, desta vez só fugiram cinco. Há uma clara evolução ou, simplesmente uma maior ponderação e menor ousadia dos reclusos. É que aos preços a que está a habitação cá fora, um T0 de borla durante uns anos, com pensão completa, não é regalia de se menosprezar.
Este Verão agudizou também em mim o desencanto em relação à classe política. Sempre que muda a cor do Governo, apodera-se de mim a pueril e ingénua esperança de que agora é que as coisas vão mudar e que é desta que o país vai para a frente. Isso aconteceu mais uma vez mas passados uns meses já deu para ver que Portugal é como a lesma, está sempre na mesma. Continuam a fugir presos, continuam a faltar médicos e professores, as grávidas continuam a parir em ambulâncias e os fogos continuam a devorar a floresta. E que tal experimentar recorrer à inteligência artificial para governar isto?
A nomeação da nova directora distrital da Segurança Social, que tu relataste com sabedoria, é outro exemplo e não foi propriamente uma surpresa nem um daqueles grotescos fenómenos do Entroncamento, é antes mais do mesmo. É assim que a coisa funciona e já ninguém se admira, porque os partidos do chamado arco do poder há muito que são autênticas agências de emprego e há muitos lugares de nomeação política para distribuir nos ministérios, secretarias de Estado, direcções-gerais, institutos, agências e uma parafernália de organismos do Estado. É um regabofe! Arrependido estou eu de não me ter filiado numa jota ou, mais tarde, num partido e navegar ao sabor do vento, acenando e sorrindo aos chefes, engraxando botas e pondo-me a jeito para ser mais um servidor da causa. Agora já é tarde e esse remorso há-de morrer comigo.
Para concluir, uma novidade. A Junta de Vila Franca de Xira colocou à disposição da comunidade num jardim da cidade uma nova “Cabine de Cultura”, que basicamente é uma antiga cabine telefónica reconvertida e recheada de livros para livre utilização pública. Ora, o equipamento foi inaugurado e no dia seguinte já não restava uma obra que fosse (vá lá que deixaram a cabine). Isto é que é gosto pela leitura. Haja pois esperança! Pode ser que estes ladrões letrados ainda cheguem ao Governo e isto comece mesmo a mudar.
Saudações literárias do
Serafim das Neves