Levar a sopa da pedra, o melão e a caralhota aos herejes da Scalabis e viajar nos comboios fantasma sem ir à feira
Luminescente Serafim das Neves
Luminescente Serafim das Neves
Dizes que o actual presidente da câmara municipal de Almeirim, Pedro Ribeiro, pode vir a ser o candidato do PS à presidência da câmara de Santarém. O filme é antigo. Um clássico socialista naquele concelho.
Há umas décadas, o PS de Santarém também pôs a circular que o seu candidato seria o presidente da câmara de Torres Novas, António Rodrigues que, tal como Pedro Ribeiro em Almeirim, já não se podia voltar a candidatar na sua terra.
Rodrigues acabou por ficar em casa, onde, passado o período obrigatório de pousio, se voltou a recandidatar, como independente, ao cargo que tinha ocupado durante vinte anos, tendo averbado no currículo, uma derrota mastodôntica, que, mesmo assim, foi muito menos mastodôntica do que aquela que, acho eu, teria conseguido como candidato por Santarém. Ou seja, livrou-se de boa.
Não sei se, o ainda Presidente de Almeirim, vai atravessar o Tejo para se candidatar a Presidente de Santarém, mas se o fizer, é de homem, e eu irei comprar bilhete para assistir na primeira fila.
Nestes tempos de rejeição de estrangeiros e de pessoas de outras terras, vir alguém da outra margem do Tejo, que ainda por cima é grande defensor da prata da casa almeirinense, a começar por caralhotas, melão, artistas locais e sopa da pedra, conquistar a velha Scalabis, será um feito a ombrear com o de D. Afonso Henriques, que ali venceu os mouros em 1147... por maioria absoluta, digamos assim.
A CP continua a manter a tradição dos comboios históricos e dos comboios fantasma. Os primeiros levam os passageiros em carruagens desconfortavelmente antigas e com bancos de sumapau, como se dizia antigamente, da Régua a Barca de Alva e do Entroncamento a Castelo Branco, com almoço regional pelo meio. Os segundos, recriam as viagens dos comboios fantasma das feiras, com bruxas, esqueletos, teias de aranha e outros sustos.
Aqui há dias viajei num, para matar saudades. Apanhei o da meia noite e um quarto, que sai da caverna, digamos assim, de Santa Apolónia, que continua suja e decadente, mal iluminada, e sem casas de banho àquela hora. A coisa prometia e a promessa cumpriu-se.
O comboio ainda não tinha partido e já estava meia hora atrasado. Nos painéis luminosos das carruagens, ainda eram 21h45. Muito cedo para começar a viagem, deve ter pensado o maquinista.
Noite cerrada, vidros embaciados, e a caranguejola, suja e pegajosa como a da canção, lá ia parando aqui e ali, sem que os passageiros soubessem se era em estações ou no meio de nenhures, porque não aparecia qualquer indicação nos tais painéis luminosos das carruagens e o sistema sonoro estava mudo, talvez para não perturbar o sono do revisor que, diga-se, desapareceu e nunca mais apareceu, sabe-se lá se levado por um qualquer esqueleto zarolho.
Abrir as portas em cada estação para ver qual a paragem poderia ser uma alternativa, mas não funcionava porque era tudo mal iluminado e só se vislumbravam trevas e ervas. Nem sequer se viam os letreiros das antigas casas de banho a dizer “Retretes”. Os passageiros estavam com olhos de quem vai ver coisas assustadoras a qualquer momento. Quem diz que a CP não é divertida é porque não tem sentido de humor.
Saudações fantasmátias
Manuel Serra d’Aire