Opinião | 04-04-2025 07:00

Santarém Inteligente: Uma Cidade Feita para as Pessoas

Santarém Inteligente: Uma Cidade Feita para as Pessoas
Miguel de Oliveira Martins

Santarém nem nenhuma cidade precisa de se perder na obsessão pela tecnologia para se tornar uma cidade inteligente. A inteligência urbana reside na capacidade de respeitar a identidade histórica e cultural, criando condições que favoreçam a qualidade de vida dos seus habitantes.

No estudo das cidades inteligentes (em inglês, smart cities), assiste-se, com frequência, a uma abordagem excessivamente centrada na tecnologia, como se esta fosse um fim em si mesma. O conceito, em termos gerais, refere-se à utilização de ferramentas tecnológicas para otimizar os serviços urbanos. No entanto, esta definição, na sua simplicidade, revela-se insuficiente e, em certa medida, enganadora. A razão é evidente: Portugal, um país que, ao longo das últimas décadas, privilegiou a expansão da infraestrutura rodoviária em detrimento do investimento em serviços públicos essenciais, dificilmente se converterá, de um momento para o outro, num campeão da inovação tecnológica na Administração Pública.
Uma cidade verdadeiramente inteligente não pode ser definida apenas pelo nível de tecnologia que incorpora, mas sim pela sua capacidade de proporcionar uma vida urbana equilibrada e funcional. Um exemplo paradigmático é o conceito da "Cidade dos 15 Minutos", desenvolvido pelo urbanista colombiano Carlos Moreno e aplicado, com particular ênfase, na gestão de Anne Hidalgo, Presidente da Câmara de Paris. Trata-se de um modelo que privilegia a proximidade entre a residência, o local de trabalho, o comércio e os espaços de lazer e serviços, permitindo aos cidadãos aceder a todas as suas necessidades essenciais sem necessidade de deslocações prolongadas
Santarém, uma cidade de dimensões modestas, oferece um terreno propício para a aplicação deste modelo. O executivo municipal demonstrou compreensão dessa realidade ao implementar um Plano de Mobilidade Urbana, apresentado pela Engenheira Paula Teles, que visa reduzir a dependência do automóvel e fomentar a mobilidade pedonal e ciclística. Entre as medidas previstas incluem-se a criação de ciclovias, funiculares e espaços urbanos mais acessíveis aos peões, para além do acesso das zonas baixas ao planalto. Não se trata de uma revolução digital, mas sim de uma evolução centrada na qualidade de vida urbana, provando que uma cidade inteligente é, acima de tudo, uma cidade pensada para as pessoas.
Mais recentemente, no Dia de São José, foi apresentado o Parque Natura Tejo, um projeto que visa restabelecer a ligação histórica entre Santarém e o seu rio. Como bem recordou o Arquiteto Luís Ribeiro, a cidade nunca se limitou à Vila Alta, abrangendo igualmente as zonas de Alfange e da Ribeira de Santarém. Este projeto, enquanto devolve o Tejo à cidade, explora o espaço verde para lazer e convívio, promovendo um impacto positivo na dinamização económica e social. Como afirmou o Presidente da Câmara Municipal, trata-se de uma iniciativa com efeito multiplicador, capaz de gerar novos investimentos e transformar a relação da cidade com o seu património natural.
Entre os presentes, uma senhora idosa, nascida nos Riachos mas criada em Santarém, Alfange e Ribeira, emocionou-se ao testemunhar o evento. Comentou que aquele era um dia histórico para a Ribeira, que parecia esquecida. As suas palavras simples e sentidas revelam a verdadeira dimensão deste projeto: não se trata apenas de infraestruturas ou de planos urbanísticos, mas da devolução da cidade aos seus habitantes, respeitando o seu passado e projetando um futuro mais humano. Ao observar estas iniciativas, verifica-se que nem Santarém nem nenhuma cidade precisa de se perder na obsessão pela tecnologia para se tornar uma cidade inteligente. A inteligência urbana reside na capacidade de respeitar a identidade histórica e cultural, criando condições que favoreçam a qualidade de vida dos seus habitantes. Se a primeira autoestrada foi o Tejo, talvez esteja na altura de devolver essa centralidade ao rio e de repensar a cidade na sua dimensão mais humana, funcional e integrada.
Miguel de Oliveira Martins

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