Opinião | 22-04-2025 19:50

Francisco “Santo súbito!”

Francisco “Santo súbito!”

Francisco lutou contra alguma Igreja que se agarra desesperadamente ao passado, que pretende manter regras e estruturas que perderam o seu significado, como se o tempo tivesse parado.

Francisco morreu. Notícia violenta e inesperada, até depois da sua aparição no Domingo de Páscoa. Sempre pensei, como muitos, que o pior da sua doença já tinha passado. Jesus ressuscitou e Francisco partiu logo de seguida.

Abalroado pela notícia de um “WhatsApp” da minha filha, fiquei em choque. Fiquei igual ao tempo que fazia em Santarém: cinzento, triste e com chuva copiosa.

Sem palavras e com um sentimento de orfandade. O Papa Francisco foi mais uma pérola que Deus envia de quando em vez para o meio dos homens. Uma lágrima de bondade do Criador, que nos encheu as vidas, os corações e que nos transmitia esperança e ânimo no quotidiano rotineiro das nossas vidas.

Francisco não era um filósofo como João Paulo II, ou um insigne teólogo como Bento XVI. Francisco era um genuíno Pastor que nos conduziu para fora do redil seguro de uma Igreja atemorizada e ainda avessa a confrontar-se com as (suas!) fraquezas humanas. Francisco mergulhou no cheiro de todas as mulheres e homens de todas as latitudes, submergiu e respirou os nossos problemas, medos e ansiedades, tudo, simplesmente, porque viveu como um de nós. Padre, Bispo e Papa, nunca esqueceu a sua humanidade.

Por isso amava o povo de Deus que já conhecia das “villas miséria” de Buenos Aires, onde se misturava com todos, todos, todos. Toxicodependentes, presos ou prostitutas, Francisco nunca deixou de os amar e abraçar. Francisco irradiava o Espírito Santo de Deus em cada sorriso e gesto que nos oferecia

Porque caminhava no meio do povo de Deus, Francisco nunca confundiu o cheiro das suas ovelhas com o incenso grandiloquente das sacristias; não confundiu qualidade, simplicidade e beleza das celebrações, com cenarizações demoradas, excessivas e enfadonhas, em que se pretende disciplinar e formatar os fiéis; não confundiu a tradição com conservadorismo anacrónico; não confundiu a profundidade da oração com a ausência de pecado e não confundiu abertura e renovação, com o extremismo do facilitismo hedonista.

Francisco lutou contra alguma Igreja que se agarra desesperadamente ao passado, que pretende manter regras e estruturas que perderam o seu significado, como se o tempo tivesse parado. Francisco, sibilinamente, como bom Jesuíta, discerniu entre o que é permanente e o que é contingente, apontando às mudanças que melhoram a vida das pessoas, mas sem perder a sua identidade e coerência com os seus valores mais profundos: por exemplo, valorizar a espiritualidade e a doutrina, mas tornar a liturgia mais acessível, acolhedora e participativa.

A nomeação da Irmã Simona Brambilla para Prefeita do Dicastério para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica - primeira mulher a ocupar este cargo num dicastério do Vaticano -, representa uma inovação significativa na estrutura da Cúria.

Sendo apenas uma simples nomeação, a mesma revela também em si mesma, o processo sinodal de Francisco de uma Igreja em movimento, de uma Igreja “em processo”, metodologia que o Santo Padre perscrutou como conducente a revoluções silenciosas, quiçá mais ou menos dilatadas no tempo, mas dinamicamente irreversíveis. Uma Igreja que se move, é uma Igreja em (r)evolução.

Queria uma Igreja que interpretasse a realidade à luz do Evangelho e não que se impusesse o Evangelho à realidade como um filtro ideológico, perdendo assim a capacidade de acompanhar, curar e transformar.

Deus chamou o meu Papa Francisco e eu estou profundamente agradecido a mais esta lágrima de Deus que nos inundou de humanidade.

Sem nunca o ter conhecido, sinto que perdi um amigo.

Francisco “Santo súbito”!

P.N. Pimenta Braz

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