“Dona Maria” ou a “minha mulher é fascista” (I)

Salazar era professor de finanças, de economia percebia muito pouco (:) Tenho muita pena que os seus pais, gente humilde e honrada, não tivessem ensinado o filho a apanhar caracóis, porque se com um curso de direito e uma “equivalência” ao doutoramento não conseguiu arranjar trabalho na área, poderia dedicar-se a outras coisas. Julgo, porém, que sabia dobrar a própria roupa. Foi quase um subsídio-dependente, o doutor Salazar.
Bom dia. Em primeiro lugar até com os nazis devemos ter regras de cortesia…. Devemos? Julgo que sim. Naturalmente, antes do autoenforcamento ou da condenação a trabalhos forçados devemos ser simpáticos. Tratar bem o nazi, dar-lhe água, comida, ensinar que não se força mulheres/homens à prostituição, que se querem comprar sexo têm de ganhar o seu próprio sustento, demovê-lo do erro é atitude, do ponto de vista de uma moral kantiana, de uma moral cristã, mais correta, salvo outra opinião. Na filosofia subsiste o problema do monstro, cuja única solução possivelmente passa pela aniquilação desse ser: o monstro.
Certamente os que tem lido esta linhas reconhecem um tom diferente, algo amargo, alegria perdida do biografo, navegando em águas turvas, da história e da vida. Qualquer relação com os resultados eleitorais de 18 de maio de 2025, é pura coincidência.
Se “história é mestra da vida” ou apenas serve para algum tipo de catarse social, quando a vida escolhe a autoaniquilação em vez do humanismo, subsiste a tristeza dos(as) poetas/poetisas e a agonia dos historiadores/as, falam daqueles e daquelas que têm coração, parafraseando Sidónio Muralha (1972).
Um dia estudarei melhor o assunto, cada vez me interessa mais a direita não autoritária. Quem tiver interessado em conhecer a fundo a vida de António de Oliveira Salazar (1888-1970) e discutir se ele era realmente fascista, se Benito Mussolini (XX) era realmente o seu BFF— best friend forever — há imensos livros, dois ou três programas do “resto é história” (O Observador). Considero que o “Estado Novo” é fascista porque o fascismo não é bem uma ideologia, é uma prática de manutenção de poder, uma estratégia de manutenção do stau quo. De qualquer modo, dentro dos fascismos, o “Estado Novo” evoluiu graças sobretudo a Marcelo Alves das Neves Caetano (1906-1980) para estado corporativo, procurando materializar na prática uma interpretação própria da doutrina social da Igreja, não apenas derivada de Leão XIII (1810-1903), mas de todos os grandes pensadores católicos, deturpando tanto o “nosso” Lino Neto (1873-1861) como Miguel de Unamuno (1864-1936). Filosofando, Eisenhower terá dito: “Um libertário pode condenar o Dr. Salazar, não julgo que Platão o faria”
Tal qual a democracia ateniense traiu Sócrates — que aliás como pederasta merecia ser condenado e só tomou a cicuta porque queria cumprir a lei, poderia ter escolhido o ostracismo — a I República traiu uma boa parte do clero católico, a Igreja, as Misericórdias e sobre os pobres e os analfabetos que “apenas mudaram de coleira”, uma expressão monárquica cuja origem não consigo precisar. De acordo com Rui Ramos, “Afonso Costa não queria trabalhadores de enxada a votar”, de modo a abolir o caciquismo, atitude vil e hipócrita. Provavelmente, a Divina Providência ou o Anjo de Portugal levaram a sério a ideia de que o estado se tem superavit está mal gerido, afiançou José Relvas no parlamento em 1914, voltando a defender o mesmo em 1928. O Estado não deve ter superavit, se o tem abusa dos impostos, também não deve ter deficit, deve dar resto zero. Existe um qualquer anátema sobre as contas públicas portuguesas sempre que há saldo positivo, uma calamidade mundial veio estragar o brilharete, em 1914, a Grande Guerra, em 2021, a “grande pandemia”, e mesmo no tempo da outra senhora, com a redução dos deficits e da dívida externa à custa da qualidade de vida a maldição continuou.
Salazar era professor de finanças, de economia percebia muito pouco. Muito mais de economia entendiam os meus avós Emília, Miguel e José, do que o Doutor António fazendo fé até nas suas próprias palavras. Em 1919, após saneamento da Faculdade de Direito de Coimbra, alegou que era pobre e teria dificuldade em ganhar a vida se deixasse de ser funcionário público. Tenho muita pena que os seus pais, gente humilde e honrada, não tivessem ensinado o filho a apanhar caracóis, porque se com um curso de direito e uma “equivalência” ao doutoramento não conseguiu arranjar trabalho na área, poderia dedicar-se a outras coisas. Julgo, porém, que sabia dobrar a própria roupa. Foi quase um subsídio-dependente, o doutor Salazar.
A razão do seu despedimento, consta na tradição coimbrã, para além de política terá sido também pedagógica. Tratava mal os alunos, alguns alunos, convidava certas alunas para jantar e se elas deixassem ver a perna acima da meia saia, dava mais um valorzinho na nota.
Deixamos a sua alma sossegada. Em tempos idos amigos meus encapuzados invadiram uma missa por alma do doutor Salazar com máscaras da ETA, discordei deles ao almoço por ser uma cerimónia religiosa, temos de a respeitar. “Apenas a Catarina tinha de matar fascistas” e quem não sabe o que isso quer dizer: saia daqui, vá ao teatro! A missa, porém, era a 28 de maio, estive cá fora e alguém por mim, serviu de aguadeiro aos terroristas. Terror com terror se paga!? Ou como se dizia em Coimbra, julgo que a Sónia Nobre: “para cabrão, cabra e meia”. Temos mesmo de ser simpáticos com que nos quer aniquilar?
Ridendo castigat mores (cont.).
Referências:
Muralha, Sidónio (1972), Pássaro Ferido, Rio de Janeiro.
Relvas, Relvas (1977), Memórias Politicas, Terra Livre, vol. II.
Debates Parlamentares, disponíveis em linha em: https://debates.parlamento.pt/.