Portugal, o País das portas por abrir

Portugal é um país com um reduzido mecenato, descendentes de artistas ou de escritores famosos vão criando casas-museu ou oferecendo os seus espólios . Infelizmente são poucas as câmaras municipais que atribuem aos pelouros da cultura um orçamento razoável e, como se costuma dizer em linguagem coloquial, sem ovos não se podem fazer omoletes.
Quantas vezes nos deslocamos pelo nosso território e queremos visitar o nosso património histórico-cultural e nos deparamos com uma barreira intransponível? As portas que pretendemos franquear encontram-se encerradas.
É certo que muito tem mudado para melhor e muito restauro e conservação tem sido feito nos nossos principais monumentos e onde têm trabalhado e colaborado alguns dos nossos melhores especialistas formados em Conservação e Restauro. E aqui tiro o chapéu ao Instituto Politécnico de Tomar, uma escola ímpar a nível nacional, de onde têm saído alguns dos nossos melhores técnicos, licenciados e mestres. A pouco e pouco a massa crítica vai fazendo o seu caminho. Apenas com uma população formada e culta, se atinge a plena cidadania.
São ainda muitos os casos em que nos deparamos com monumentos encerrados, igrejas, capelas, museus regionais, conventos e centros de arte. Parece que é necessário muitas vezes telefonar para o pelouro da Cultura de uma qualquer Câmara Municipal e lá vem um funcionário esbaforido abrir as portas do que queremos visitar e que é património de todos.
Quantas vezes me desloquei a Tomar e me deparei com o Núcleo de Arte Contemporânea José-Augusto França (1922-2021), ilustre tomarense que legou à sua cidade natal uma colecção de arte extraordinária, encerrado. Esta colecção inaugurada na cidade nabantina em 2004 estende-se pelos séculos XX e XXI e revela o gosto deste historiador de arte e romancista pelo surrealismo. Nem sempre os desejos dos doadores são cumpridos e também respeitados, basta mudar a cor política de uma câmara municipal para tudo ficar em banho-maria ou encerrado. Portugal é um país com um reduzido mecenato, descendentes de artistas ou de escritores famosos vão criando casas-museu ou oferecendo os seus espólios a arquivos, museus e bibliotecas municipais.
Infelizmente são poucas as câmaras municipais que atribuem aos pelouros da cultura um orçamento razoável e, como se costuma dizer em linguagem coloquial, “sem ovos não se podem fazer omoletes”.
Há uns bons anos escutei a frase de que primeiro os portugueses precisam de um tecto, trabalho, só depois de cultura. Não afirmou Winston Churchill, em pleno ambiente da segunda guerra mundial “que se não lutamos pela cultura, lutamos para quê?”.
O sentimento comunitário e de cidadania não é muito forte entre nós, apenas nos unimos em períodos de catástrofes ou de perigos externos ou em movimentos cívicos e de importância nacional, como foi o de Timor, nos finais do século XX. O povo português é, por natureza, individualista. O que é seu, é seu, o que é de todos, e aqui falo de passeios de circulação de peões ou do não cumprimento das mais elementares regras de trânsito, é também seu.
O desejo é que os orçamentos para a cultura vão aumentando, inclusive no orçamento nacional. E que as câmaras municipais e mesmo museus nacionais deixem de recorrer tanto aos colaboradores, aos voluntários, a todos aqueles que trabalham nesta área e que são remunerados a recibo-verde, um autêntico exército nacional, que, ignorado, pouco valorizado e respeitado, vai fazendo tudo o que pode e vai fazendo o país andar para a frente.