Opinião | 16-10-2025 12:02

Anselmo Braamcamp Freire deu uma prenda a Santarém há mais de um século

Anselmo Braamcamp Freire deu uma prenda a Santarém há mais de um século
Miguel Montez Leal

É bom que as nossas cidades, vilas e aldeias tenham os seus mecenas, que vêem sempre para além do seu presente e não se preocupam tanto com as questões materiais, de heranças, partilhas e consequente desfragmentação e dispersão de património. Portugal é um país saudosista, mas uma nação de poucos mecenas.

Filho do scalabitano 1º Barão de Almeirim, Manuel Nunes Freire da Rocha e da sua mulher, a lisboeta, Luísa Maria Joana Braamcamp de Almeida Castelo Branco, Anselmo Braamcamp Freire, nasceu na capital em 1849 e abraçou, como muitos da sua geração, a República e os seus ideais, o que demonstrou com crença profunda a partir de 1907.

Braancamp Freire teve variadíssimas facetas entre as quais as de coleccionador de arte, heraldista, genealogista, político... Tendo falecido em Lisboa em 1921, doou o seu palacete e o seu espólio à sua cidade adoptiva, que se viria a tornar, pouco depois, na Biblioteca Municipal de Santarém.

Anselmo Braamcamp Freire(1849-1921)

No seu primeiro andar estendem-se as salas com a sua colecção de arte, composta por mobiliário, porcelana e biblioteca pessoal. Em frente deste bonito palacete encontra-se o seu busto (da autoria do escultor portuense Teixeira Lopes) e da sua antiga casa avista-se o perfil da cidade de Santarém e do arvoredo que a emoldura.

A instituição scalabitana tem organizado exposições, patrocinado colóquios e visitas guiadas, e a sua directora e funcionárias têm tentado fazer tudo o que está ao seu alcance, de modo a colocar a instituição cultural no mapa da cidade, mas o edifício que alberga este importante espólio, continua a permanecer, em parte, desconhecido do grande público.

É bom que as nossas cidades, vilas e aldeias tenham os seus mecenas, que vêem sempre para além do seu presente e não se preocupam tanto com as questões materiais, de heranças, partilhas e consequente desfragmentação e dispersão de património. Portugal é um país saudosista, mas uma nação de poucos mecenas.

Santarém teve sorte com Anselmo Braamcamp Freire . Recentemente as antigas janelas do primeiro andar deste edifício foram substituídas por nova caixilharia, mas com o mesmo desenho e esquadria e que certamente ajudarão a que o edifício não seja tão húmido e melhor se conservem as suas colecções. Parece que em breve a sua empena e fachada irão ser rebocadas e pintadas.

Por ser um nome tão familiar para os scalabitanos, quem conhece hoje a biografia deste erudito? Quantas pessoas visitam o museu que esta biblioteca alberga no seu primeiro andar? As espécies bibliográficas e manuscritos são consultados e estudados por especialistas, historiadores, historiadores de arte, genealogistas e heraldistas, mas parece que aquele busto já pouco diz às gerações mais novas, pois constitui história e não é seu contemporâneo.

Aqui os pais e avós podem assumir o seu papel de educadores e os professores de todos os graus de ensino, do básico ao superior, poderão dar a conhecer esta personalidade, o seu percurso e obra, sempre com a leitura dos tempos actuais.

O filósofo José Gil, afirmou no livro, Portugal, Hoje: o Medo de Existir, que se tornou num bestseller nos primeiros anos do actual século, que “Portugal é o país da não inscrição”. Esta asserção tem múltiplas leituras, mas o nosso País tem a vincada característica de, paradoxalmente, ser o país da saudade e da nostalgia e simultaneamente o país do apagamento e da invisibilidade. A nossa memória colectiva é mais mitológica do que real. Somos mais quixotescos do que os nossos vizinhos espanhóis, pois vivemos, de facto, entre o sonho, a ilusão e a crua realidade. Falta tanto ainda por fazer para atingirmos a maturidade da plena cidadania!


Miguel Montez Leal

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