O desapego ao poder causa arrependimento, as réplicas do Candidato Vieira e as greves que aliviam o erário público
Epistológrafo Manuel Serra d’Aire
Epistológrafo Manuel Serra d’Aire
Dissertas no teu último escrito sobre a evidência de a maior parte das greves nacionais da administração pública serem cirurgicamente marcadas para as sextas-feiras, aproveitando assim os grevistas para gozarem um fim-de-semana prolongado fora do calendário habitual. E, ainda por cima, nesta última greve, com o salário fresquinho na conta. Percebo a tua posição, mas tens de reconhecer os efeitos positivos para a economia do país. Tivemos dezenas de milhares de pessoas a consumir no que seria um dia normal de trabalho. Os centros comerciais encheram, os restaurantes devem ter notado a diferença e até os alojamentos de norte a sul devem ter ficado surpreendidos com a procura. A greve que paralisa é também a greve que dá impulso ao nosso comércio, indústria e serviços. E tendo também em conta aquilo que não se gastou em água, electricidade, combustível, papel e outros consumíveis, diz-me lá se não deu também um importante contributo para o emagrecimento da despesa do Estado?
Nos últimos tempos tenho registado as manifestações de desapego ao poder expressas por candidatos derrotados nas últimas autárquicas, alguns agora apeados da cadeira do poder. O primeiro sinal até surgiu antes das eleições e veio de Salvaterra de Magos, onde um vereador socialista renunciou aos pelouros a meia dúzia de dias das eleições não se percebeu muito bem porquê. É verdade que esse autarca que se desapegou do poder em cima das eleições concorria a novo mandato como vereador por uma lista onde, obviamente, se propunha voltar ao executivo e a reassumir o poder, caso a sua lista vencesse. Mas o eleitorado, compreensivo com o seu propalado desapego, libertou-o desse fardo e deu a vitória a outra lista. Há tipos com sorte!
Também a vereadora do Chega na Câmara de Azambuja, Inês Louro, mal soube que fora reeleita, decidiu pedir renúncia ao mandato. Fez-me lembrar o eterno putativo candidato a Presidente da República, Manuel João Vieira, que continua a garantir que só desiste se for eleito. Mas o homem dos Ena Pá 2000 é artista do burlesco e tem desculpa; além de que ainda não teve oportunidade de provar se cumpre ou não as promessas. Se for eleito logo se vê. Já Inês Louro não avisou o povo antecipadamente de que só desistiria se fosse eleita vereadora. E, para cúmulo do episódio absurdo, arrependeu-se rapidamente da renúncia, mas, ao que parece, já demasiado tarde para poder revertê-la. O Candidato Vieira ficou assim a saber que não está sozinho na paródia. Valha-nos isso...
Abençoado sistema que nos bafeja com estas preciosidades, algumas delas vindas do tal partido que tanto abomina o sistema que vigora há meio século. Vamos ter esperança que os novatos que agora chegam às lides autárquicas um pouco por toda a região saibam honrar o legado de muitos dos que passaram pelas cadeiras do poder e que não desistam de nos inspirar. Nós cá estaremos para os premiar.
Um abraço leonino do
Serafim das Neves


