Viajar é preciso e o nosso país bem merece
Vila Nova da Rainha, que pertence ao concelho da Azambuja, é a “terra das três mentiras”, pois não é vila, não é nova - é antiquíssima – e não é da rainha. A Igreja merece uma visita demorada pela sua esplêndida azulejaria do século XVIII que nos conta a vida de Santa Marta e pelo episódio principal da história que encerra.
Quando passamos pela autoestrada rumo a Lisboa avistamos do lado esquerdo, numa pequena elevação, a povoação de Vila Nova da Rainha, que pertence ao concelho da Azambuja. Os autóctones afirmam que esta é a “terra das três mentiras”, pois não é vila, não é nova - é antiquíssima – e não é da rainha. Talvez o facto que mais se destaca nesta localidade seja o casamento de D. Nuno Álvares Pereira com D. Leonor de Alvim, em 15 de Agosto de 1376, que daria origem, mais tarde, à dinastia de Bragança.
Naquela pequena igreja este matrimónio foi celebrado. A Igreja merece uma visita demorada pela sua esplêndida azulejaria do século XVIII que nos conta a vida de Santa Marta e pelo episódio principal da sua história que encerra.
É preciso recuar à batalha de Aljubarrota, aos mosteiros da Batalha e ao Convento do Carmo, para vermos aqui os primeiros passos de uma família que se tornaria numa dinastia e numa Casa Real.
Nas imediações de Vila Nova da Rainha encontramos também a Igreja das Virtudes, a alameda de palmeiras, infelizmente atingida há uns anos atrás pela praga do escaravelho que dizimou esta planta exótica muito comum na paisagem portuguesa, que nos conduz ao Palácio da Rainha ou Palácio da Vala (que foi uma estalagem) e à aldeia de Vale do Paraíso onde o monarca D. João II recebeu Cristóvão Colombo, na sua paragem em Lisboa, antes de se dirigir para Castela.
Todos estes factos históricos narrados por cronistas do reino e investigados por sucessivas gerações de historiadores, marcam esta paisagem quase às portas de Lisboa.
Se abandonássemos um certo provincianismo, localismo e acantonamento, poderíamos saber tirar partido da nossa História. D. Nuno Álvares Pereira merecia, por si só, uma rota histórico-cultural, assim como a obra de Almeida Garrett, Viagens na minha Terra, que nos transporta desde o Terreiro do Paço até Santarém, cidade onde este escritor do romantismo veio visitar o seu amigo Passos Manuel.
Este acantonamento de freguesias dentro de um mesmo concelho, e de cada concelho entre si, faz com que um país, como Portugal, assente no municipalismo, se torne, simultaneamente pequenino, pois cada terra quer sempre suplantar a sua terra vizinha, numa cegueira e rivalidade primária. Talvez devêssemos antes pensar mais no que nos une, e que nos daria mais força e escala, e menos no que nos divide. O sector do turismo deveria ser reestruturado e o país não deveria querer afirmar-se fazendo algo semelhante por todo o lado: feiras medievais, festivais do gelo, feiras de Natal…
Todas as terras possuem a sua riqueza, o seu património, as suas gentes e tradições e todos somos parentes e descendentes de pessoas que se deslocaram no território nacional. Beirões antepassados de alentejanos, algarvios descendentes de transmontanos e minhotos, ribatejanos com origens no Oeste ou em Lisboa… todos somos, de alguma forma, parentes uns dos outros. Não nos podemos esquecer que em meados do século XIX o País não alcançava ainda o número de 4 milhões de habitantes, e que no século XVI não ultrapassaríamos o 1 milhão e meio.
A minha proposta nesta quadra natalícia, e de necessária pausa, é que, se pudermos, saiamos de casa, não para irmos para destinos longínquos, mas sim para destinos próximos.
Na correria em que todos andamos, muitas vezes nem conhecemos a cidade ou a região onde vivemos. Cada vez há mais cidades-dormitório. Portugal tem fama e proveito de conhecer a sua capital, o Algarve, e o aeroporto da Portela que nos faz voar para outros destinos. O nosso território fica para trás e num país de média dimensão e que se atravessa de automóvel em menos de seis horas, conhecemo-nos pouco entre nós e vivemos enredados em preconceitos e ideias feitas sobre as nossas regiões. O preconceito assenta sempre na ignorância. Como podemos opinar sem conhecer in loco uma aldeia, vila ou cidade?! Como podemos generalizar sobre os habitantes de uma região?! De preconceito em preconceito tornamo-nos pequeninos. Como podemos entender se não passámos por uma experiência, uma situação ou uma viagem? A ignorância é sempre muito atrevida.


