Apodrecer ao sol
Portugal precisa urgentemente de organização, racionalidade e bom senso que é precisamente aquilo que, por cá, não existe. E, sobretudo, de valorizar aqueles que são melhores do que nós, porque não é promovendo os medíocres e odiando o mérito que os países conseguem progredir, desenvolver-se e ultrapassar os seus problemas.
O país está literalmente a apodrecer ao Sol. A todos os níveis, seja na Saúde, na Justiça, na Educação, na Segurança Social, na Administração Pública ou na Administração Local. E o mal vem de longe. Só que, em vez de se atalhar caminho, à boa maneira portuguesa, foi-se deixando a situação deteriorar e apodrecer na árvore até cair de podre.
O pior é que não se vê solução à vista até porque o sistema político, que tinha a obrigação de gerar as soluções, também já apodreceu, pelo que não se espere que daí venha a salvação. Bem pelo contrário. Sempre que algum governante decide levar a cabo alguma reforma, o resultado é quase sempre o contrário da finalidade pretendida. Em vez de resolver o problema, agrava-o.
Veja-se o caso do S.N.S. em que o Governo teve a brilhante ideia de acabar com as parcerias público-privadas que era precisamente das poucas coisas que estavam a funcionar bem e com alguma racionalidade.
Agora, no desespero, toda a gente clama por mais dinheiro. Só que o dinheiro é como a água: se um sistema de rega não estiver operacional e houver ruptura na canalização, o desperdício de água não só é enorme como a solução não passa por bombear cada vez mais água.
Portugal precisa urgentemente de organização, racionalidade e bom senso que é precisamente aquilo que, por cá, não existe. E, sobretudo, de valorizar aqueles que são melhores do que nós, porque não é promovendo os medíocres e odiando o mérito que os países conseguem progredir, desenvolver-se e ultrapassar os seus problemas. Mas isto também é pedir de mais num país onde as pessoas são como o vinho: os melhores são para exportação.
Parafraseando George Orwell, a saúde das democracias, tal como a saúde das competições desportivas, dependem do grau de exigência dos cidadãos relativamente à sua família ideológica e desportiva. Quem se move por convicções é muito exigente consigo e com os seus, quem se move por inveja exige tudo aos outros e desculpa tudo aos seus. E reside aqui precisamente um dos grandes problemas do nosso país: a inveja tem um peso muito grande na formulação da opinião e da decisão de uma esmagadora maioria dos portugueses.
Avaliação, mérito e transparência são palavras para serem usadas no discurso político, mas proibidas na acção política, sob pena de se perder automaticamente as eleições. A nossa organização política assenta numa teia de cumplicidades, amizades e promiscuidades, construída em forma piramidal que começa na mais pequena freguesia e termina na cúpula do Estado e que bloqueia qualquer tentativa de regeneração do sistema.
Mesmo quando a situação apodrece ao extremo e começa a exalar um cheiro nauseabundo, a reacção do português que a sustenta com o seu voto é impreterivelmente esta: “os outros, se cá estivessem, ainda faziam pior.” Ou seja, não há praticamente nenhum português que acredite que possa existir alguém que consiga fazer melhor. Não porque não haja melhores e muito melhores. Mas porque sabem, por conhecimento directo e pessoal, que o sistema apenas está preparado para produzir mais do mesmo.
Santana-Maia Leonardo