Discurso de Ricardo Gonçalves no 25 de Abril em Santarém incomodou socialistas
Presidente da Câmara de Santarém criticou o estado a que o país chegou e deixou algumas alfinetadas à governação socialista durante o discurso nas comemorações da Revolução dos Cravos. No PS escalabitano, que tem um acordo de governação no município com o PSD, houve quem acusasse o toque.
O discurso do presidente da Câmara de Santarém nas comemorações do 25 de Abril na cidade não agradou a todos. Na sessão da Assembleia Municipal de Santarém de 27 de Abril a eleita socialista Dina Rocha confessou que inicialmente ficou “um pouco incomodada” e numa segunda fase “desconfortável” por ter notado entre o público presente algumas reacções de desagrado às palavras do social-democrata Ricardo Gonçalves. “Não o vou comparar à figura do Velho do Restelo criada por Luís de Camões, mas aquilo que leu remetia para esse tipo de negatividade”, afirmou a autarca socialista, que disse querer acreditar que “as palavras foram mal escolhidas” por Ricardo Gonçalves.
Na resposta, o presidente do município reiterou o que dissera sobre o estado a que o país chegou e a acção de sucessivos governos. “Disse aquilo que devia dizer neste momento” afirmou, acrescentando que foi factual e que “efectivamente há coisas que estão mal e temos que as apontar”. Ricardo Gonçalves recordou ainda que quando o seu partido era Governo também dirigiu críticas públicas. “Estou tranquilo com o que disse”, concluiu.
No seu discurso no 25 de Abril, o social-democrata Ricardo Gonçalves reconheceu que Portugal está mais desenvolvido que há 49 anos, mas longe do pelotão da frente da União Europeia. “Infelizmente, Portugal transformou-se num país que não consegue dar futuro aos seus jovens. Estes saem cada vez mais novos para o estrangeiro sem contribuir para o desenvolvimento do seu país. Esta perda de talento será dramática para o nosso futuro colectivo”, sublinhando que Portugal tem “das maiores cargas fiscais da Europa, salários cada vez mais reduzidos, uma crise grave na habitação que afecta todas as gerações”.
“Falta coragem e vontade política”
“Na Saúde já são mais de 1,6 milhões de portugueses sem médico de família. Nos hospitais tem que haver escalas de especialidades, vejam o exemplo do Hospital Distrital de Santarém onde faltam dezenas de médicos colocando, muitas vezes, em risco a saúde de todos nós. Na Educação os professores sentem-se enganados, e com razão, com o seu tempo de serviço e com a falta de uma estratégia para a Educação, para que a Escola Pública dê o salto qualitativo que todos desejam”, acrescentou, não deixando de mencionar os “casos e casinhos” que têm envolvido o actual Governo.
Em contraponto, Ricardo Gonçalves enfatizou o contributo do poder local. “Os 308 municípios portugueses, com cerca de 14% da receita do Estado, executam 50% do Investimento Público”, vincou o autarca lembrando que as autarquias “fazem verdadeiros actos de multiplicação das suas verbas, para ajudarem os seus munícipes, enquanto reparam que o Estado Central cada vez mais se desresponsabiliza das suas funções”. “Falta coragem para fazer as reformas estruturais de que Portugal e os portugueses necessitam. Falta ambição política para que Portugal e os portugueses possam ver a sua qualidade de vida melhorada e próxima dos melhores padrões europeus. Falta vontade política para mudar o estado a que isto chegou, para procurar os entendimentos necessários para colocar novamente Portugal na senda do crescimento e do desenvolvimento económico. Falta coragem e vontade política como os homens e mulheres de Abril tiveram”, sublinhou, elogiando a coragem e o exemplo de Salgueiro Maia e de todos os que estiveram envolvidos no golpe militar que depôs a ditadura.
“Mais seriedade e dedicação à causa pública”
O presidente da Assembleia Municipal de Santarém, o socialista Joaquim Neto, também deixou críticas à classe política e pediu aos políticos “mais seriedade e dedicação à causa pública”, apontando a corrupção e a falta de transparência como cancros que minam a democracia e abrem caminho a extremismos e populismos. Depois de enumerar as múltiplas conquistas de Abril democracia, liberdade de expressão, garantia dos direitos humanos fundamentais, autonomia regional e local e criação do Serviço Nacional de Saúde – Joaquim Neto referiu que “a desigualdade económica continua a ser um problema significativo, levando ao aumento da pobreza e da exclusão social”.
Discursaram ainda Sónia Vieira, pela associação Comemorações Populares do 25 de Abril, o coronel Maia Loureiro, em nome da Associação Salgueiro Maia, e o coronel Correia Bernardo, em representação da Associação 25 de Abril.