Deputado do Chega por Santarém sob investigação por contrato público pode perder mandato

José Dotti, deputado do Chega eleito por Santarém e candidato à Assembleia Municipal de Benavente, está sob escrutínio da Comissão de Transparência da Assembleia da República por alegada violação da lei que proíbe titulares de cargos políticos de celebrar contratos públicos. O caso pode resultar em perda de mandato parlamentar, sanção prevista na lei.
A Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados vai abrir um inquérito ao deputado do Chega José Dotti, presidente da distrital de Santarém do Chega e cabeça-de-lista à Assembleia Municipal de Benavente, na sequência de um contrato celebrado por ajuste directo entre uma empresa de que é sócio-gerente e uma junta de freguesia.
A empresa Astel - Comércio de Equipamentos Industriais, da qual José Dotti detém 40% das quotas, assinou em Agosto deste ano um contrato no valor de 35.200 euros, mais IVA, com a União de Freguesias de Castanheira do Ribatejo e Cachoeiras, no concelho de Vila Franca de Xira, para a aquisição de uma máquina dumper recondicionada, com retoma incluída. O acordo foi formalizado já durante o actual mandato parlamentar do deputado, eleito pelo círculo de Santarém nas legislativas de 2025.
O documento publicado no portal base.gov apresentava uma anomalia. O nome do sócio-gerente foi ocultado, ao contrário do que sucedia em contratos anteriores celebrados pela mesma empresa. Confrontado com a omissão, José Dotti afirmou que “assinou a minuta enviada” e que essa explicação teria de ser dada pela União de Freguesias.
A junta reconheceu que a omissão resultou de um lapso e assegurou ter pedido a correcção, o que O MIRANTE confirmou numa nova consulta, verificando que o nome de José Dotti já figura no contrato enquanto segundo outorgante. Ainda assim, a situação levantou dúvidas sobre a legalidade do contrato, uma vez que a Lei n.º 52/2019, que regula o exercício de funções por titulares de cargos políticos, impede os deputados de participarem em procedimentos de contratação pública, quer exerçam o mandato seja em regime de exclusividade ou não.
Segundo a legislação, os deputados não podem exercer funções de gerência nem deter participações superiores a 10% em empresas que contratam com o Estado ou com autarquias locais, sob pena de sofrerem a sanção mais pesada, que é a perda de mandato. O caso já motivou a intervenção da Comissão de Transparência, que pretende apurar se houve violação efectiva da lei e, em caso afirmativo, encaminhar o processo para a Entidade para a Transparência, que funciona junto do Tribunal Constitucional.
Deputado diz estar protegido pelo estatuto de não exclusividade
Questionado sobre o caso, José Dotti disse ter consultado o gabinete jurídico do Chega e garantiu estar “protegido pelo estatuto de não exclusividade”, posição que, segundo especialistas, não o isenta dos impedimentos legais. “Não há muita margem para dúvidas. O regime de não exclusividade não iliba um deputado dos impedimentos estipulados pela lei”, afirmou um membro da Comissão de Transparência citado pelo jornal Expresso.
A empresa Astel foi fundada em 2011 e tem acumulado cerca de dois milhões de euros em contratos públicos, sobretudo através de ajustes directos com autarquias e serviços municipais.
Com formação em Engenharia Agronómica pela Universidade de Évora, José Dotti reside há mais de quatro décadas em Benavente, onde se destacou pela actividade agrícola e associativa. Antes de chegar ao Parlamento, foi gestor de empresas e dirigente distrital do Chega em Santarém. É candidato à presidência da Assembleia Municipal de Benavente nas autárquicas de 12 de Outubro.