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Contrato de empreitada

Helena Seixas Jorge *
- Resolução com justa causaO Sr. Santos Silva contratou com uma empresa de construção civil, a Soconstroi, Lda., a execução de vários trabalhos da sua especialidade, designadamente a construção e montagem de um armazém num terreno que possuía perto de Sacavém. Nos termos do contrato celebrado, a obra deveria ser executada no prazo de 45 dias, e o preço global seria pago em várias tranches, tendo o Sr. Santos entregue logo aquando da adjudicação da obra, a título de sinal, uma quantia correspondente a 30 % do preço ajustado.Contudo decorrido mais de um mês sobre o prazo máximo contratualmente fixado para a execução e entrega da dita obra, e apesar das várias insistências do Sr. Santos, a montagem do armazém ainda mal havia sido iniciada. E três meses depois ainda as obras se encontravam incompletas, com a agravante de que as vigas e vigamentos entretanto montados haviam começado a empenar e a apresentar vários outros defeitos graves. Não obstante os vários telefonemas e cartas que o Sr. Santos enviou à Soconstroi pedindo explicações, esta nada fez e só volvido quase um ano após a data prevista para a conclusão da obra a mesma se dignou enviar uma equipa de trabalhadores para as instalações do primeiro a fim de acabar a obra. Contudo o Sr. Santos, que entretanto já havia solucionado o seu problema mandando construir o armazém a outra empresa, impediu o pessoal da Soconstroi de retomar a obra. Por carta que então enviou ao Sr. Santos, a Soconstroi revelou-se por tal facto impedida de finalizar os trabalhos, e solicitou o pagamento da parte restante do preço orçamentado.Face ao antagonismo de posições assumidas, a questão acabou obviamente por ir parar à barra dos tribunais. O Tribunal de primeira instância que inicialmente se pronunciou sobre o diferendo atribuiu razão à Soconstroi, que pedia uma indemnização pelos trabalhos e gastos efectuados na obra, bem como pelos lucros que deixara de obter com a mesma. Entendeu então o Tribunal que entre as partes havia sido celebrado um contrato de empreitada, cujo regime legal impõe que o dono da obra, no caso de existirem defeitos na construção, os denuncie comunicando a sua existência ao empreiteiro por forma a que este último os repare, sob pena de, não o fazendo, ter de aceitar a obra tal como ela se encontra, e consequentemente ser obrigado a pagar o respectivo preço. Ora considerou o Tribunal que o Sr Santos, apesar de ter detectado vários defeitos na obra, não os havia denunciado à Soconstroi, pelo que esta não era obrigada a responder por tais vícios, devendo considerar-se que o Sr. Santos aceitara a obra tal como a mesma se encontrava, tanto mais que inclusivamente havia aproveitado o trabalho entretanto efectuado pelo empreiteiro, sendo legítimo que pagasse o respectivo preço. Tanto mais que sendo assim o Sr. Carlos o responsável pelo não cumprimento do contrato havia sido injustificada a sua conduta ao impedir a continuação dos trabalhos por parte da Soconstroi.Já em via de recurso apresentado pelo Sr. Santos junto do Tribunal superior, veio este último a apreciar diferentemente a questão concedendo razão, desta feita, ao recorrente. E isto porque no entender deste Tribunal a conduta da Soconstroi deveria desde logo ser apreciada segundo os princípios da boa fé porquanto, conforme determina a lei, «o empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato», e de facto tal não veio a acontecer: a Soconstroi devia efectuar as obras no prazo de 45 dias, e mais de três meses depois as mesmas ainda estavam incompletas e apresentavam defeitos graves. Por outro lado, e se bem que de algum modo o Sr. Santos consentira na ultrapassagem do prazo incialmente fixado para a conclusão das obras, considerou o Tribunal relevante o facto de este ter feito vários telefonemas à Soconstroi, logo após o termo daquele prazo de 45 dias, no sentido de insistir pelo prosseguimento e conclusão da obra e de ter enviado à mesma uma carta em que pedia esclarecimentos e revelava o carácter urgente da obra avisando que a mesma deixaria de lhe interessar se a construção não fosse possível em curto espaço de tempo, e de, apesar disso, a Soconstroi nada ter feito, tendo pretendido apenas retomar a obra quase um ano depois. Face a tal conduta da Soconstroi entendeu o Tribunal que o Sr. Santos nem aceitara a obra dado que esta ainda não estava terminada, nem desistira da obra dado que desistência existira sim por parte da Soconstroi, que abandonara a obra durante quase um ano.Assim, era legítimo que o Sr. Santos tivesse interpretado a conduta da Soconstroi como sendo de abandono da obra, pelo que não lhe era exigível que tivesse ficado indefinidamente à espera que esta última se decidisse a retomá-la quando bem entendesse. E atendendo ao verificado abandono da obra por parte do empreiteiro, assistia ao Sr. Santos motivo para pôr termo ao contrato, por resolução com justa causa, pelo que este bem andou quando justificadamente se opôs a que aquele retomasse os trabalhos quase um ano depois, nada mais tendo pois a pagar-lhe além do valor da mão-de-obra e dos materiais por aquele incorporados no seu terreno.(* Advogada)

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