O espírito natalício está a chegar em força à minha caixa do correio. São toneladas de papel a anunciar mil e um descontos e promoções. A única coisa que não chega é a correspondência normal. Os postais de Boas-Festas, O MIRANTE e outras utilidades só devem dar entrada depois do Ano Novo quando os carteiros já não tiverem mais mailings dos hiper-mercados para entregar. O conceito de correspondência prioritária está de pernas para o ar e ouvem-se sininhos gingombél por todo o lado.Mas há mais. A Quercus anda para aí a massacrar-nos as consciências com a protecção aos pinheiros. Com os desperdícios de papel de embrulho. A DECO aterroriza-nos com os brinquedos assassinos. Com a euforia despesista da quadra. Eu já gostei mais disto. Agora o Natal deprime-me. Os tempos em que eu partia a assobiar para o meio da mata, de machado em punho para cortar uma árvore jeitosinha, já lá vai. Agora avanço pela calada da noite, sempre com medo de ser caçado por um guarda florestal. Alguma vez eu imaginei que ir à procura da árvore poderia ser mais perigoso que conduzir bêbado? E é que aquilo dá azia. Deve ser dos nervos Serafim. Sinto-me um criminoso de cada vez que chega Dezembro.E as compras??!! Que prazer posso ter eu numas comprinhas de cárácácá quando sinto o bafo gélido do endividamento roçar-me a nuca de cada vez que rapo do Visa?Serafim. Eu acho que não aguento até à noite da consoada. Lembro-me das rabanadas, das azevias, do colesterol, do arroz doce, dos triglicerios. A minha cabeça estala. O meu estômago ronca, o meu apetite chia mais que uma ninhada de ratos. Gimglóbél, gimglóbél, já não há papel...No Domingo comprei um bacalhau no Modelo. Um bacamarte de três quilos. Foi metade do subsídio de Natal para o galheiro. E ainda me falta o perú. E as prendas para os meus quinze sobrinhos. Ai que eu ainda assalto um banco. Nem que seja um banco de jardim.Sei que também deves andar com azia por causa dos dois a zero que o teu Sporting levou dos lampiões. Deixa lá! Foi por uma boa causa. O Benfica é um grande clube e andava muito desmoralizado. O que o teu clube fez é digno de registo. Uma prenda de Natal dá-se a qualquer um. É a generosidade da época. A mim apetece-me sempre dar nesta altura. Dar uma, dar duas, dar três. Nem sempre consigo dar tantas Serafim, mas tento meu caro. Tento mesmo. Quando dou quatro prendas entro em delírio. Se dou cinco é o êxtase.Para a semana vê se consegues dar-me umas dicas para prendas de Natal. Sugestões que façam sentido. Um bilhete de lotaria para a câmara mais endividada do distrito. Um reforma antecipada todos os incompetentes da região. Umas garrafas de vodka para os arrumadores de carros aguentarem o frio...de mão estendida.Eu este ano pedi ao Pai Natal um vestido de noite. Um vestido de noite bem decotado. Com a Julia Roberts lá dentro. E a minha prima Luísa também, se lá couberem as duas. Se o Pai Natal não tiver dinheiro para tudo pode esquecer-se do vestido e trazer-me apenas o recheio.Serafim. Está frio de mais aqui na sala e o reumático começou a assanhar-se. Vou beber um copázio de Porto e vou directo ao vale dos lençóis. Se sonhar com renas, amanhã de manhã vou comprar um vigésimo da lotaria do Natal. E rezar para que não me calhe nada. É que um gajo com muito dinheiro no bolso passa-se dos carretos e só faz disparates. Eu sei lá. Imagina que me dava para ir passar férias na neve e partia uma perna a andar de sku? Um abraço bem gimgombé do Manuel Serra d’Aire