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“Santarém perde”?

Miguel Noras

O problema das contas de 2002 da autarquia escalabitana não é (infelizmente) um falso problema. Implica, desde já, tolerância zero no “agregado corrente”, bem como a alienação de activos fundiários e a reestruturação dos empréstimos e dos “contratos de factoring”. Todavia, esta questão só tem sido empolada porquanto o legado financeiro do último mandato (de longe melhor do que o actual) foi, estranhamente, designado por “falência” (Diário de Notícias de 9 de Março de 2002)

I – Candidatura a “capital da cultura – 2005”Na peça encimada pelo título “Santarém perde”, o Diário de Notícias de 23 de Abril antecipou um desaire para a candidatura da cidade a “capital da cultura-2005” e lembrou velhos problemas acerca do Teatro Rosa Damasceno.A pretensão de Santarém, de acordo com aquela notícia, colide com a candidatura de Faro ao mesmo estatuto.Aparentemente, esta candidatura algarvia terá duas vantagens sobre Santarém: foi apresentada primeiro e a cidade de Faro situa-se no sul de Portugal. Reconheço que (em teoria) não será fácil efectuar uma escolha que privilegie duas cidades do centro: Coimbra (2003) e, logo de seguida, Santarém (2005).Admito, porém, que os ministeriais critérios para a cultura não respeitem exclusivamente a ordem de entrada das candidaturas, nem os acasos da geografia portuguesa. Caso contrário, bastaria que cada “região” (ou distrito na falta desta) apresentasse, sequencialmente, uma candidatura e o seu êxito (administrativo) estaria garantido.Independentemente da oportunidade do lançamento da candidatura de Santarém (o que, neste momento, não vou discutir), entendo que a nossa cidade preenche todas, todas, as condições para ver considerado, em sede própria, este seu objectivo.Sofro – confesso – do síndroma do “escalabitanismo”. Todavia, não é esta “enfermidade” que sustenta a minha opinião. O avanço (real) de Santarém no âmbito das iniciativas culturais é notório relativamente ao que se passa na generalidade das cidades portuguesas. Os escalabitanos méritos culturais se encarecem-se, só por si, e poderão facilitar o papel do Governo quando tiver de explicar esta escolha de Santarém logo a seguir a Coimbra. II – Teatro Rosa DamascenoO problema começa assim: nem o Governo nem a Câmara de Santarém possuem dinheiro para comprar e beneficiar o Teatro Rosa Damasceno.Acresce que, em 1999, a autarquia apresentou (e foi aceite) uma candidatura para reabilitar o seu teatro municipal. Esta aposta no Teatro Sá da Bandeira tem merecido algumas críticas (até agora todas infundadas). Com efeito, tratava-se (e trata-se) do único cine-teatro pertencente à edilidade (na altura condição sine qua non para o êxito da candidatura). Os montantes envolvidos não chegariam sequer para adquirir o Teatro Rosa Damasceno. Mais: o programa de apoio estatal não financiava a compra de espaços culturais.Concluindo: em face das contingências, a opção pelo Teatro Sá da Bandeira e pela área envolvente foi (e é) acertada. Quanto à sorte do Teatro Rosa Damasceno, não vislumbro melhor fórmula aquisitiva do que a que serviu de base ao anterior acordo com o Clube de Santarém (seu proprietário): pagamento, em numerário, de uma parte simbólica e, em espécie, da parte mais substancial.Recorde-se que a actual Câmara desfez o protocolo do mandato anterior ao atribuir, a uma indústria, os terrenos destinados ao Clube de Santarém. Contudo, a autarquia ainda detém alguns espaços urbanizáveis que, alternativamente, poderão assegurar a transferência do Teatro Rosa Damasceno para a tutela do município. Assinale-se que, da parte dos seus legítimos proprietários, nunca houve qualquer fuga à defesa dos direitos da cidade. Como é óbvio, também não poderão furtar-se a preservar os seus centenários interesses, sob pena de desrespeitarem as funções directivas em que estão investidos.Convém, no entanto, lembrar que a aquisição do “Rosa Damasceno” (pela autarquia) constituirá apenas o primeiro passo de uma bateria de responsabilidades (recuperação, revitalização, etc.) cujo conteúdo financeiro nem sequer é fácil de prever com rigor.III – Palavras finaisQuando a Câmara de Santarém teve de intervir, financeiramente, para evitar a descaracterização do histórico “Café Central” ouviram-se ruidosos aplausos fundamentalistas. Vieram das mesmas mãos que, pouco depois, puseram o apito nos lábios para assobiar à solução encontrada.Aquando da tentativa de aquisição do coliseu do Porto pela IURD, as vozes críticas deram-nos este ensinamento: há momentos em que não basta a mobilização em torno de um lema idealista. Perante os valores em causa, impõe-se um esforço suplementar (de natureza financeira) que a todos deve envolver.No caso do “Rosa Damasceno”, há, ainda, outra questão obrigatória e central: poderá este teatro voltar a cumprir a sua função no planalto ou, à semelhança do “S. Jorge”, já a perdeu para sempre?Post ScriptumContas 2002O problema das contas de 2002 da autarquia escalabitana não é (infelizmente) um falso problema. Implica, desde já, tolerância zero no “agregado corrente”, bem como a alienação de activos fundiários e a reestruturação dos empréstimos e dos “contratos de factoring”. Todavia, esta questão só tem sido empolada porquanto o legado financeiro do último mandato (de longe melhor do que o actual) foi, estranhamente, designado por “falência” (Diário de Notícias de 9 de Março de 2002).Se aquilo era uma “falência de tanga”, agora é uma “falência de fio dental”, conforme lembrou, há dias, uma amiga e colega TOC (Técnico Oficial de Contas).Santarém, 27 de Abril de 2003.jmnoras@mail.telepac.pt

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