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Novo aeroporto de Lisboa - O condicionamento de uma decisão política

As partes em confrontoOs grandes investimentos provocam sempre momentos de grande discussão pública e polémicas exacerbadas. O embate entre os diferentes interesses económicos nela envolvidos explica boa parte desta dinâmica conflitual. Foi e será sempre assim. Mas dificilmente o país assistiu ou assistirá a uma movimentação tão habilmente articulada e organizada para contrariar uma legítima decisão política. Desde uma operação mediática sem precedentes até ao envolvimento directo da Presidência da República, passando pela oposição política e à instrumentalização de uma associação empresarial, tudo está a ser utilizado para condicionar uma decisão política de grandes repercussões económicas.Só um governo muito forte resistirá a estas pressões. E infelizmente, não tem sido essa a caracterização da governação na III República. A opinião pública foi cirurgicamente formatada. As movimentações da sociedade civil de apoio à decisão são fracas, desorganizadas e pouco combativas. Os próprios governantes são desastrados na sua defesa. Os técnicos que trabalham no projecto, fazem intervenções em debates públicos e entrevistas enfraquecendo, sem motivo justificável, a solução apresentada. Nem os agentes económicos e o pessoal político das regiões mais directamente beneficiadas com a localização do aeroporto se entusiasmam e se mobilizam com o projecto. Quando o fazem é de forma envergonhada. É uma luta desigual. O combate está a ser travado entre um “exército” forte e organizado, com avultados meios financeiros e um conjunto de pessoas descomprometidas onde grassa o voluntarismo organizativo, e o amadorismo das grandes causas. Começa-se a não acreditar que a determinação do Primeiro-Ministro seja suficiente para o implementar. E quanto mais se aproxima a fase competitiva do actual ciclo político, mais remotas serão as hipóteses.A intervenção do Presidente da RepúblicaNão vai haver consenso político nem técnico na localização deste projecto. A tese do “parar para pensar”, o “estudo dos estudos” efectuado por “sábios” comparando a bondade das diversas soluções, são teses defendidas conjunturalmente por todos aqueles que sempre defenderam a localização do aeroporto a sul do Tejo. Quando o presidente de um partido, de forma pouco avisada e imprudente vai ao Poceirão, com as câmaras de televisão atrás, e jura por inspiração divina, e não com nenhuma fundamentação técnica que esta seria a melhor solução, demonstra de forma inequívoca que o consenso político será inatingível.Lamentavelmente, o debate técnico perdeu também credibilidade. Os “especialistas” estragaram o debate com excesso de emotividade. Os principais “protagonistas” já fundamentaram “tecnicamente” diversas localizações. A ideia que começa a ficar arreigada é que se consegue fundamentar tecnicamente a localização de um aeroporto segundo o interesse económico dos clientes ou de quem lhes encomenda os estudos. Assemelha-se ao parecer dos advogados na litigância dos grandes negócios.O Presidente da República sabe decerto que as questões ambientais, segurança, custos/benefícios, distância, co-participação de Feder, cursos de água, áreas de sobreiros, zonas alagadiças, construções de “Brasílias”, densidade populacional, ordenamento, movimentação de terras, vão ser argumentos ou contra-argumentos de cada solução técnica que será apresentada. Não vai haver por isso consenso técnico sobre este projecto. E a construção de um aeroporto não é um problema de engenharia ou de transportes. É mais do que isso.Percebe-se a incomodidade dos que exerceram funções governativas na década de 80 e 90, ao constatarem agora que o aeroporto da Portela ultrapassou em 2006 a sua capacidade máxima de carga e de passageiros; que se esteja por isso a “atamancá-lo” com verbas não despicientes (no próximo triénio 350 milhões euros) e nada tenham feito para contrariar de forma atempada esta situação. Compreende-se o constrangimento de nada se ter feito na evolução do dossier do NAL e agora concluir-se que em 2007/2008 o novo aeroporto já deveria estar disponível ou a operar. Entende-se que tenham ficado surpreendidos com os efeitos da globalização, com a evolução da competitividade mundial, com o papel das regiões e das cidades aeroportuárias nessa competitividade. Percebe-se finalmente o incómodo de não se ter tido visão estratégica para compreender esta evolução.Mas tudo isto não justifica que se prolongue por mais uma vez os 38 anos de estudos para a construção do aeroporto e que se condicione a decisão política da sua implementação. É o que se está a fazer quando se pede o impossível: consenso político e técnico sobre o projecto. O ex-Primeiro-Ministro Cavaco Silva não o fez, e ainda bem, quando mandou prolongar a A5, construiu o CCB junto aos Jerónimos, ou escolheu a solução Chelas-Alcochete em detrimento do Beato-Barreiro no traçado da Ponte Vasco da Gama.* Presidente da Associação Empresarial da Região de Santarém - NersantNota: Este artigo foi redigido no dia 04.06.07 e serviu de base à conferência de imprensa realizada em Lisboa. Antes, portanto, da intervenção do Ministro das Obras Públicas no Parlamento e do debate na Assembleia da República nos dias 6 e 11 respectivamente.

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