“Salazar foi uma figura fascinante”
João Paulo Cotrim foi o convidado do Museu do Neo-Realismo
O jornalista João Paulo Cotrim, convidado do museu do neo-realismo, referiu-se a Salazar como uma figura fascinante que compreendeu o país. Uma opinião que recebeu algumas críticas da plateia que ainda não conseguiu apagar as memórias desse tempo.
A conversa era para ser sobre o movimento neo-realista, mas acabou por ser mais do que isso. Na tarde de sábado, 9 de Fevereiro, no Museu do Neo-Realismo de Vila Franca de Xira, falou-se de fascismo, de censura e de opressão. O jornalista João Paulo Cotrim foi convidado do Museu do Neo-Realismo para falar sobre aspectos dessa corrente artística, mas a publicação do seu livro de banda desenhada, em co-autoria com Miguel Rocha, “Salazar, Agora na hora da sua morte”, acabou por alterar o rumo da discussão, focando-a sobretudo em reflexões sobre o fascismo, a ditadura e a opressão.As dificuldades com se debatiam os autores que procuravam espelhar a realidade no seio de uma sociedade repressiva foram os pontos que acabaram por tomar conta da discussão. No livro onde retrata Salazar, João Paulo Cotrim diz apresentar uma versão diferente da figura. “O livro de Salazar partiu de uma encomenda da editora. Nasci em 1965, não experimentei grande coisa da ditadura”, explicou o autor. “Salazar era até esta investigação para o livro a encarnação do mal. A seguir ao 25 de Abril, nas nossas brincadeiras de rua, todos queríamos ser o Otelo”, acrescentou.Entre histórias de opressão e censura, João Paulo Cotrim referiu-se a Salazar como uma figura “particularmente produtiva para a criação” e não percebe como só agora se começa a sair de “uma lógica de propaganda e contra-propaganda”. “É uma figura absolutamente fascinante. Ele foi absolutamente capaz de nos compreender como país. Talvez por isso se tenha mantido tanto tempo no poder”, afirmou o jornalista, acabando por receber alguns comentários menos positivos da plateia, constituída sobretudo por idosos, que diz não ter conseguido ainda apagar as memórias desse tempo.“Um Realismo pode esconder outro Surrealismo” foi a proposta de tema preparada pelo jornalista e escritor que, segundo o próprio, levou “meia dúzia de cromos para a conversa”. Os cromos foram caricaturistas como Abel Manta e Bordallo Pinheiro, com os quais o autor ilustrou o que diz ter sido um retrato do país feito na altura. Um assumido “filho da cultura pop”, João Paulo Cotrim diz não ver o sentido na luta entre surrealismo e realismo. “Aparte questões de natureza histórica, não me parece que faça sentido este combate entre realismo e surrealismo. Parece mais uma luta entre irmãos ou primos. Mais do que um combate de boxe, é um combate de wrestling, aquela luta fingida e coreografada. Não vejo que não haja sonho no neo-realismo”, comentou o escritor e jornalista.O jornalista João Paulo Cotrim dirigiu desde a sua abertura, em 1996 e até 2002, a Bedeteca de Lisboa. Comissariou inúmeras exposições e foi director do Salão Lisboa de Ilustração e Banda Desenhada. É autor de “Mar de Tinta”, incluído no Catálogo Oficial do Pavilhão dos Oceanos, da Expo ’98, de “O Perigoso Salto entre um e outro Quadradinho” para o Notícias do Milénio (1999), e da “biografia” de Tintim para a Visão do Século. Assinou “A Narrativa do Século – Dois ou três apontamentos sobre a picaresca viagem da banda desenhada pelo século XX” incluída em A Arte no Século XX.
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