Especial 25 de Abril | 21-04-2010 17:18

O dia em que fui ao 25 de Abril

Eram 6h00, amanhecia cinzento, pais e filhos faziam caminho para o Largo da Feira, esperava-os uma carreira, naquele dia alugada para uma visita de estudo.Não era tempo de telemóveis, os telefones quase nenhuns, a televisão coisa rara e ainda a preto e branco e os rádios poucos eram.No momento do embarque junto à escola primária a despedida entre pais e filhos lembrava alguns pensamentos de antecipação sobre outras partidas para a guerra, que ainda acontecia no Ultramar.Alguns pais mais avisados, porque a Revolução levava tempo a chegar a todo o país, regressavam a casa com os seus filhos mas, a sua maioria estava ignorante, tranquila e até um pouco cinzenta à semelhança do regime de ditadura que àquela hora já definhava.Partida às 6h30 a alegria dos meninos e meninas brilhava nos olhos preocupados dos pais que os viam partir na carreira dos Claras.Ainda não tínhamos meio caminho, naquele tempo levávamos pelo menos 3 horas a chegar a Lisboa, já os professores disfarçavam o nervosismo, pois no velho rádio A.M. da carreira a música estava sempre intervalada com estranhas mensagens de uma nova alvorada.Chegada a hora do lanche matinal foi possível usar um telefone para tranquilizar a Terra Branca e os pais dos meninos e meninas que ao contrário do que estava previsto iriam fazer uma visita de estudo ao 25 de Abril de 1974 e não aos museus ou ao Palácio de Queluz.A cada cruzamento de entrada em Lisboa, nos postos de controlo, os militares davam indicações para onde não se poderia ir, nem sequer voltar.Ainda hoje estou para saber que estratégia de negociação usaram professores como o Sr. professor Sanches para, em plena Revolução, levarem os militares a autorizar em pleno coração de Lisboa a entrada de carreiras cheias de crianças da 3ª e 4ª classe, com destino a Sete Rios, Jardim Zoológico onde nos pudemos refugiar.No regresso ficou a desilusão de não podermos visitar os museus previstos mas, a alegria das colunas de militares fazia adivinhar que um mundo novo ia começar. O Mundo da Liberdade.Às 18h00 chegávamos à Viçosa Papoila, onde já despontavam os cravos da Revolução, alguns pais choravam o regresso dos seus meninos mas, já com a certeza que não iriam para a guerra.Hoje tenho 45 anos e se há coisa que todos os anos recordo com emoção, é o dia em que a minha escola primária foi à Revolução do 25 de Abril.Glossário: Largo da Feira (Largo da República) / carreira (autocarro) / guerra (guerra colonial) / Ultramar (ex-colónias portuguesas) / Claras (empresa transportadora) / escola primária (escola do 1º ciclo) / 3ª e 4ª Classe (3º e 4º ano do 1º ciclo) / Terra Branca e Viçosa Papoila (Vila da Chamusca)* Vice-Presidente da Câmara Municipal da Chamusca

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