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O campino que nunca amou uma mulher e caiu sete vezes do cavalo

João Domingos vai ser homenageado nas festas deste ano do Colete Encarnado

Dedicou toda a sua vida ao campo ao ponto de renunciar à escola e à vida com uma mulher. João Domingos, conhecido por “Bago de Milho” tem dois amores, a campinagem e o Benfica, ao ponto de ter tatuado o símbolo do clube no peito.

O pai disse-lhe um dia que para ser campino teria que cair do cavalo “sete vezes e meia”. João Domingos ao longo dos muitos anos dedicado à campinagem já caiu sete vezes. “Ainda me falta a meia”, diz com humor. Conhecido pela alcunha de “Bago de Milho”, vai ser homenageado na edição deste ano das festas do Colete Encarnado, em Vila Franca de Xira. O troféu Pampilho de Ouro que vai receber já tem um destino, vai ser entregue ao sobrinho. “Bago de Milho” dedicou toda a sua vida ao campo. Renunciou à escola para acompanhar o pai que também era campino na herdade da Companhia Previdente, no Alentejo. Com 70 anos feitos no dia 23 de Maio conta que nos tempos do regime ditatorial de Salazar a oportunidade de andar pelo campo a tratar dos toiros lhe “dava toda a liberdade que precisava”. Nunca casou porque nunca encontrou uma mulher que amasse, mas também não se importa porque, diz, a sua grande paixão era andar ocupado com os trabalhos do campo e as “mulheres não gostam disso”. Confessa que levou uma vida celibatária.Passa os dias na companhia dos seus cães na Herdade da Casa Palha entre Alcochete e Vila Franca de Xira. Vive numa casa modesta ao lado da casa do patrão. Só sai do campo quando precisa de comprar alguma coisa ou para ir ao médico. Recorda que um dia teve um Acidente Vascular Cerebral (AVC). Quando começou a sentir-se mal foi de mota até ao posto médico de Samora Correia (Benavente). Conta que lhe meteram um comprimido debaixo da língua e o mandaram de volta para casa. Estava a entrar em casa quando apareceu o patrã o que ao vê-lo aflito chamou uma ambulância que o levou para o hospital de Vila Franca de Xira.A saúde agora já não lhe permite cavalgar pelos campos. Mas no dia da homenagem e para cumprir a tradição vai aparecer a cavalo. Vai fazer um grande esforço, mas “vai valer a pena”, diz. Dos acidentes que teve enquanto campino recorda o grande susto que apanhou quando um dia caiu da montada e ficou no chão de frente para um toiro a poucos metros. Foi o maior susto porque o seu pai morreu aos 60 anos colhido por um toiro exactamente nas mesmas circunstâncias. O campino natural de Samora Correia compara os toiros às mulheres. “Hoje diz-se que os toiros não são tão bravos. Mas há de tudo como antigamente, os mais e os menos bravos. Os toiros são como as mulheres: uma carta fechada”. João Domingos só saiu dos campos para ir cumprir o serviço militar. Esteve no Regimento de Cavalaria 3 em Estremoz. Depois foi mobilizado para a Guerra Colonial.“Bago de Milho” é adepto do Benfica e até tem o símbolo do clube tatuado no peito. Assume-se como um homem feliz que sempre fez o que gostava. “Nunca pensei ser outra coisa na vida nem estou arrependido de ter levado esta profissão. A única mágoa que guardo é a de já não ter pernas para andar com o resto da malta a ver o gado”. Sobre a arte da campinagem nos dias de hoje, “Bago de Milho” é muito crítico. Diz que a profissão está “completamente descaracterizada”. “Está a perder-se a figura do campino. Agora temos vedações que separam as herdades e facilitam muito a vida a quem toma conta do gado. Os homens só têm de ir dar a ração aos animais, de tractor ou moto de quatro rodas”. E acrescenta que actualmente o cavalo hoje “é só para enfeitar”, para levar às festas.

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