23º Aniversário | 17-11-2010 15:41

“No voluntariado recebo mais do que dou e saio daqui com a alma cheia”

Reformou-se cedo e ao fim de algum tempo sentia-se presa em casa, na aldeia de Covão do Coelho. Inscreveu-se como voluntária na Liga dos Amigos do Hospital de Torres Novas e renasceu.

Maria Gabriela Fontes foi educadora de infância em Ourém e no concelho de Alcanena durante trinta e três anos. Quando se reformou sentiu um choque. De uma vida agitada vivida no meio de crianças cheias de energia e alegria, passou para o sofá da sala a ver televisão e a enervar-se com tanta quietude. “Vivo na aldeia de Covão do Coelho. Tinha 52 anos quando me aposentei. A minha filha estava na Faculdade. O meu marido ainda trabalhava. Todos os dias a mesma rotina. Fazer a cama. Limpar o pó, lavar os dois pratos do jantar, ver televisão. Sentia-me presa. Comecei a pensar que ia dar em doida em pouco tempo. Ou fazia alguma coisa de útil ou entregava a pensão mensalmente ao psiquiatra”, conta a sorrir.Foi uma amiga que lhe falou na Liga dos Amigos do Hospital de Torres Novas. Nem pensou duas vezes e foi inscrever-se. Mas o tempo passava e nunca mais a chamavam. Insistiu e acabou por ser chamada.O tempo de espera pode ter estado ligado ao facto de os voluntários da Liga não terem acesso à maior parte dos serviços do hospital, situação que só agora começa a ser resolvida. “Estamos nas consultas externas, na fisioterapia e na consulta de pediatria”, explica Amélia Serigado, uma das coordenadoras dos voluntários. Dentro de pouco tempo os voluntários passarão a ter permissão para dar o seu contributo na cirurgia, ambulatório pediátrico e medicina. “De início havia algumas resistências mas a pouco e pouco os responsáveis vão percebendo que podemos ser importantes”, diz.A primeira tarefa de Maria Gabriela Fontes foi andar a oferecer bebidas quentes e bolachinhas na zona das consultas externas. Ficou radiante. “Há um contacto muito grande com as pessoas. Algumas das que ali vão regularmente já estão tão habituadas que esperam com alguma ansiedade. Não é pelo chá ou pela bolacha. É pelo bom dia. Por dois dedos de conversa. Pela companhia. Estão à espera que a gente as oiça. Querem falar do que as preocupa. Das dores que sentem”.Com uma pasta de desenhos na mão vai seleccionando aqueles que sairão num calendário a editar no ano que vem, Ano Europeu do Voluntariado. “Este é adequado a Janeiro. Este a Março. Tem aqui o Carnaval. Foram feitos pelas crianças que vêm aqui às consultas, explica”. Da distribuição de bons-dias e bebidas quentes adoçadas com afectos, passou para as crianças. Foi o regresso da educadora de infância àquilo que sabe melhor fazer.Guardados os desenhos percorremos um amplo corredor, subimos um piso no elevador e entramos na zona das consultas de pediatria do Hospital Rainha Santa Isabel em Torres Novas. Há um carrinho com jogos, brinquedos, lápis de cor, livros, desenhos para colorir. Duas crianças pintam. Uma trouxe um jogo electrónico de casa e está embrenhada no mesmo. A voluntária de bata amarela que tem uma jovem companheira no mesmo serviço, oferece alternativas, interage com as mães, mete conversa com os meninos e meninas. Maria Gabriela Fontes não pára. Tem mais energia que aquela que despende em Torres Novas. “Aproveitando a experiência da Liga dos Amigos do Hospital já criei um grupo de voluntárias no lar em Minde. Vou levar a experiência para lá. Estamos a organizar. Instituição muito receptiva. O presidente disse que já tinha falado com o padre para ver se arranjava isto. Deu-me luz verde”, confidencia.Maria Gabriela Fontes não sabe dizer quem beneficia mais com o trabalho voluntário que faz. Se ela ou se as pessoas com quem contacta. “Eu tinha muitos problemas de enxaquecas. Havia dias em que me sentia mesmo incapaz de vir, mas vinha e a dor de cabeça passava. O voluntariado era o meu comprimido. Aconselho toda a gente que possa a fazer voluntariado. Nós recebemos muito mais do que damos. Vai-se daqui com a alma cheia”.

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