Comer sopa de legumes da horta e poupar no pronto-a-vestir
Seniores sobrevivem com pouco e são exemplo em tempo de crise
Quando a pensão é baixa não há muito por onde poupar, mas quem se habituou a viver toda a vida em clima de contenção sabe como subsistir com os euros contados.
A horta é amanhada por Joaquim Ferreira, 76 anos. Adélia Sebastião, 70, companheira de meio século, transforma os legumes caseiros na sopa de boa qualidade a que já habituou o marido. “Não sou cá fidalgo. Fico satisfeito com o que me apresentarem à mesa”, declara Joaquim Ferreira, com uma voz meiga, a cantarolar as palavras, fazendo concorrência à música do baile que emana da Sociedade Filarmónica de Santo Estêvão, concelho de Benavente, numa tarde de domingo dedicada aos seniores da freguesia. Na horta há cenoura, alface, feijão verde, grão, tomates e pimentos. É só poupar na conta da mercearia que a pensão é curta. Ao almoço come-se um pedaço de peixe. Às vezes carne. À noite o estômago é aconchegado com uma sopa. E uma bola de pão caseiro que Joaquim Ferreira recheia com duas tenras folhas de alface da sua horta. A pensão dos dois antigos trabalhadores do campo depressa se esgota com a gorda conta de farmácia que leva os restantes euros. “Pior era a vida dos nossos avós que nem pensão tinham. Passavam fome”, lamentam.A sopa é também a base da alimentação de Rita Moura, 68 anos, costureira aposentada, a viver da reforma do marido (379 euros). Os gastos de água, electricidade e medicamentos levam-lhe grande parte do orçamento. Se houver uma farinheira ou um pedaço de carne para acompanhar o caldo tanto melhor. Se isso não for possível a sopa afinal é alimento forte, concorda também Rosalina Amaro. Com a conta da farmácia paga, pouco fica para outras avarias. E por isso – quando a idade já vai avançada - há quem dispense os luxos do pronto-a-vestir. Rosalina Amaro teve que fazer essa opção. “Tenho roupa até morrer. Mas aceito uma peça ou outra se alguém me oferecer”, ressalva. A opção é imposta apenas pelo apertado orçamento. Até porque a sénior gosta de arranjar-se, não dispensa a maquilhagem de vez em quando e - se tivesse dinheiro – confessa que iria todas as semanas ao cabeleireiro. Américo António, depois de um olhar apreensivo do alto dos 82 anos, aproxima o ouvido para perceber melhor a pergunta. É tão desconfiado como cuidadoso com os gastos. No café da aldeia onde também reside, Santo Estêvão, não deixa um euro. E o pronto-a-vestir não é propriamente o seu local de eleição. No poupar está o ganho, diz o ancião que nunca tocou num cartão de crédito.Maria Gabriela, 64 anos, foi criada em abastança, mas também foi sempre habituada a poupar e por isso a contenção já faz parte da sua rotina. Sopa é prato obrigatório para a dona de casa que inventa algumas receitas para não deixar fora o que sobrou da refeição anterior. Quando vai jantar fora com o marido pede uma dose para os dois. O companheiro de há 42 anos não pode abusar no prato e por isso poupam na saúde e na carteira. A sobremesa também é partilhada a dois. Um brinde ao companheirismo que resistiu a tempos de crise e ainda está para as curvas.
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