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Mãe Maria e os seus cinco filhos foram almoçar fora na véspera de Natal

Mãe Maria e os seus cinco filhos foram almoçar fora na véspera de Natal

Restaurante panorâmico de Alhandra pôs a mesa para receber 50 pessoas com menos recursos

Mãe Maria e os seus cinco filhos foram almoçar fora na véspera de Natal ao restaurante panorâmico de Alhandra. Pouco depois chegou um pai dedicado, servente de profissão, que lutou para que os filhos não fossem parar a uma instituição. Uma mãe solteira, hoje solitária, chorou as lágrimas de todos os dias frente ao Tejo. No dia 24 de Dezembro um restaurante de Alhandra pôs a mesa para receber 50 convidados. Bacalhau gratinado com vista para o Tejo.

Mãe Maria sobe as escadas do restaurante panorâmico de Alhandra, nas Piscinas Baptista Pereira. Traz os cinco filhos e um chapéu vermelho. Vêm para um almoço de Natal. Os outros convivas depressa lhe repetem os passos. Foram desafiados 50 para o evento, mas só aparecerá metade. Em véspera de Natal o almoço vai ser especial - não à mesa da casa alugada em São João dos Montes - mas no restaurante que abriu portas no dia 24 para receber famílias com menos recursos. Maria Alice tem 35 anos. Já trabalhou com pessoas idosas e em armazéns de logística, mas está desempregada. Sozinha, sustenta os filhos com os 500 euros do Rendimento Social de Inserção a que junta o que recebe dos abonos. Os filhos - 17, 13, 11, 9 e 3 anos – esperam pela hora marcada para o repasto impecavelmente arranjados, de olhos postos nas piscinas, lá em baixo. Trouxeram as mochilas para seguir de imediato para a margem sul onde passarão a noite de consoada em casa de uma tia. A noite de Natal de Manuel Almeida, 51 anos, e dos seus dois filhos, será também na casa da irmã, em São João dos Montes. Jessica, 11 anos, e Eugénio, 15 anos, acompanham o pai com orgulho. A mãe abandonou-os há alguns anos. Manuel Almeida não deixou que por causa disso os filhos fossem entregues à guarda de uma instituição. E lutou por eles. Jessica frequenta hoje o quarto ano. “Perdi dois anos na escola porque a minha mãe não me matriculou”, diz a menina com naturalidade a abraçar o pai. Hoje frequenta a escola no Sobralinho e o atelier de tempos livres. É o pai que a leva antes de seguir para o trabalho de servente nas instalações da Cimpor. O filho mais velho, aluno do curso de jardinagem, vai a pé para a escola que fica ali ao lado, em São João dos Montes. O pai sabe cozinhar e tratar da roupa. O arroz com batatas fritas do patriarca faz as delícias dos dois filhos e é para os descendentes quase tão requintado como um prato de restaurante.Pelo menos na véspera de Natal, à hora do almoço, ficará de lado o pão com manteiga que tantas vezes aconchega o estômago sofrido de Teresa Ferreira, 46 anos. À primeira pergunta os olhos inundam-se-lhe, mas não da doce água do Tejo, ali ao lado. Lembra-se de repente do filho com cancro, aos 28 anos, da neta de três, dos desentendimentos com a nora e da ordem de despejo. Não tem emprego, nem subsídios. No Verão ainda há uma carpete ou outra para lavar. Neste Inverno tem apenas quatro horas de limpeza numa casa. Um trabalho que lhe rende 35 euros por semana. Também por isso deixou de pagar há seis meses a casa que alugou em Alhandra por 300 euros convicta de que conseguiria passar a perna às dificuldades da vida.As amigas repartem com Teresa muitas refeições prontas. O cabaz de alimentos a que tem direito entrega-o na casa do filho, que criou sozinha desde os quatro anos, altura em que o marido os abandonou. Foi mãe aos 16 anos e trabalhou como empregada doméstica. Deixa uma promessa para o caso das dificuldades teimarem em não a deixar: “Se for preciso volto a ser interna”. Pelo menos na véspera de Natal, à hora do almoço, ficou de lado o pão com manteiga.Bacalhau gratinado e lombo para o almoçoMuitos dos clientes que na sexta-feira, à hora do almoço, se sentaram nas mesas do restaurante panorâmico de Alhandra “Nine”, nas Piscinas Baptista Pereira, não pagaram a conta. O proprietário decidiu oferecer uma refeição sofisticada a meia centena de pessoas carenciadas da freguesia, onde montou negócio em Abril deste ano. A lista dos convidados foi elaborada com a ajuda da junta de freguesia e Misericórdia de Alhandra.“Um colaborador que temos no restaurante apareceu-me aqui um dia a pedir trabalho. Não tinha onde dormir. Hoje vive num quarto, mas tem grandes dificuldades. Tudo isso me fez pensar”, explica o empresário Lúcio Morais, 42 anos, que em colaboração com a sócia decidiu oferecer pelo Natal uma refeição gratuita a quem mais precisa. A ementa foi a mesma apresentada aos clientes: sopa de grão, bacalhau gratinado no forno com broa e um prato de carne – lombo de porco – a pensar nos mais pequenos. Todas as sobremesas disponíveis para os outros clientes foram colocadas à disposição.Lúcio Morais, que nesse dia recebeu no restaurante o filho e os pais, serviu à mesa os convidados especiais. Preferiu observar à distância, com discrição, o brilho do olhar dos convidados em vez de fazer contas ao que gastou. “Nem sequer pensei nisso e nem tão pouco me interessa”, diz prontamente o proprietário do restaurante que é também funcionário público em Algés.A ideia foi proporcionar uma refeição num sítio que muitos julgariam inacessível. “É muito fácil cair numa situação destas. Mais difícil é sair”, afirma pensativo.
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