CAP tomou conta da Feira do Ribatejo por razões políticas
Actual modelo da Feira do Ribatejo está a matar o certame idealizado por Celestino Graça. Críticas de Ludgero Mendes à margem do Congresso de Folclore do Ribatejo.
A Feira do Ribatejo está descaracterizada do certame que Celestino Graça criou há 60 anos e organizou durante 21 anos e o actual modelo da feira está a “matar” o que foi idealizado por Graça e tanto trabalho lhe deu a projectar e realizar. As críticas são de Ludgero Mendes, organizador do Festival Internacional de Folclore Celestino Graça, que falou com O MIRANTE à margem do IV Congresso Celestino Graça/IX Congresso de Folclore do Ribatejo.O presidente do Grupo Académico de Danças Ribatejanas, e homem conhecedor das tradições folclóricas, considera que a Feira do Ribatejo/Feira Nacional de Agricultura perdeu sobretudo a componente tradicional, ao transferir-se para o CNEMA (Centro de Nacional de Exposições e Mercados Agrícolas). “A Casa do Campino, onde sempre se realizou a Feira do Ribatejo, é um espaço muito acolhedor e estava identificado com as manifestações regionais que aqui aconteciam. A Feira da Agricultura, como é actualmente, não caberia neste espaço do antigo campo da feira. No entanto, não tenho dúvidas que, se Celestino Graça fosse vivo, arranjava maneira de esticar este espaço, e já existiam estudos nesse sentido quando ele era vivo, de maneira a que a feira se pudesse realizar no planalto”, afirma Ludgero Mendes.A Feira do Ribatejo foi ganhando cada vez mais peso e tornou-se um dos certames mais procurados por agricultores de todo o país. Quando o empresário queria dar a conhecer um novo produto fazia-o na Feira do Ribatejo. Dez anos depois, em 1964, o certame é promovido a Feira Nacional de Agricultura, mantendo no entanto o nome de Feira do Ribatejo.O dirigente recorda que em “determinada altura”, em meados da década de 80, a CAP (Confederação de Agricultores de Portugal), que gere o CNEMA, quis manifestar a sua força no seio da agricultura e fez um boicote à feira. Ludgero Mendes recorda que para contornar o problema o presidente da Câmara de Santarém nessa altura, Ladislau Teles Botas, criou uma estrutura tripartida, que incluía a câmara municipal, a CAP e o Ministério da Agricultura. “Foi aí que a câmara perdeu a capacidade de intervenção no programa da feira e a CAP começou a dominar. A CAP começou a mandar na Feira do Ribatejo quando se entrou numa estrutura societária. Como tinha uma boa relação com o ministro da Agricultura da altura, Álvaro Barreto, começou a ficar com uma percentagem maior que o município e isso fez diferença”, conta Ludgero Mendes.“Hoje a Feira do Ribatejo é aquilo que a CAP quiser”O ex-vereador da Câmara de Santarém conta ainda que a CAP foi comprando as quotas de pequenos accionistas, cuja participação era irrisória, e que isso lhe foi dando maioria e força e a Câmara de Santarém nunca mais conseguiu recuperar o poder que tinha na organização da feira. “Hoje a Feira do Ribatejo é aquilo que a CAP quiser, não existe qualquer capacidade efectiva por parte da câmara municipal”, sublinha, acrescentando que, actualmente, a feira vive “muito à custa” dos concertos com artistas mediáticos. “Trazem gente à feira mas esta não é a Feira do Ribatejo no seu pleno, não é a feira do povo, como Celestino Graça idealizou”, destacou.Ludgero Mendes acredita que se Celestino Graça fosse vivo teria intervindo na altura em que a feira mudou de local e as relações entre a CAP e a Câmara de Santarém deixaram de ser as melhores. O dirigente garante que Celestino Graça teria valorizado ainda mais a componente tradicional como fenómeno de atracção para a nova Feira do Ribatejo do que a componente agrícola, como veio a acontecer. “Celestino Graça não seria capaz de ficar a assistir a ver as coisas desagregarem-se. Teria alertado a câmara de que não poderia perder a responsabilidade da organização da Feira do Ribatejo”, conclui.Quem foi Celestino GraçaCelestino Graça nasceu a 9 de Janeiro de 1914 no lugar do Graínho, em Santarém. Concluiu o curso de Regente Agrícola, em 1932, na Escola de Regentes Agrícolas de Santarém. Foi um dos fundadores da Associação Académica de Santarém, clube desportivo que iniciou actividade em Outubro de 1931, tendo sido guarda-redes da “Briosa”. Foi também membro da direcção e posteriormente representou o clube na Associação de Futebol de Santarém.Depois de exercer a sua profissão em Sintra e Caldas da Rainha conseguiu transferência para Santarém. Foi o principal obreiro e dinamizador da Feira do Ribatejo e do Festival Internacional de Folclore de Santarém. Celestino Graça foi uma das grandes figuras de Santarém e por isso mesmo, 39 anos após a sua morte, ainda hoje é recordado.Todos os anos se realiza o Congresso de Folclore do Ribatejo/Congresso Celestino Graça. O certame decorreu este ano nos dias 19 e 20 de Setembro, na Casa do Campino, em Santarém. Na noite de inauguração, Ludgero Mendes recordou a vida e obra do amigo, falecido em Outubro de 1975. No sábado falou-se nas influências das regiões portuguesas nos ranchos.
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