É preciso valorizar mais a importância da música na formação dos jovens
Armindo Manuel Luís dirige a banda da Euterpe Alhandrense há duas décadas
Há vinte anos que a banda da Euterpe Alhandrense é comandada por Armindo Luís, um apaixonado por música que é também maestro-adjunto da banda da Guarda Nacional Republicana. Na Euterpe está a dirigir um projecto pioneiro de transformar a banda filarmónica em sinfónica, com a adição de instrumentos de cordas.
Para os pais o ensino da música ainda não é visto como uma prioridade e isso é errado. A opinião é de Armindo Manuel Luís, 53 anos, maestro que lidera a banda da Sociedade Euterpe Alhandrense há vinte anos. O responsável, que é também maestro-adjunto da banda da Guarda Nacional Republicana, vinca que os pais precisam de valorizar mais a importância da música na vida dos filhos. “De uma forma geral valorizam muito o desporto, e fazem bem, mas não se devem esquecer da música. Os pais deviam ter o cuidado de meter os filhos em actividades que possam desenvolver as suas capacidades físicas mas também espirituais, de criatividade, de destreza, e a música trabalha isso, a nossa parte mais criativa. Se eles conseguirem ter essa visão os filhos saem muito a ganhar”, refere.Armindo Luís admite que os jovens hoje estão muito sobrecarregados com actividades e estudos. “Os pais preocupam-se muito em preencher demasiado o tempo dos miúdos, não lhes dão tempo para desenvolverem algumas das suas capacidades. Esse problema reflecte-se depois nos ensaios. Em certas alturas, como nos exames, há uma pressão muito grande”, confessa.Aí entra também o maestro, que tem um trabalho não só de músico mas também de psicólogo, conselheiro e amigo. “Não podemos descurar a parte musical, com repertórios que tenham ritmo. Porque se isto não lhes disser nada eles preferem ficar no sofá. Mas devemos ter a perspicácia de olhar para os jovens, ver quem está bem ou não e às vezes no final do ensaio ajudar em algumas situações. Nota-se com facilidade quando um músico não está bem”, confessa. Armindo Luís deu nas vistas no ano passado por ter feito uma aposta ousada num conceito inovador em Portugal entre as bandas filarmónicas: transformar um grupo filarmónico em sinfónico, com a adição de instrumentos de cordas - violoncelos e contrabaixos - que estavam disponíveis através do Conservatório Regional Silva Marques. Antes só as bandas nacionais da Guarda Nacional Republicana e da Polícia de Segurança Pública o fizeram.“É uma iniciativa pioneira e inovadora no país entre as filarmónicas. A mudança para banda sinfónica abre novas possibilidades, o timbre muda, as peças que apresentamos mudam. Já fizemos o nosso primeiro concerto nestes novos moldes, no aniversário da Euterpe, e o balanço foi muito positivo”, refere o maestro a O MIRANTE.O responsável admite que nos próximos dois anos conseguirá ter quatro contrabaixos e seis violoncelos a integrar a banda. “Há pormenores que só são possíveis com cordas. Normalmente um arranjo para filarmónica é diferente de sinfónica. Imagine uma tuba a fazer uma passagem em pianíssimo. A delicadeza de um instrumento de corda e a facilidade como o vai fazer é completamente diferente”, explica. A ambição é integrar também um oboé e um clarinete baixo na banda, que tem cerca de 60 elementos, metade dos quais são jovens na casa dos 15 e 16 anos.O maestro defende também que se os espectáculos apresentados na região forem bons e inovadores, o público não precisa de ir a Lisboa para encontrar uma oferta cultural interessante. “Temos casa sempre cheia nos concertos, é sinal que as coisas estão a correr bem. A Euterpe é uma casa ambiciosa e isso passa muito pelo presidente [Jorge Zacarias] que está sempre a pensar na iniciativa seguinte. Criou-se aqui um hábito e um ritmo de trabalho tão grande que se instalou no público a ideia de que alguma coisa está para acontecer na Euterpe, mais tarde ou mais cedo, e que por isso vale a pena estar atento. Isso é de registar. Estamos às portas de Lisboa, mas se os espectáculos tiverem qualidade as pessoas não saem daqui”, defende.Um sargento saxofonista Armindo Manuel Luís nasceu em Tarouca, distrito de Viseu, e comanda a banda da Euterpe desde 1995, altura em que foi convidado para liderar o projecto. Desde então apaixonou-se pela região e pelas pessoas. “Já dirigi bandas em vários locais do país, como Arouca ou Trofa, e nunca conheci um agrupamento com um efectivo tão virtuoso do ponto de vista humano como aqui em Alhandra. É gente de uma educação como nunca vi em mais lado nenhum”, elogia.Entrou na música graças ao pai, que já tocava, e começou a tocar saxofone. Foi para o Conservatório de Coimbra com 14 anos e aos 18 concorreu à banda da GNR, que diz ser uma das suas paixões, a par com a banda de Alhandra e a banda do Seixal, que também dirige. Chegou a ser professor na Academia Luísa Todi, em Setúbal. Actualmente é sargento-mor e vai retirar-se no final do ano por ter atingido o limite de tempo no posto. Diz que só com empenho e muito trabalho se consegue chegar longe na música. É uma pessoa que decora bem números mas é uma desgraça com nomes. Onde ouve mais música é no carro e tem sempre a Antena 2 ou a Smooth sintonizadas. Em casa mais de metade da colecção é música clássica - Beethoven, Mozart ou Gustav Mahler (o seu favorito, especialmente a quinta sinfonia) mas tem também Pink Floyd e Queen. Hoje não se vê a fazer outra coisa senão estar ligado à música. Confessa ser um homem de sorte por ser pago para fazer o que gosta. No concelho de Vila Franca de Xira gosta do sável e de usufruir do passeio ribeirinho. “É um sítio fantástico. Liguei-me de tal forma a isto e às pessoas daqui que não passo sem vir cá”, conta. No último ano, durante o aniversário da Sociedade Euterpe Alhandrense, o maestro foi homenageado pelas suas duas décadas de ligação à banda.Filarmónicas ainda são o “parente pobre” da músicaPara o maestro da banda da Euterpe as filarmónicas ainda são o parente pobre da música, sobretudo para o Estado central, que dá poucos ou nenhuns apoios para dinamizar as actividades. “Os ministérios da Educação e da Cultura deviam valorizar mais as filarmónicas. Foi criado o dia da filarmónica mas isso é muito pouco. Nesse parâmetro é o parente pobre. As grandes escolas de música do país são as filarmónicas. Era daí que muitos músicos saíam para as orquestras e conservatórios. Eram elas as primeiras a ensinar música quase gratuitamente. Devia haver um apoio mais efectivo, mesmo financeiro, a nível do governo, às filarmónicas. Criar condições para elas se desenvolverem de outra forma”, defende.Todos os anos as bandas estão a crescer em qualidade graças a um conjunto de novos instrumentistas que estão a integrar as diferentes filarmónicas. “Portugal é um país bom para músicos. Quem tiver oportunidade de estudar música deve fazê-lo. Mesmo que não faça da música profissão fica sempre com essa cultura geral. Cabe aos conservatórios ver se o aluno tem ou não capacidades para vingar na música”, reflecte.Câmara de Vila Franca de Xira é um exemploA Câmara de Vila Franca de Xira é, na opinião do maestro da banda da Euterpe, um exemplo de apoio ao movimento associativo. Líder da banda há 20 anos, Armindo Luís elogia o que considera ser “uma atenção muito grande” do município face ao movimento associativo e elogia o facto de estar sempre presente. “Quando vou a concertos em terras aqui no concelho, mesmo as mais pequenas, quando é o aniversário da associação da terra, por exemplo, ou está presente o presidente da câmara ou alguém a substituí-lo. Isso não se vê em todos os lados. Aqui é um exemplo, têm esse cuidado e sempre uma palavra de apreço no final dos concertos. Vê-se que se interessam bastante por estes assuntos. E os músicos sentem isso. É muito importante, saber que quem lidera está atento, valoriza e apoia-nos”, conta.
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