“É difícil encontrar pessoas responsáveis e com vontade de trabalhar”
Ricardo Matias da Silva, 44 anos, sócio-gerente da Vítor Matias C. C. Lda. Começou a trabalhar como ajudante de mecânico aos 13 nos de idade.
Agora é sócio-gerente da Vítor Matias C. C. Lda, na zona industrial de Santarém, uma empresa que vende materiais para construção e bricolage, máquinas, ferramentas e mobiliário de escritório. Ricardo Matias quando fala em dinheiro usa o escudo como referência porque considera um erro termos aderido ao Euro. Acha que o serviço militar deveria voltar a ser obrigatório. O único momento em que desliga o telemóvel é quando vai ao Estádio da Luz ver o Benfica.
Comecei a trabalhar aos 13 anos como ajudante de mecânico numa oficina em Santarém. A minha família era humilde e eu fui trabalhar para a ajudar. O ordenado na oficina era de 3 contos (três mil escudos) por mês. Depois quando fui para o campo comecei a ganhar 3 contos por semana.
Estou sempre a falar em escudos porque acho que o euro não vale nada. Acho que se tivéssemos ficado no escudo os portugueses teriam mais vantagens. Aumentou tudo mais de cem por cento e algumas coisas duzentos por cento, mas os ordenados ficaram no mesmo valor. Acho que as pessoas começaram a perder a noção do valor do dinheiro.
Fico muitas vezes a pensar como é que algumas pessoas conseguem viver com o ordenado mínimo. Duas pessoas a ganharem o ordenado mínimo que tenham dois filhos, não têm hipótese nenhuma. Para se viver razoavelmente cada pessoa tem de levar para casa 1500 euros.
É difícil encontrar pessoas responsáveis e com vontade de trabalhar. Aqueles que são bons estão todos fora do país. Estamos a perder as pessoas com valor. Com esta idade não me passa pela cabeça sair do país mas houve uma altura em que pensei seriamente nisso. A minha ideia era ir para uma plataforma petrolífera mas isso já foi há muitos anos.
Tenho dois filhos que gostava que dessem continuidade à minha empresa. No entanto, duvido muito que eles queiram seguir isto. A minha filha mais velha vai entrar agora na Universidade para tirar Biologia. Seja como for, pelo menos vou-lhes deixar alguma coisa e quero que eles sejam felizes com as escolhas que fizerem.
O Serviço Militar devia ter continuado a ser obrigatório. Pelo menos durante três meses. Podia contribuir para atenuar a falta de educação e a falta de respeito que agora existem. Estão-se a perder muitos valores. Se as pessoas não tiveram educação como podem dá-la aos seus filhos.
Aprendi muito com os mais velhos e estou sempre a aprender com todas as pessoas com que me vou cruzando na vida. Até com os sem-abrigo que ajudo quando vou a Lisboa. Ninguém lhes liga importância e penso sempre que amanhã posso ser eu a estar ali. Já me aconteceu querer dinheiro para beber um café e não ter.
O meu dia normal de trabalho é sair às seis da manhã de casa e não ter hora para voltar. Normalmente ando sempre por fora em reuniões. Como estou pouco tempo em casa, na televisão, só vejo notícias. Vou ao cinema e de vez em quando vou jantar com os amigos e nesses momentos consigo desligar, nunca se fala em negócios. Quando quero descansar vou para junto do mar.
As minhas grandes paixões são os carros e o Benfica. Na minha garagem tenho sete carros topo de gama porque fui comprando e nunca vendi nenhum. A marca que mais aprecio é a Volvo.
Quando vou ao estádio da Luz a minha cabeça não pensa em mais nada. Pode acabar o mundo que eu nem dou por nada. Quando vou à bola até desligo o telemóvel. Mas assim que começa uma discussão por causa do futebol ao pé de mim fujo logo dali.