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Alhandra enterra o Entrudo com recados de mal dizer

Alhandra enterra o Entrudo com recados de mal dizer

O Enterro do Carnaval inclui mulheres de negro em ladainhas que provocam o riso, um cortejo fúnebre pelas ruas da freguesia, versos carregados de sátira e “bocas” a quem não abriu os cordões à bolsa para apoiar os foliões.

É uma tradição que rivaliza com o desfile dos corsos no dia de Carnaval. Na quarta-feira “de luto” várias mulheres começam a chegar à sede da Sociedade Euterpe Alhandrense. Vão velar o “morto”, que é o mesmo que dizer o Entrudo. À espera das “viúvas” estão as gentes da terra e convidados, que nem em todo o lado se findam os festejos com tanta solenidade... e riso.
É que o boneco do Carnaval é um homem de cera com o falo bastante evidente. Antes de sair para a rua está num caixão, rodeado de velas e flores, e recebe a visita chorosa das várias viúvas. “Ai que eras um traidor”; “A mim deixaste-me prenha e àquela com um filho nos braços”, gritam as viúvas, de perucas postas e vestidos negros a roçarem no chão. As gargalhadas sobem de tom e ainda nem se deu início ao desfile. “É um fartote de rir”, diz um dos membros da Comissão do Carnaval.
As voluntárias que fazem o papel de enlutadas são mulheres da freguesia, algumas membros da Euterpe Alhandrense, que organiza o Carnaval de Alhandra. Aqui, a tradição não irá morrer, tendo em conta as muitas crianças e jovens que acompanham o Entrudo até ao seu destino final: uma fogueira (ainda que seja outro o boneco que arde, pois aquele que desfila será guardado para próximos Carnavais). Este é também o segundo ano que a Comissão de Carnaval lança fogo de artifício no fim do Enterro.

Frangos que parecem pombos e comerciantes avarentos
Antes, o desfile do carro funerário percorre as ruas da freguesia. É encabeçado por uma carrinha da Euterpe, onde o mestre de cerimónia, altifalante numa mão e cábula na outra, vai ditando os versos de maldizer. A caravana pára no primeiro ponto, junto ao coreto e ouvem-se as críticas: “Aqui tenho de parar / E perguntar para quem ouvir / Então mas o nosso teatro é para fazer / Ou o que é que está para vir?”.
Mas é na paragem seguinte, no largo da Praça, que os versos atingem mais alvos. “No outro dia fui aos frangos / Pensei que estava noutro local / Só faltam lá os pombinhos / Porque o resto agora é igual / Mas este foi um grande negócio / Inteligência e esperteza puras / Se calhar andamos a comer pombos / Por isso é que os frangos são miniaturas...”.
Risota geral, e lá segue a marcha. Muitas das “bocas” que se ouvem no cortejo são dirigidas aos comerciantes que não quiseram dar uma ajuda ao Carnaval da terra. “O Rodrigues dos automóveis / Uns bons carros consegue despachar / Negócios bons que dão dinheiro / Bem que podia ajudar!”.
A verdade é que nada nem ninguém escapa à sátira. “No nosso centro de saúde / Consultas de rotina podem fazer / Só que esperam tanto tempo / Que acabam por adoecer”. Mas nem todos são versos de “espetar o alfinete.
O desfile serve ainda para agradecer a quem apoiou os festejos deste ano, como ao Telmo, o jovem da Comissão do Carnaval, que angariou os dois reis de borla para desfilarem por Alhandra. Até o nosso jornal foi visado nos versos: “E da novela um protagonista / Zacarias, o presidente ?/ tem sempre texto na ponta da língua / E é sempre muito convincente / N’
O MIRANTE dançou de verde / numa bela caricatura / será que sabem que é do Benfica? / Como passou pela censura?”.

Nem a Comissão do Carnaval escapou às “alfinetadas”

No Enterro do Entrudo os versos atingem todos, mesmo aqueles que fazem parte da organização. Não faltaram, por isso, os agradecimentos a quem ajudou a montar a festa (ainda que sempre com uma pitada de maldizer): “Negócio também é o das Farturas / Do nosso Carlos da Comissão / Trabalha num lado, ajuda no outro / Que nunca lhe falte tesão!”.
Mas foi a quem só marcou presença que foram destinados os versos mais acutilantes: “Para o ano que cá estejam todos / E mais quem quiser ajudar / Mas se só vêm fazer figura / Para mim até podem ir cagar!”.
Nem os patrocinadores do Carnaval escaparam ao crivo deste Entrudo endiabrado: “A grande fábrica da Cimpor / Tanto faz bem como faz mal / Só manda é merda cá para fora / Mas ajuda o Carnaval!”. E até os bombeiros saíram chamuscados. “Nos nossos Bombeiros de Alhandra / Os Caetanos já fazem parte da mobília / Agora o comandante é a Carmelita / fazem bem, fica tudo em família”.
Os versos são da autoria de um membro da Comissão... que é para permanecer anónimo. É que o Carnaval são três dias e Alhandra é uma terra pequena.

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