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“Quando se trabalha por gosto tudo se ultrapassa”

“Quando se trabalha por gosto tudo se ultrapassa”

João Filipe fez boa parte da sua vida profissional na Marinha, tendo integrado tripulações de navios e de submarinos. Entretanto abriu um negócio de venda de electrodomésticos e oficina em Marinhais, a sua terra natal, onde é também presidente do Núcleo de Cicloturismo “Os Cansados”.

Histórias para contar é o que menos falta a João Filipe, presidente do Núcleo de Cicloturismo “Os Cansados” de Marinhais, concelho de Salvaterra de Magos, há cerca de 18 anos. Um apaixonado pela mecânica e pelo ciclismo que encontrou neste núcleo uma forma de divulgar esse desporto, Marinhais e ao mesmo tempo conviver e aprender com os outros.
Foi ainda em pequeno que João Filipe, 65 anos, construiu a sua primeira bicicleta, e desde então, nunca mais parou. Sempre mostrou predilecção pelo ciclismo e por tudo o que estava ligado à mecânica, de tal maneira que hoje é proprietário da Friotécnica. Uma loja que vende e repara electrodomésticos e ares condicionados situada na estrada principal de Marinhais.
Se o ciclismo apareceu mais tarde na sua vida, já a mecânica surgiu ainda na sua adolescência depois de ter saído da escola e começado a trabalhar. Primeiro esteve numa serralharia perto de Muge, concelho de Salvaterra de Magos, depois foi para uma carpintaria, em Marinhais, mas quis o destino que fosse trabalhar para uma oficina que reparava máquinas agrícolas e, a partir daí, nunca mais se desligou desse ramo de actividade que tanto prazer lhe dá.
João Filipe conta que, naquela altura, não era fácil entrar numa oficina. Foi graças a uma peripécia que conseguiu lá um lugar. “Quando tinha 11 anos, num certo dia, quando regressava a casa na minha bicicleta depois de ir desobstruir as manilhas de uma vala que estava entupida, encontrei na estrada 500 escudos, que na altura era muito dinheiro. Levei para casa e mostrei logo à minha mãe. Entretanto nesse dia à tarde, a minha mãe ouviu dizer que um funcionário da oficina tinha perdido o dinheiro quando se deslocava na sua bicicleta para ir pagar os ordenados aos serventes, pintores e pedreiros que lhe arranjavam a casa. Chegou a casa e pediu para eu ir lá entregar o dinheiro. Quando cheguei à oficina, o funcionário perguntou se era eu que tinha feito um pedido para trabalhar lá. Eu confirmei e foi ele que me arranjou o lugar na oficina”, conta.
Mas não ficou por ali. João Filipe queria adquirir mais conhecimentos e decidiu ir para a Marinha e especializar-se em refrigeração e ar condicionado. Começou nos navios e, mais tarde, foi nomeado para os submarinos. O “desafio maior” que diz ter realizado. Foram muitas as aventuras que passou durante os 37 anos que dedicou à Marinha, sobretudo durante o tempo que esteve nos submarinos.
João Filipe admite que a vida nos submarinos não é nada fácil, não só porque estão muitos dias confinados a um espaço onde nunca se vê o sol, mas também porque o pão “anda lá a rebolar 15 dias” e não há comunicações telefónicas com o exterior. Conta que sempre enjoou nos navios e quando o submarino vinha à superfície. “Nem sei como consegui estar tantos anos na Marinha”, confessa, referindo que foi uma vida de sacrifícios, mas de que não se arrepende porque “quando se trabalha por gosto tudo se ultrapassa”, nomeadamente com o apoio familiar.
Foi já aos 33 anos que João Filipe decidiu abrir a sua loja para venda e a oficina para reparação de electrodomésticos e ares condicionados. Primeiro, era acompanhado pela sua esposa. Depois, ao passar à reserva, começou a dedicar-se a tempo inteiro ao seu “grande projecto”.
O Núcleo de Cicloturismo “Os Cansados” de Marinhais surgiu no dia da inauguração da rua Narciso Santos, em Marinhais. “Estávamos todos em festa quando decidimos criar este núcleo, já que não havia nenhuma associação dedicada ao ciclismo neste concelho”, adianta. Na altura foi escolhido para presidente por acaso e, desde então, tem-se dedicado de corpo e alma a essa associação que já faz 18 anos de existência.
Colocaram o nome de “Os Cansados” ao núcleo porque, durante as reuniões para a organização da festa da inauguração da rua, que eram ao final do dia, “estavam sempre todos cansados e, como o núcleo nasceu dessa inauguração, decidimos colocar esse nome”, explica. Com essa associação, João Filipe diz ter feito quase metade de Portugal em bicicleta. Todos os domingos, de Março a Setembro, faz questão de ir a provas por esse país fora, sacrificando a vida profissional e a vida pessoal para representar o núcleo, tudo por amor ao ciclismo e ao convívio.

“Quando se trabalha por gosto tudo se ultrapassa”

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