Os mecenas agora são merceeiros e o Cine-Teatro de Abrantes está a ganhar pó
Há uma sala de espectáculos em Abrantes que está fechada desde Janeiro de 2018. Chama-se Cine-Teatro S. Pedro e pertence a uma sociedade que ironicamente se chama “iniciativas”. Nas que, pelo menos neste caso, a única iniciativa que tem tido é deixar o tempo correr para tentar ganhar mais dinheiro que aquele que a câmara municipal se dispõe a pagar para voltar a ter a sala a funcionar, como já teve, proporcionando à população da região espectáculos de qualidade a preços acessíveis, garantindo assim o acesso dos cidadãos a bens culturais, isto para além de usar a sala para iniciativas das colectividades e associações do concelho.
A câmara, a quem se deve, diga-se, o facto de a sala ainda existir, investiu lá muito dinheiro em obras de recuperação e equipamentos, ao longo de 18 anos. Fê-lo porque sabe que já não há mecenas em Portugal nem sequer pessoas capazes de arriscar um cêntimo na promoção de espectáculos culturais.
Aconteceu o mesmo por todo o lado. Os mecenas de outrora, que investiam em arte e no bem comum, passaram a merceeiros que só olham para o lucro pessoal. Ao fim do contrato que lhe permitia usar a sala, não o conseguiu renovar porque os proprietários pedem mais do que a Câmara deve dar. E note-se que a câmara de Abrantes quer comprar ou arrendar a sala, não para ganhar dinheiro mas para cumprir o seu papel de promover a cultura.
Os proprietários não se importam que as populações não possam ter acesso à cultura. O seu único interesse é o lucro. Não querem a sala para promover espectáculos ou iniciativas culturais mas para a manterem fechada, partindo do princípio que à medida que a sala se vá degradando a câmara venha a ceder e a pagar o que eles querem, para não ter mais um edifício em ruínas na cidade.
Alguns espectáculos e outras iniciativas culturais promovidas pela Câmara Municipal de Abrantes estão a ser feitas no auditório da Escola Secundária Dr. Manuel Fernandes e na Sociedade Recreativa Tramagalense, por exemplo, como aconteceu há dias com o concerto de Ana Bacalhau. Os artistas e os espectadores têm piores condições mas isso que interessa aos merceeiros?
Carlos Serafim Botas