Médico teve de vender carro para pagar casa e deslocações para trabalho
José Vizcaino fica sem vencimento durante meses sempre que lhe é renovado o contrato. A falta de médicos de família em Azambuja é colmatada com a contratação anual de médicos tarefeiros que ficam meses a trabalhar sem receber. Na enfermagem estão em falta 40 por cento dos profissionais contratados e não há administrativos em número suficiente. As conclusões são da concelhia do PSD de Azambuja após visita ao Centro de Saúde de Azambuja.
O médico José Vizcaino ficou dois meses sem receber o pagamento pelas escalas realizadas - 40 horas semanais - na Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados (UCSP) de Azambuja e Alcoentre. A residir em Lisboa, conta a O MIRANTE que teve de vender o carro e um fio de ouro para pagar as despesas de habitação e deslocação para poder ir trabalhar.
Contratado pelo Sistema Nacional de Saúde (SNS) para prestação de cuidados a utentes sem médico de família, o clínico tarefeiro comenta que todos os anos, a cada renovação de contrato, a situação se repete: “Em 2018 fiquei três meses sem receber. Tive de pedir dinheiro a uma colega para poder renovar o passe de transportes e fiquei a dever a renda de casa, o pagamento da água e da luz”.
Contactada por O MIRANTE, a Administração Regional de Saúde (ARS) de Lisboa e Vale do Tejo refere que tratando-se de uma prestação de serviços, “o contrato está sujeito ao Código da Contratação Pública, o que implica um extenso processo administrativo com a necessidade de entrega de variadíssima documentação por parte do prestador” e verificação por parte desta entidade, reiterando que a situação já se encontra regularizada desde o final de Março.
Rui Corça (PSD), vereador na Câmara de Azambuja, salienta, porém, que apesar de haver trâmites a cumprir “é uma situação intolerável, por se tratar do salário das pessoas”. O vereador que, juntamente com outros eleitos do partido na assembleia municipal, visitou a UCSP de Azambuja, sublinhou ainda que recrutar um médico tarefeiro “está longe de ser o mesmo que atribuir ao utente um médico de família”, acusando o Governo PS de ter falhado a meta para a atribuição de médico de família a todos os utentes, proposta em 2017.
Com os quadros médicos por preencher na USCP de Azambuja e 25 por cento dos utentes (cerca de 4.000 pessoas) sem médico de família, a ARS indica que “tem privilegiado a contratação directa com médicos para prestação de cuidados a utentes sem médico de família, diminuindo a contratação de empresas”, para o efeito.
40 por cento dos enfermeiros não estão ao serviço
Quanto à enfermagem na UCSP de Azambuja apesar do quadro de admissão de pessoal estar completo, 40 por cento dos clínicos não estão a trabalhar, provocando sobrecarga de trabalho para os restantes profissionais e a insatisfação dos utentes. Segundo Rui Corça tratam-se sobretudo de “enfermeiros colocados que não aceitam vir trabalhar para Azambuja, por não ser um destino atractivo”, havendo também “casos de baixa médica e destacamento” para outras unidades de saúde.
Durante a visita dos sociais-democratas ouviram-se garantias de que nenhuma unidade de saúde vai encerrar naquele concelho, porém, não se vislumbraram soluções para o “atendimento ao público deficiente”. “Os utentes não conseguem marcar consultas por telefone, porque simplesmente ninguém o atende”, diz Rui Corça. Sobre esta matéria, o ACES Estuário do Tejo desculpa-se com a existência de um e-mail das unidades como via alternativa, que o vereador do PSD desvaloriza. “Não nos podemos esquecer do local onde estamos, onde muitas pessoas, sobretudo idosos, não têm capacidade ou possibilidade para aceder a esse tipo de comunicação”, diz.