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Pardal Henriques diz que a greve dos motoristas decorreu num estado de guerra
Pardal Henriques realça que as conquistas obtidas foram muito além do resultado da greve

Pardal Henriques diz que a greve dos motoristas decorreu num estado de guerra

Da luta dos motoristas à candidatura a deputado a vida de Pedro Pardal Henriques virou do avesso. Nascido em Alpiarça há 41 anos o advogado passou de um desconhecido a figura mediática mais noticiada que o próprio primeiro-ministro, aquando da segunda greve de motoristas. Em entrevista a O MIRANTE, diz que durante as greves a mensagem se centrou no mensageiro e não na causa que levou os motoristas a sair para a rua e que a luta foi inglória porque o Governo se pôs do lado dos aliados económicos.

Pardal Henriques ajudou a vencer uma parte da batalha dos motoristas, mas perdeu a guerra nas últimas legislativas, como candidato a deputado pelo Partido Democrático Republicano (PDR). Confessa que hoje não teria aceitado o convite porque não estava preparado para lidar com as máquinas partidárias que abafam a voz dos pequenos partidos.

Uma conversa onde Pardal Henriques fala sobre o pai, que foi motorista e nunca parou de conduzir mesmo quando lutava contra um cancro. Houve ainda tempo para recordar os momentos que marcaram os últimos meses enquanto porta-voz do sindicato e candidato pelo PDR quando não havia tempo para dormir e o puseram à beira de um esgotamento.

A conversa, que se fez acompanhada de um café no Museu do Neo Realismo, em Vila Franca de Xira, entre a saída de uma junta médica onde acompanhou um motorista e a leitura de uma sentença no tribunal da cidade, começa pelos motivos que o fizeram saltar da secretária para a rotunda da Companhia Logística de Combustíveis (CLC), em Aveiras de Cima.

O que o levou a ser o porta-voz do Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas?

Os motoristas convidaram-me e eu aceitei, porque achei que podia fazer a diferença. Por outro lado, é uma causa que me toca particularmente. O meu pai foi motorista até à véspera de ter falecido, com cancro. Fazia quimioterapia e conduzia. Na altura não percebíamos porque é que continuava a trabalhar, até ele explicar que se deixasse de trabalhar não tinha dinheiro para colocar comida na mesa. Os motoristas, até há pouco tempo, só declaravam 600 euros na folha salarial e com isso a baixa médica fica uma ninharia.

Durante meses desafiou o poder. Ficou satisfeito com o que conseguiu?

As conquistas que tivemos foram muito para além do resultado da greve. Desde o início que avisei os motoristas que esta luta seria um tiro único: ou acertávamos ou falhávamos. Convenceram-me que deveríamos partir para esta luta porque todas as outras estavam esgotadas.

Na greve de Agosto um estudo refere que foi mais noticiado do que o primeiro-ministro. Recebia muitas chamadas de jornalistas por dia?

Ultrapassavam a centena e não atendia 75 por cento das chamadas porque era impossível.

Negou muitos pedidos de entrevista?

Sim, muitos. Uns porque não tinha tempo, outros porque estavam a causar polémica à volta do mensageiro e a desviar a atenção da mensagem.

Foi muitas vezes uma marioneta nas mãos dos jornalistas?

Não me senti uma marioneta, mas que desviaram a atenção do problema para se focar em mim isso não desminto.

De que forma este mediatismo afectou a sua vida?

Não me trouxe coisas muito positivas. Deixei de trabalhar com muitos clientes por causa de conflitos de interesses. Não podemos hoje ser do Benfica e amanhã do Sporting. Há um dever de consciência. Fui convidado por empresas de transportes e disse-lhes que não os iria defender, porque estou do outro lado da barricada.

Financeiramente saiu a perder?

Perdi muito, mas profissionalmente sinto-me com um dever de justiça realizado. E aí ganhei em toda a margem. Sinto que lutei pela justiça, não me limito a ser um advogado de secretária.

Sempre está a ser investigado por uma burla a um empresário francês que pretendia abrir negócios em Portugal?

A burla não existe e nunca existiu. O hipotético processo foi levantado como forma de abafar a reivindicação que estávamos a fazer. O DIAP respondeu que àquela data não existia nenhum processo contra mim e a existir ainda não fui notificado. Há um processo contra o Diário de Notícias - que avançou com a notícia em Abril – em que se pede uma indemnização de um milhão de euros.

“O privado exerce um controlo efectivo sobre o público”

Usa constantemente a palavra luta no seu discurso...

Quando olhamos o aparato policial, com motoristas a conduzir escoltados, e um deles levar com três GNR armados de G3 quando abrandou para me cumprimentar, a palavra luta até é simpática. Parecia que estávamos num estado de guerra e no cenário não havia mais do que motoristas a reivindicar direitos. Não duvido da legitimidade do Governo para usar a força. Duvido é do que o incentivou a usá-la, porque a defesa dos trabalhadores não foi.

O Governo posicionou-se do lado errado da greve?

Os motoristas ao fazerem greve estão a abdicar do pagamento de dias de trabalho e a reacção do Governo foi a de abafar a greve colocando-se do lado das petrolíferas. Nunca se viu o poder económico controlar o poder político como se viu neste caso, com o exército, PSP e GNR a trabalhar para os privados. É preocupante e demonstra que o privado exerce um controlo efectivo sobre o público.

O presidente da Junta de Aveiras de Cima diz que a CLC é um perigo para a população. Concorda?

Obviamente que sim. O presidente manifestou-me essa preocupação e vai agora ser ouvido na Assembleia da República. E nós estamos do lado do presidente. A solução seria deslocalizar, mas não é fácil.

Olhando para trás voltava a sair de porta-voz e largar o sindicato num momento decisivo para se candidatar a deputado?

Não larguei a causa, apenas deixei de ser o seu mensageiro para não prejudicar o sindicato com questões políticas. Se fiz bem em aceitar o convite [do PDR]? Hoje não o teria feito, mas não posso dizer que seja um arrependimento. A minha família aconselhou-me a não o fazer, mas achei que poderia dar algum contributo na Assembleia da República.

Marinho e Pinto escolheu-o por aparecer muito na televisão?

O projecto que ele tem para o partido é o de lutar pelas causas e colocar o dedo na ferida. Claro que o facto de eu ter aparecido contribuiu para a minha escolha.

O PDR não conseguiu eleger deputados. Quem assumiu a derrota e o que correu mal?

Assumi a minha quota-parte da derrota. O que correu mal foi não estarmos preparados, nem sabermos como funcionava o controlo que há numa campanha eleitoral, porque não somos profissionais da política. Um profissional da política tem a máquina montada e controlada e nós não tínhamos. Aliás, a maior parte das coisas que fizemos nem apareceu. Lembro-me quando fomos ter com os lesados do BES a comunicação social dizer que ninguém falava com o Pardal Henriques.

Os cartazes com a sua imagem continuam a ser paisagem em estradas e localidades…

Preferia que já não estivessem, mas não vou ser eu a exigir para serem retirados. E, apesar de não serem decorativos, não me envergonham.

Entre greves e uma campanha eleitoral conseguiu ir dormir a casa?

Foram meses muito complicados para mim e para a minha família. Dormi uma hora por noite durante muitos meses e estive perto de ter um esgotamento. Ia mais a casa tomar banho do que propriamente dormir.

Tem ideia de quantas pessoas votaram no partido em Alpiarça? E motoristas?

Foram muito poucas, cerca de 15. Acho que muitos motoristas votaram no partido, mas também acho que não me queriam como político. Nem eu me quis como político.

Depois das eleições continuou a manter ligação com Marinho e Pinto?

Continuamos muito amigos. Marinho e Pinto vai afastar-se da presidência e convidou-me para encabeçar uma lista e eu não aceitei. Acho que posso ser mais útil à sociedade ou às causas estando aqui fora como advogado.

Qual é a próxima luta?

A advocacia voltou a ser o meu foco principal e alguns sindicatos na vertente jurídica. No sindicato a batalha não termina por aqui, continuamos a lutar, agora no âmbito da fiscalização e na redução da idade da reforma. Vêm aí causas polémicas e muitas guerras pela frente [de sindicatos], com problemas tão grandes ou maiores que os dos motoristas.

Orgulho ribatejano

Pedro Pardal Henriques nasceu há 41 anos, em Alpiarça, e com dois anos mudou-se com a família para o concelho de Alenquer. Viveu 18 anos no Porto, onde se licenciou em Direito, pela Universidade Lusófona. Trabalhou durante um ano nos Estados Unidos da América. Actualmente reside em Alenquer e viaja todos os dias para Lisboa, onde tem um dos três escritórios de advogados. É casado pela segunda vez e tem três filhos.
A família continua dividida entre Alpiarça, Vale Cavalos e Santarém, e Pardal Henriques não nega as suas origens. “Pelo contrário, identifico-me como uma pessoa de Alpiarça e tenho orgulho em dizer que sou um homem do Ribatejo”.

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