Apanhados do clima e agora também do coronavírus
Vamos todos ser responsáveis e seguir as indicações da Direcção-Geral de Saúde para não morrermos na praia por causa de um desgraçado de um vírus. Mas não levem a mal que não tenha medo de beijar, abraçar, apertar e andar por aí sem máscara na cara e no coração.
Seja responsável: não brinque com as desgraças que pode ser o próximo desgraçado. Tento levar a brincar a ameaça do coronavírus e, para ser sincero, não consigo ter medo embora tenha cu como toda a gente. Como se ainda tivesse 20 anos, e vivesse em permanente estado de revolução, só me lembro das quedas na Bolsa e dos mil milhões de prejuízo que as grandes empresas estão a sofrer; e nunca me esqueço dos refugiados que desesperam por ajuda; e das notícias que nos informam que os EUA acabam de fazer a maior venda de sempre de armamento. E o Brasil é um dos maiores importadores de armas da América do Sul, logo o Brasil que é o país do mundo que mais gosto e para onde mais viajei ao longo da vida.
Sou sensível e bate mais forte o coração ao ler as notícias da NASA que falam de uma diminuição drástica da poluição nos céus da China por causa da crise do coronavírus. As centrais a carvão da China (e já agora também as do Japão) poluem mais que todos os Estados europeus. E a Europa vive de joelhos perante o comércio chinês. E Portugal, o nosso portugalzinho, já entregou ao chineses uma boa parte da sua economia e, talvez não seja exagero afirmar, uma parte substantiva da sua independência. Nós fechamos as centrais a carvão por razões ambientais e de solidariedade com a vida no Planeta Terra e o Japão e a China inauguram novas centrais a carvão todos os anos como se fossem os donos disto tudo. E é de lá que vem para todo o mundo, incluindo Portugal, o dinheiro e a mercadoria, Deus e o Diabo, agora também o Coronavírus e um dia destes sabe-se lá o que mais.
Tenho na minha estante um livro de capa vermelha, da autoria de Alain Peyrefitte, que tem este título sugestivo: “Quando a China despertar o mundo tremerá”. O livro deve ser de 1975 e não consigo encontrar as razões que me levaram a comprá-lo no Círculo de Leitores que, na altura, era a minha única livraria de bairro. A minha e a de muitos milhões de portugueses. Nunca mais lhe peguei e nem agora que escrevo este texto tenho oportunidade de o folhear. Mas lembro-me dele muita vez porque está lá perdido entre os livros que um dia destes vou doar a uma instituição.
Talvez tenha sido influenciado pelos políticos da altura. Talvez tenha sido também maoísta e não me lembre. Esta é a parte em que mais gosto de pensar que ainda tenho 20 anos e, em vez de imaginar que posso morrer com o Covid-19, só penso nos desgraçados dos lesados do BES, os emigrantes na Venezuela que foram enganados pelos banqueiros mas também os outros; e nas quedas da Bolsa que já chegam aos dois dígitos.
Não estou (só) a brincar com as palavras; tenho leitores que me puxam as orelhas quando me alargo mais em comentários esquerdistas e irresponsáveis; e tenho mais de sessenta anos de idade; pertenço ao grupo de pessoas que correm mais riscos com o vírus da moda. Se morrer pelo caminho pelo menos morro consolado e já tenho com que ranger os dentes na hora da agonia. JAE.