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Ter processos encalhados não é próprio de um sistema judicial
Rute Lopes tem no tribunal de Vila Franca de Xira a sua maior dor de cabeça em termos de instalações

Ter processos encalhados não é próprio de um sistema judicial

Rute Lopes é juíza presidente de uma das três maiores comarcas da região, a de Lisboa Norte, que abrange os tribunais de dez concelhos, entre eles Vila Franca de Xira e Azambuja. Numa curta conversa com O MIRANTE fala das complexidades do sistema, dos problemas do tribunal de Vila Franca de Xira, do novo tribunal do comércio que vai nascer nos terrenos da antiga Escola da Armada e defende que a reforma do mapa judiciário trouxe vantagens. E não tem medo de mandar um recado a quem governa: era possível fazer muito melhor, caso houvesse instalações de qualidade e mais funcionários.

O tribunal de Vila Franca de Xira (VFX) era central e perdeu esses estatuto com a reforma do mapa judiciário. Concorda com essa reforma?

Não creio que os cidadãos tenham perdido acesso a uma justiça de proximidade. Ficámos todos a ganhar, porque a especialização que se obteve desde a reforma permitiu que processos parados há vários anos tenham podido voltar a ter andamento. Em VFX, na área cível, marcam-se agora julgamentos em que as testemunhas ainda se lembram do que aconteceu na última sessão. Antigamente isso não acontecia. As matérias essenciais e socialmente mais importantes, como família e menores e o trabalho, são duas áreas que continuam a existir nos núcleos mais importantes da comarca, em VFX e Torres Vedras.

Não é, portanto, uma boa ideia voltar ao passado.

Estamos melhor assim. Durante anos a justiça era acusada de ineficiência, mas há seis anos que temos vindo a melhorar. E melhoraríamos mais se tivéssemos os funcionários e as condições de que necessitamos. Trabalhamos em condições péssimas. Até para comprar material é terrível. Ninguém acredita. Para mudar uma fechadura temos de pedir dois orçamentos, pedir autorização à direcção-geral para o fazer e não temos autonomia. Saber que vou meter um processo em tribunal e que nunca mais vou ter resposta era algo que me deixava triste. Uma justiça tardia ou que nunca mais avançava não fazia sentido. Isso não é fazer justiça. Felizmente hoje as coisas estão melhor e já não é assim.

O relatório anual da comarca apontou uma falta crónica de funcionários...

Há um défice de trabalhadores muito grande. E é transversal a todo o país e não depende dos tribunais mas sim do Ministério da Justiça. Num estudo feito pela Direcção-Geral da Administração da Justiça foi revelado que a comarca de Lisboa Norte, no final de 2019, é a que tem o maior défice de funcionários do país. Não é difícil sair desta comarca para ir para Lisboa por causa da proximidade e muitos trabalhadores mudam-se para lá. É como Vila Franca de Xira, tem muito bons acessos e por isso temos gente de vários locais a querer ir para lá. Apesar das dificuldades tem-se conseguido fazer um trabalho positivo. Das três comarcas de Lisboa, esta é a mais dispersa e isso torna tudo um pouco mais complicado de gerir. Actualmente onde temos mais problemas é em VFX e Torres Vedras.

Como vê o andamento do novo tribunal do comércio de VFX?

Tenho pena de ainda não ter sido resolvido. Vai ser um tribunal excelente mas o processo está a andar muito devagarinho. Era suposto a obra já estar quase terminada. O protocolo com o ministério foi assinado em Janeiro de 2018 e a obra era para começar no ano seguinte. Já deveria estar bem avançado e ainda nem sequer foi demolido o que lá está.

Vai ser um tribunal novo mas na mesma com poucos funcionários?

Dependerá do ministério. O edifício não vai ter os serviços todos e penso que manter o Palácio da Justiça a funcionar no centro da cidade é bom, porque o centro de VFX precisa de ser dinamizado. O tribunal é um grande factor de dinamização e se ele sair isso é mau. O tribunal de VFX é a minha maior dor de cabeça em termos de instalações.

O que tem sido feito para tentar melhorar a situação?

A comarca lutou até ao limite das suas forças para que VFX tivesse melhores instalações. Mas infelizmente não depende de nós. É do ministério e da câmara, que tem sido bastante prestável. Da nossa parte o que podemos fazer é ser os “chatos” de serviço, ver se metemos a engrenagem a funcionar quando sentimos que está parada há algum tempo. As estruturas do Estado são pesadas e de vez em quando temos de avançar e falar com as diferentes entidades para que as coisas mexam. Apesar de tudo VFX tem serviços que trabalham bem. É uma ideia errada pensar que só porque os edifícios são maus os serviços são maus.

Ter processos encalhados não é próprio de um sistema judicial

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