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Um músico é como um atleta de alta competição
Beethoven é uma forte inspiração no percurso e obra de Marta Menezes

Um músico é como um atleta de alta competição

Rigor, disciplina e talento são características que não faltam a Marta Menezes, a pianista de Minde que tem dado nas vistas por todo o mundo com as suas interpretações de compositores portugueses e estrangeiros. Para assinalar o 250º aniversário do nascimento de Beethoven, um dos seus compositores favoritos, Marta preparou “5 Encores para Beethoven”, um projecto que traz o compositor para o tempo que vivemos e para a música que agora se escreve. Uma entrevista que decorreu na sala de piano do Conservatório de Música de Santarém, gentilmente cedida para a ocasião.


O estudo de música nunca está completo?

Um músico, de qualquer instrumento, toca todos os dias, idealmente várias horas por dia. É uma actividade que se costuma comparar a um desporto de alta competição. Tem que haver um treino, um ritmo e um rigor constantes. Exige muita disciplina. Se estamos um ou dois dias sem tocar ao terceiro já se nota diferença.

Toca outros instrumentos além do piano?

Toquei clarinete, mas a certa altura, como tocar um instrumento é muito exigente, tive que optar. A escolha surgiu naturalmente e no meu caso foi para o piano.

Com que idade se iniciou na música?

Com quatro ou cinco anos, no Conservatório de Música Jaime Chavinha. Havia um piano em casa da minha avó. A minha mãe e a minha tia tinham tido algumas aulas de piano em pequenas. Não me lembro se fui eu que pedi ou se foram os meus pais que tomaram a iniciativa das aulas. Sei que gostei e fui evoluindo.

Tem vários irmãos, todos ligados à música…

Tenho uma irmã e dois irmãos, todos mais novos e todos ligados à música. A minha irmã toca trompa de harmonia, vive em Marselha onde integra a orquestra de ópera. Um dos meus irmãos fez curso de formação musical e direcção coral, estudou canto e direcção de orquestra. O outro está a tirar o curso de percussão.

De que forma ter nascido em Minde vos influenciou?

Minde deu-nos a oportunidade de ter contacto com a música. É uma terra muito artística e muito musical. Além do conservatório tem também a banda, à qual estive ligada. Tem o festival de jazz e muitas outras actividades.

Regressam a “casa” com frequência?

Os nossos pais continuam a viver em Minde. Cada um de nós vai tendo mais coisas para fazer, estamos mais dispersos, todos saímos de Minde, mas regressamos com a frequência possível.

Em 2017 O MIRANTE escrevia que a Marta era a pianista de Minde que estava a conquistar o mundo. Que mundo conquistou nestes últimos três anos?

Foram anos muito positivos. O artigo a que se refere aconteceu quando tive a experiência na China e na altura já estudava nos Estados Unidos da América (EUA), onde tirava o doutoramento que entretanto conclui em Abril. Em 2018 fiz uma série de concertos de homenagem a José Vianna da Motta, um dos principais compositores portugueses do século XIX e primeira metade do século XX, também pianista. Nesse ano celebraram-se os 150 anos do seu nascimento. Fiz uma série de recitais que apresentei em várias cidades em Portugal, mas também fora como Londres, Paris, Estugarda e algumas cidades dos EUA.

Em 2020 surge um novo projecto também de celebração de um aniversário...

Este ano estou a apresentar o projecto de celebração dos 250 anos do nascimento de Beethoven.

Como surgiu a ideia?

Beethoven está sempre muito presente nos meus repertórios e recitais. É raro fazer uma temporada em que não toque uma peça sua. Quando vi que a data redonda se aproximava pensei criar algo. Apresentar os Cinco Concertos para Piano e Orquestra é um marco importante na vida musical de um pianista. Queria muito fazê-lo. Procuro sempre incluir algo mais original nos programas que faço. Gosto também de explorar a opção da música portuguesa. Temos bons compositores e é muito importante divulgarmos a nossa música e a nossa cultura.

Porquê o nome “5 Encores para Beethoven”?

Muitas vezes nos concertos o artista toca uma peça extra. No final, se as pessoas aplaudem, há um encore. O público fica na expectativa do que virá a seguir, como extra. Decidi, em vez de escolher uma peça extra, criar este projecto com peças novas. Estreias de compositores portugueses que as compuseram de propósito para aquele concerto.

Foram peças encomendadas e pagas por si?

Contactei os compositores e organizei um crowdfunding. Cada um deles sabia qual o concerto que antecedia a sua peça. Tive os cinco que queria. É interessante ver como cada um, na sua linguagem, cria essa peça. A ideia foi também trazer Beethoven para o presente, relacioná-lo com a actualidade, com o tempo que vivemos e com a música escrita agora.

Cunha Leal, da direcção artística do Festival de Música de Alcobaça, referia recentemente que a 5ª sinfonia de Beethoven é uma obra que lembra que o espírito humano supera as provações do destino. Uma mensagem que se adequa aos tempos que vivemos. Concorda?

Concordo. A música de Beethoven é admirada por muitas pessoas porque é um compositor muito terra a terra, muito próximo, que transmite sentimentos muito humanos. É fácil ter empatia com a sua música e a 5ª sinfonia é uma das obras em que se vê essa energia, esse ímpeto, essa luta.

Tem uma sinfonia preferida de Beethoven?

Isso é uma pergunta difícil. Cada uma tem as suas particularidades.

O próximo concerto na região será a 7 de Novembro, em Alcanena, concelho de onde é natural. Tem um sabor diferente actuar em casa?

Gosto muito de me apresentar em Alcanena. Faço lá um concerto todos os anos e vai sempre muita gente assistir. No público há amigos, conhecidos e familiares. Minde é uma terra pequena e vivi lá a minha infância toda até ter ido estudar para Lisboa. É muito bom ter esse público caloroso.

Conhece também outros palcos da região...

Sim. Só para dar dois exemplos, a 8 de Fevereiro actuei em Torres Novas acompanhada pela Orquestra Metropolitana de Lisboa. No primeiro dia de Março dei um espectáculo em Tomar, com a Orquestra Sinfónica de Thomar, integrado nas comemorações do Dia da Cidade. Esta foi a última actuação antes do confinamento.

Como passou o confinamento?

Tenho piano em casa e o estudo do piano foi igual. Já estudava em casa todos os dias e continuei a fazê-lo. Na verdade, a maior diferença que senti foi em relação às aulas. Dou aulas de piano a iniciados, jovens e adultos, através de uma escola de música e também a nível particular, e todas as aulas passaram a ser dadas online. O confinamento não foi tão difícil como para muitas pessoas que ficaram sem poder trabalhar. Deu para fazer adaptações.

É possível ter a música como profissão em Portugal?

Se me pergunta se é possível viver só de concertos em Portugal é difícil. Mas dando aulas a situação é mais estável. Contudo, conciliar concertos e aulas é difícil. A preparação para um concerto exige muita dedicação e disponibilidade de tempo para estudar, muita disponibilidade mental, muita concentração. É um trabalho de organização e de disciplina.

Um percurso premiado

Marta Menezes, 32 anos, é natural de Minde, concelho de Alcanena. No seu percurso como pianista conquistou o 1º Prémio no Concurso Beethoven no Royal College of Music, em Londres, e no Concurso Internacional de Piano de Nice, Côte D’Azur. Além de muitos outros prémios nacionais e internacionais Marta Menezes recebeu em 2014 a Medalha de Prata de Valor e Distinção pelo seu percurso enquanto pianista atribuída pelo Instituto Politécnico de Lisboa.
Em 2015 editou o seu primeiro CD com obras de Beethoven e Lopes-Graça, com o apoio da Fundação GDA, que recebeu o prémio Global Music Award nos EUA, país onde terminou em Abril o doutoramento na Universidade de Indiana. A 7 de Novembro actua em Alcanena onde tocará a peça do compositor Tiago Cabrita, concerto nº 2 para piano e orquestra, integrada no projecto Cinco Concertos para Piano de Beethoven.

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