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Há doenças tão raras que nem os médicos as conseguem diagnosticar
Ana Ameixa e Alexandra Ferreira

Há doenças tão raras que nem os médicos as conseguem diagnosticar

Sofrimento só não é maior porque há compreensão e ajuda da família.

Ana Ameixa sofre de endometriose desde os 14 anos e lamenta que a doença ainda não seja conhecida entre as mulheres

“Queixava-me de dores menstruais intensas e só me diziam que era normal”

Dores incapacitantes na menstruação, apatia, cansaço e perturbações hormonais. Estes são os principais sintomas de endometriose, uma doença de que se fala pouco mas que afecta uma em cada dez mulheres. Mulheres como Ana Ameixa, de 31 anos, que trabalha na área de marketing .
A endometriose é uma doença crónica que afecta mulheres em idade reprodutiva e que consiste na presença de tecido endometrial fora do útero. Esse tecido cresce no início do ciclo menstrual e transforma-se após a ovulação para permitir a implantação de um possível embrião, descamando durante a menstruação para voltar a crescer no ciclo seguinte, situação que com o tempo leva a inflamação e fibrose.
Em alguns casos a endometriose profunda atinge outros órgãos fora do sistema reprodutivo, como os intestinos ou os pulmões. Além das dores incapacitantes a infertilidade é muitas vezes outra das consequências da doença.
“Ainda há muita vergonha de falar sobre o aparelho reprodutor feminino. Um dos grandes problemas é a comunidade médica não estar suficientemente sensibilizada para a doença. Quando uma mulher vai ao ginecologista e diz que tem dores na menstruação dizem-lhe logo que isso é normal”, lamenta Ana Ameixa a O MIRANTE.
A jovem de Alverca sofreu com a doença desde a sua primeira menstruação aos 14 anos. Mas, tal como é dito a muitas outras raparigas, as dores eram consideradas normais. E assim aconteceu até ao dia em que Ana começou, devido à intensidade das dores, a desmaiar na escola.
“Falta muita informação sobre a doença. É quase um trabalho do paciente informar-se e dizer ao médico o que tem. É importante falar sobre este assunto porque todas as mulheres menstruam. É algo natural. Esta pressão da sociedade que as mulheres são feitas para parir ajuda ainda mais a que exista um preconceito sobre a doença que urge desmistificar”, defende.
Depois de anos nos médicos sem ter um diagnóstico claro do motivo para as suas dores fortes, acabou por ser uma vizinha, por mero acaso, a indicar-lhe que talvez sofresse de endometriose.
“Marquei a consulta, disse suspeitar de endometriose, fiz uma ecografia e quando a médica fez apalpação disse que, não vendo a endometriose, a conseguia sentir nos dedos. E eu sentia um choque eléctrico de dor intensa quando isso acontecia”, recorda.
Ana Ameixa foi operada e os nódulos e aderências que tinha foram removidos. Como resultado as dores desapareceram mas apenas durante quatro meses. Como doença crónica que é tudo voltou lentamente.
A família e o namorado são os seus grandes suportes. “Estou muito grata pela família e pelo namorado que tenho porque são um apoio constante. Lidar com esta doença é desgastante. Um dos meus principais receios é poder não vir a conseguir engravidar no futuro mas quero acreditar que tudo irá correr bem”, refere. Em Portugal existe a Associação Portuguesa de Apoio a Mulheres Portadoras de Endometriose que disponibiliza mais informação sobre a doença.

Alexandra Ferreira desloca-se com o apoio de um andarilho e viu-se obrigada a pedir a reforma por invalidez

Alexandra Ferreira luta contra a esclerose múltipla desde os 21 anos

A primeira vez que Alexandra Ferreira estranhou a reacção anormal do seu corpo foi quando, ao subir para uma cadeira, perdeu a força na perna esquerda. Entretanto, foi ao oftalmologista porque estava com problemas de visão. Como tinha sido diagnosticada com diabetes aos 15 anos pensou que a visão dupla no olho esquerdo fosse uma consequência da doença. O médico passou-a para uma colega da área de Neurologia. Depois de muitos exames e uma ressonância magnética foi-lhe diagnosticada esclerose múltipla. Tinha 21 anos.
Assustou-se quando a médica lhe falou da sua doença e mais assustada ficou quando pesquisou na internet mais informações. Admite que não aceitou a esclerose múltipla e que, aos 40 anos, continua sem conseguir aceitar. Confessa também que, muitas vezes, não injectava a insulina para a diabetes como forma de revolta, o que lhe trazia mais problemas.
Natural de Almeirim, onde vive, Alexandra Ferreira frequentava o segundo ano do curso de Engenharia Alimentar na Escola Superior Agrária de Santarém aquando do diagnóstico. Concluiu o curso e a vida levou-a para Lisboa, onde trabalhou durante sete anos como secretária num escritório de advogados.
A rotina do dia-a-dia ajudava-a a manter o corpo ágil, o que ajuda bastante quem sofre da doença, mas o seu estado foi-se agravando. Começou com descoordenação a nível da escrita e passou a ter lapsos de memória. Apesar de tudo, continuou a fazer a sua vida normal. Aos 29 anos foi mãe e a gravidez decorreu com normalidade.
Depois da maternidade e quando deixou de trabalhar os problemas de saúde voltaram a agravar-se. A parte motora, do lado esquerdo, ficou mais lenta. Perdeu massa muscular. Entretanto, regressou a Almeirim, onde vive em casa dos pais. Viu-se obrigada a reformar-se por invalidez e precisa do apoio de um andarilho para se deslocar.
“Estive um tempo em Alcoitão onde fiz fisioterapia e a médica que me acompanhou ficou muito surpreendida por eu não estar numa cadeira de rodas. Não estou porque faço tudo para não precisar dela. Só a utilizo se tiver que ir ao supermercado e precisar andar bastante”, afirma.
Faz fisioterapia três vezes por semana para estimular a massa muscular, mas as brincadeiras com o filho nem sempre são fáceis. Com 11 anos, Tomás entende as limitações físicas da mãe mas quando era mais pequeno não devia perceber porque é que a mãe não se sentava no chão para brincar com ele.
Alexandra Ferreira precisa de ajuda para tomar banho uma vez que tem dificuldade em mexer o braço e a perna esquerdos. Movimentos tão simples como entrar na cama são difíceis para ela. A maior parte dos seus dias são passados em casa saindo apenas para a ir à fisioterapia ou quando necessita ir às compras.
Com a escola online, o filho está uma semana em casa do pai e outra semana em casa da mãe. Quando começar o ensino presencial Tomás fica com o pai e visita a mãe aos fins-de-semana e nas férias escolares. Uma decisão muito difícil.
“Custou-me muito escolher entre o meu filho e a minha saúde mas tenho que estar bem fisicamente para poder estar com ele. Sei que está muito bem entregue ao pai mas é uma dor muito grande não estar com o Tomás todos os dias por causa de uma doença tão limitadora”, lamenta.
Mantém esperança no futuro e apoia-se nas pequenas conquistas como conseguir fazer a cama sozinha ou preparar o pequeno-almoço, mas não esconde o receio do que está para vir. “Não quero ficar totalmente dependente de ninguém. Os médicos dizem que é fundamental eu mexer-me e é isso que faço. Mesmo que fique numa cadeira de rodas o mais importante é manter a minha independência”, garante.

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