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Morte encoberta, fome e maus-tratos num lar ilegal de Riachos
Edifício em Riachos onde funcionava a casa de acolhimento de Ana Alves que está em prisão preventiva acusada do crime de maus tratos e profanação de cadáver

Morte encoberta, fome e maus-tratos num lar ilegal de Riachos

Utentes do lar ilegal viviam em condições chocantes, mas ninguém percebeu o que se passava no interior de um apartamento em Riachos. Após duas mortes a realidade foi exposta. Proprietária está em prisão preventiva.

No bairro Sópovo, em Riachos, onde todos se conhecem, Ana Paula Alves, de 41 anos, conseguiu permanecer no anonimato e manter em segredo o seu negócio ao longo de oito meses. A Segurança Social e a Câmara de Torres Novas não faziam ideia e a vizinhança até desconfiava, mas estava longe de imaginar as condições em que viviam quatro idosas. O apartamento onde duas delas, de 90 e 92 anos, vieram a ser encontradas mortas e com sinais de magreza extrema, funcionava como lar ilegal, com um valor mensal cobrado pela proprietária de 600 euros por utente.
Ana Paula Alves foi detida e está em prisão preventiva, a medida de coacção mais gravosa, desde 5 de Março. É suspeita da prática de dois crimes de maus tratos agravados, que resultaram na morte das idosas nonagenárias, um crime de profanação de cadáver e dois crimes de maus tratos às outras duas idosas, de 85 e 87 anos, que foram encaminhadas para o Centro de Bem Estar Social de Alcanena, referenciado pela Segurança Social, depois de serem assistidas no Hospital de Torres Novas.
Para a Polícia Judiciária, as idosas morreram na sequência dos maus-tratos infligidos pela dona do lar que, num dos casos, ocultou a informação sobre a morte da idosa às autoridades e à família.

Morta há várias horas quando foi descoberta
A neta da primeira idosa a ser encontrada sem vida bateu à porta de Irene Vicente, moradora do bairro, depois de tocar vezes sem conta à campainha do andar onde funcionava o lar, sem que ninguém respondesse. “Pediu para a deixarmos fazer uma chamada para informar a família do que se estava a passar”, conta a O MIRANTE. A neta partilhou ainda que estava ali para levar a avô para um lar no Entroncamento. Afinal, a idosa já estava morta há várias horas, apresentando “rigidez cadavérica” quando chegaram os bombeiros e autoridades, revelou o presidente da Câmara de Torres Novas, Pedro Ferreira.
“Não tenho palavras para classificar a forma como tudo isto aconteceu. No início da pandemia fizemos o levantamento de lares ilegais que julgávamos ser o mais rigoroso possível, mas em Julho surgiu esta casa de acolhimento que nos passou completamente ao lado”, refere o autarca. O caso também passou ao lado do presidente da Junta de Riachos, José Júlio, que mora nesse mesmo bairro mas só teve conhecimento da situação quando recebeu um telefonema da protecção civil.
Alguns moradores contam que às vezes viam dois homens, idosos, sentados nas cadeiras da varanda, que ainda lá estão. “Pensava que moravam ali”, conta Maria Carlota Lourenço, que um dia ouviu dizer que aquele apartamento era um lar de idosos. “Não acreditei. Como podia ser um lar num espaço tão pequeno?”, questiona indignada. Esses dois idosos nunca mais os viu.

Morte de idoso em Dezembro
Ninguém sabe ao certo, mas o lar estaria a funcionar pelo menos desde Julho de 2020, numa altura em que a pandemia já tinha proibido ajuntamentos e visitas a instituições e lares de idosos. Neste caso, essa medida era uma forma de Ana Paula Alves manter as famílias afastadas dos seus idosos. “Ninguém via o que lá se passava com a desculpa da Covid-19”, diz o presidente de junta.
Uma desculpa que em Dezembro foi quebrada com o anúncio da morte de um idoso. A dona do lar comunicou à família que um idoso tinha falecido. Entrou saudável e ao fim de três meses saiu dentro de um caixão. “Sabe-se que estava magro”, conta José Júlio. Até hoje, a família não conseguiu reaver os bens do idoso.

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