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“Samora Correia merece mais: estamos a perder o orgulho em ser samorenses”
João Gomes é presidente da SFUS e um rosto conhecido de Samora Correia

“Samora Correia merece mais: estamos a perder o orgulho em ser samorenses”

João Gomes, 81 anos, presidente da Sociedade Filarmónica União Samorense

Entrou para a Sociedade Filarmónica União Samorense aos 12 anos porque queria ser músico. O que lhe faltou em talento sobrava-lhe em espírito associativista. Aos 81 anos é o presidente daquela associação centenária que, segundo diz, precisa de sangue novo. Tem orgulho em ser de Samora, cidade que na sua opinião merece maior atenção e investimento. Na vida não se arrepende de muita coisa, mas carrega a mágoa de nunca ter sido pai.

Gostava de ter tido filhos e acredito que hoje, com a evolução da medicina, teria sido possível. Sou casado há 56 anos, mas quis o destino que não fossemos pais. Tentámos várias vezes, mas aos quatro meses de gestação a minha mulher sofria um aborto. Foi duro aceitar.

Sou filho de pai sapateiro e mãe costureira. Nasci e fui criado em Samora Correia, cidade onde ainda vivo e que não era capaz de deixar. As diferenças são notórias nesta terra. De pequena vila de fazendeiros, onde se podia dormir de porta aberta e havia um grande espírito de comunidade, passou a cidade dormitório.

Há um pequeno grupo de samorenses que ainda luta pela sua terra e identidade. Não creio que a tradição se perdeu mas estamos a perder o orgulho em sermos samorenses. Há um muro que é urgente derrubar: todos os que cá vivem, sejam de cá ou não, precisam de se unir.

As pessoas tornaram-se materialistas e vivem fechadas em suas casas, sobre si mesmas. Ainda sou do tempo em que as tronqueiras para as largadas e as praças para as corridas de toiros eram montadas pela população com varas de eucalipto. Hoje, se fosse preciso isso para haver festa, seriam muito poucos os que apareceriam.

A Companhia das Lezírias, que já foi a grande empregadora de Samora, transformou-se numa empresa com fins lucrativos apesar de ser do Estado. Foi lá que aprendi a ser carpinteiro aos 12 anos depois de ter terminado o exame da quarta classe, feito à luz de uma candeia a petróleo. A infância foi dura e a juventude ainda mais. Só quando fui para a tropa pude voltar a estudar. Não me valeu muito, chumbei o exame do segundo ciclo, mas aprendi a escrever sem erros. Só muitos anos mais tarde me inscrevi no Instituto de Contabilidade e me tornei técnico de contas.

A música é o único vício que tenho. Guardo em casa uma vasta colecção de CD de música clássica, vou a concertos sempre que posso e não perco um ensaio da banda da SFUS. Aprendi solfejo e cheguei a tocar bombo, mas não nasci para ser músico.

Tento dar o melhor de mim em tudo o que faço. Não nego ajuda nem viro costas a ninguém. Sei perdoar e sou um conciliador através do diálogo. Gosto do debate de ideias, não gosto dos que acham que a inteligência foi toda para eles. As associações proliferam hoje em dia mas o verdadeiro espírito associativista está em queda. Seriam precisas 58 associações num concelho como Benavente?

Todos os dias venho para a SFUS e todos os dias resolvo problemas. Mas gostava de me reformar da direcção. As associações precisam de sangue novo, de gente com novas ideias. Para se estar na política tem de se saber jogar boxe: levar murros e ter poder de encaixe. Acho que não saberia dar nem levar, por isso, apesar de já ter sido convidado nunca aceitei.

Samora Correia merece mais investimento e atenção dos nossos políticos. Precisa de mais. Quando o Movimento Samora Correia a concelho foi à Assembleia da República devia ter ido. Arrependo-me disso. O bairrismo entre Samora Correia e Benavente é ancestral e ainda está enraizado em alguns.

Dói-me e custa-me perceber quando um jovem formado cá escolhe ir para fora. Conheço praticamente todas as capitais de países europeus e digo com certezas que para viver não há país como o nosso.

Só entrei uma vez numa discoteca e jurei para nunca mais. Quem aguenta aquele barulho e aquelas luzes? A minha pista de dança era o chão de madeira da Casa do Povo [da qual foi presidente] em bailaricos mais calmos.

“Samora Correia merece mais: estamos a perder o orgulho em ser samorenses”

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