Sociedade | 08-09-2007 15:17
Segunda mulher mais velha do Mundo vive em Tomar e está à beira de mais um aniversário
Acabada de acordar da sesta, sentada na cama, Maria de Jesus junta as mãos como quem reza, mas, à beira de completar 114 anos, a segunda pessoa mais velha do Mundo está, afinal, a fazer ginástica. Maria Madalena, a filha desta "supercentenária", desfaz qualquer equívoco e assegura: "está a fazer ginástica. Antes, levava as pontas das mãos aos bicos dos pés, mas agora só mexe um pouco as mãos". Maria de Jesus nasceu em 10 de Setembro de 1893 e, no Mundo, só a norte-americana Edna Parker é mais velha - completou 114 anos no passado dia 20 de Abril -, depois da japonesa Yone Minagawa (04 de Janeiro de 1893) ter falecido a 19 de Agosto último. Na lentidão dos seus gestos, Maria de Jesus ergue-se sozinha da cama e apoia-se no andarilho que Maria Madalena lhe põe a jeito. Lentamente, percorre os escassos metros que separam o seu quarto da cadeira colocada no topo da mesa da cozinha, onde, sem ajuda, se senta, puxando a mesa para si, num gesto e numa postura que não deixam dúvidas sobre quem é a dona da casa. Ouve mal, de um só ouvido, vê mal (é cega de um olho desde criança), fala pouco - durante o tempo em que recebeu a agência Lusa pediu para ser penteada, reivindicou água, erguendo o copo amarelo e perguntando se alguém queria beber, chamou "aviador" ao seu sobrinho predilecto -, mas "só faz o que ela quer". "É quero, posso e mando", diz Maria Madalena, a filha que no Natal completa 83 anos e que dedicou por completo os últimos 17 anos à mãe. Maria Madalena confessa que a mãe não era muito "popular" no lugar, porque era "muito reguila, refilava muito". "Se vou para lhe dar água e ela não quer, vai copo e tudo fora", diz, com um sorriso, acrescentando que acontece o mesmo se alguém tenta ajudá-la a sentar-se. Grande parte do dia de Maria de Jesus é passado na cama, de onde se levanta às 10:00 para tomar o pequeno-almoço e aguardar, sentada à mesa, que cheguem "as meninas" do Centro de Dia para lhe darem banho, antes de almoçar e ir dormir a sesta. "Adora tomar banho e, antes de se ir deitar à noite, faz questão de ir lavar as mãos e a boca", tal como faz questão em comer sozinha, afirma Madalena. Adora também arroz doce, não gosta de carne, mas aprecia muito peixe, nunca bebeu bebidas alcoólicas nem café e foi sempre saudável. Só toma meio comprimido por dia, para a tensão - que pede, quando a filha (que toma 12 comprimidos/dia) se esquece de lho dar -, e é vista todos os meses pelo médico de família que vai a sua casa. A filha nota uma "grande diferença" na mãe "do ano passado para cá", recordando que no último aniversário Maria de Jesus "teve de apagar as velas cinco vezes" para satisfazer as televisões e os jornalistas que no dia do seu aniversário lhe invadiram a casa, a ponto de os muitos familiares terem de ficar na rua. Este ano o aniversário calha a uma segunda-feira, pelo que Madalena espera apenas a companhia do seu filho e do seu neto, que tirou propositadamente o dia para estar com a bisavó. Por vezes, Maria de Jesus tem noites agitadas, há tempos passou uma manhã a gritar o nome de Salazar, personagem que não merecia as suas simpatias, afirma a filha, sua companhia constante quando está sentada à mesa para evitar que a mãe adormeça e caia. Natural de Urqueira, então freguesia do Olival, no concelho de Ourém, Maria de Jesus, que ficou viúva aos 57 anos, teve seis filhos (uma morreu à nascença e dois outros morreram recentemente), dos quais tem hoje 11 netos, 16 bisnetos e cinco trinetos. O seu sobrinho José Fernandes Tomás, que completou 70 anos em Janeiro, fez-lhe recentemente uma homenagem percorrendo mais de 2.000 quilómetros numa volta a Portugal em bicicleta, estando já a preparar-se para, no próximo ano, fazer uma "volta ibérica". Com o cabelo branco, curtinho, uma blusa branca com ramagens pretas, uma bata preta às bolinhas brancas e a medalha oferecida há um ano pela Junta de Freguesia do Olival ao peito, de sorriso frequente na boca, Maria de Jesus transmite um ar determinado. Dá um beijo com agrado ao sobrinho e a sua mão acena para a foto e aperta a nossa à despedida, deixando-nos tocar, não sem perplexidade, numa vida que atravessou três séculos. "Não queria de maneira nenhuma chegar à idade dela", desabafa Madalena. Só há no Mundo, pelo menos com registo na organização norte-americana Gerontology Research Group, 75 pessoas com mais de 110 anos, 69 são mulheres e seis são homens.
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