Falta de segurança no Tribunal de Vila Franca de Xira
Fugitivo com tuberculose que esteve em contacto com pessoas e que fugiu daquele tribunal continua a monte.
Os tribunais não estão preparados para protegerem os cidadãos que frequentam os edifícios, nem existe qualquer determinação perante situações que possam por em causa a segurança e a saúde dos presentes nos espaços dos palácios da justiça. A prova disso é o que aconteceu no Tribunal de Vila Franca de Xira, onde um detido com tuberculose conseguiu fugir. Pior que ter fugido foi ter estado em contacto com outras pessoas. Uma situação há muito temida por quem trabalha e conhece a realidade do edifício, dizem vários responsáveis escutados por O MIRANTE.
A soma de uma segurança deficiente a um edifício sem espaço e que reúne debaixo do mesmo tecto as secções de crime com família e menores, juntamente com a falta de formação e prática dos profissionais de justiça em lidar com estas situações. Segundo vários trabalhadores, este caso coloca a nu um conjunto de fragilidades, sobretudo na formação sobre como lidar com detidos que tenham doenças infecto-contagiosas ou outras. Cada tribunal vai decidindo por si e, na maioria dos casos, são os juízes que, caso a caso, lá vão dando ordem sobre como se proceder.
“Apesar destes casos serem raros é algo que não me surpreende que tenha acontecido, conhecendo a segurança que existe e os protocolos de higiene e segurança no trabalho. No meio de tudo isto os juízes e os restantes funcionários são quem menos culpa tem. Desconheço a existência de qualquer protocolo sobre como se agir nestas situações mas admito que possa haver”, explica João Raposo, Secretário-Geral da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, que foi o primeiro juiz do Tribunal de Almeirim.
O suspeito de roubo de metais, com tuberculose, teve de ser ouvido em primeiro interrogatório. O juiz responsável ordenou a compra de máscaras e luvas de protecção mas apenas para quem estava a lidar directamente com o detido. Por falta de salas disponíveis, o homem teve de atravessar todo o tribunal – passando por crianças e pais desprotegidos que estavam no edifício – até ser ouvido na sala de audiências. Depois de saber da decisão de instauração da prisão preventiva aproveitou a falta de guardas junto de si, esgueirou-se pela porta das testemunhas, atravessou o edifício e saiu pelas traseiras.
As autoridades policiais encerraram todo o edifício para varrer o espaço a pente fino mas o suspeito já se encontrava no exterior. A situação gerou pânico e confusão entre quem estava no tribunal. À data de fecho desta edição o fugitivo ainda não tinha sido apanhado. Os espaços comuns foram depois higienizados.
Tribunal mal cotado
João Raposo admite que tem havido “muitas queixas” naquela associação sindical face à falta de condições nos tribunais e garante que a luta pela criação de segurança e higiene no trabalho se mantém. “A segurança é fraca, funcionamos no desenrasca e navegamos à vista. Têm-se repetido casos de ameaças e agressões veladas que podem escalar para outros níveis”, lamenta. O dirigente admite que Vila Franca de Xira “é um tribunal mal cotado” na Área Metropolitana de Lisboa no que diz respeito às condições de trabalho e lamenta que os tribunais não estejam a ter o olhar que merecem por parte da tutela. O MIRANTE tentou ouvir o Ministério da Justiça sobre esta matéria mas até ao fecho da edição ainda não obteve resposta.
Má ideia misturar secções criminais com família e menores
O presidente da delegação de Vila Franca de Xira da Ordem dos Advogados, Alfredo Pereira, mostra-se preocupado com o que aconteceu no tribunal da cidade. “Temos tido reuniões com a juíz presidente da comarca e temos manifestado as nossas preocupações face às condições do tribunal. O edifício está num limbo de não haver verbas para o recuperar e a chegada de um novo edifício”, explica. O responsável diz que casos como este devem fazer pensar quem dirige a justiça para acabar de vez com um funcionamento de “tapando e remediando” que, apesar de serem casos “isolados e pontuais” não devem acontecer.
Para Alfredo Pereira ter as secções de menores a conviver lado a lado com a secção criminal é errado. “É uma má ideia e levanta-nos preocupação. A nossa proposta passava por aproveitar a sala de amparo às escadas para os menores, é algo a melhorar e a ver”, refere.
Dois casos de fugas
Esta não foi a primeira vez que detidos fugiram do tribunal. Há cerca de dois anos um homem atirou-se da janela do primeiro andar onde decorria o julgamento e conseguiu fugir, para ser apanhado poucas horas depois junto à ponte Marechal Carmona, que liga Vila Franca de Xira ao Porto Alto. Outro caso, mais recente, envolveu um preso que também conseguiu fugir aos guardas prisionais mas enganou-se na porta de saída e acabou encurralado nos arquivos do edifício. Foi apanhado horas depois pela Judiciária.